Os ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) passaram a escrever votos maiores desde que as sessões começaram a ser transmitidas ao vivo pela televisão, em 2002. É essa a primeira constatação da tese de doutorado do economista Felipe de Mendonça Lopes, da Escola de Economia da Fundação Getulio Vargas (FGV), em São Paulo.

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“Os acórdãos ficaram com 26 páginas a mais, em média, o que aumenta o tempo de leitura e prejudica a eficiência do Tribunal”, disse Lopes ao jornal ‘O Estado de S. Paulo’. “O motivo do aumento não é a dificuldade técnico-jurídica da questão, mas tão somente aparecer mais tempo na TV.”

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Na pesquisa que levou a esse resultado, o doutorando usou uma base de dados original: todos os casos de controle abstrato de constitucionalidade julgados pelo STF entre 1988 e 2015, a maior parte Ações Diretas de Inconstitucionalidade (as ADIs).

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Foram 1.680 acórdãos, ou 15 mil votos, pesquisados no site do STF, sobre os quais aplicou métodos econométricos. Um deles, conhecido como “diferenças-em-diferenças”, possibilita identificar se um determinado evento – a criação da TV Justiça, no caso – pode ou não ter um efeito causal sobre o objeto em estudo, o comportamento dos ministros do Supremo.

A primeira parte da tese – Televisão e Comportamento Judicial: lições do Supremo Tribunal Federal – foi concluída em setembro passado. O orientador de Lopes é o economista Rodrigo Soares, especialista em Microeconomia Aplicada, da FGV-SP, ultimamente professor da Universidade de Columbia, em Nova York.

Lopes é paulistano, tem 30 anos e é de uma família de advogados – avô, pai e mãe. Graduou-se pelo Insper, em 2010, logo ingressando na pós-graduação da Economia da FGV-SP. Em 2013, concluiu o mestrado – Independência do Judiciário: mensurando o viés político das cortes brasileiras (disponível online), orientado pelo professor Paulo Furquim de Azevedo.

Emendou com o doutorado, no qual quer tirar a limpo, com base na pesquisa, a questão específica e pouco abordada dos efeitos da televisão no comportamento dos ministros do Supremo. “Muito pouco foi escrito sobre esse viés”, disse o economista. “A pergunta de partida foi: juízes de tribunais colegiados se comportam como membros de comissões especializadas – como na Suprema Corte americana, onde não há transmissões ao vivo, muito longe disso -, ou se comportam como políticos?”

Ineditismo. Em 14 de agosto de 2002, relembra Lopes, o STF se tornou o primeiro tribunal constitucional do mundo a transmitir suas deliberações ao vivo pela televisão. Não foi o primeiro a permitir câmeras em seu ambiente – a Suprema Corte do Canadá permite televisionar sustentações orais desde 1997, informa -, “mas foi o primeiro e permanece o único a permitir a transmissão ao vivo das deliberações entre juízes”.

O foco preciso da pesquisa, na volumosa base de dados, foi o tamanho do voto de cada ministro ao longo do tempo, em número de páginas. “A beleza da estatística permitiu distinguir entre características pessoais dos ministros e efeitos provocados pela televisão”, explicou Lopes. “O resultado é forte o suficiente para ter a certeza de que as mudanças não foram causadas pelas alterações na composição da Corte.”

Vaidade. Nas contas do doutorando, o aumento médio de 26 páginas nos votos dos ministros eleva o tempo de leitura de cada voto em 45 a 50 minutos – o que é quase um terço da duração de uma sessão plenária. “Do ponto de vista da eficiência do Tribunal, esse registro de vaidade é claramente negativo”, disse.

“A pesquisa mostrou que houve mudanças significativas no comportamento dos juízes do STF”, diz a tese. “Como políticos, os ministros usam a televisão como publicidade gratuita e procuram maximizar sua exposição escrevendo votos mais longos – lidos em voz alta nas sessões – e se envolvendo em discussão mais longa com seus pares.” As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.