Presos acusados de fraude em operações com o ICMS

A pedido do Ministério Público Estadual, o juiz Marcelo Ferreira, da 1.ª Central de Inquérito do Fórum Criminal, decretou ontem a prisão preventiva do ex-secretário da Fazenda e ex-presidente da Copel Ingo Hübert e de mais sete acusados de envolvimento em uma operação de compra de créditos irregulares do ICMS da empresa Olvepar no valor de R$ 45 milhões.

Foram presos ontem Cesar Antonio Bordin (gerente de Coordenação Contábil da Copel), André Grochewski (coordenador de Gestão Financeira) e Sérgio Luiz Molinari (advogado e assessor jurídico da presidência da Copel). Todos estão sendo acusados de formação de quadrilha e peculato fiscal.

O ex-secretário da Fazenda foi procurado ontem à tarde em casa, no Jardim Schaffer, e em seu escritório. Até o início da noite, ele continuava foragido.

Além de Hübert, estão com prisão preventiva decretada Luiz Sérgio da Silva (ex-diretor da Olvepar), Antônio Carlos Brasil Fioravante Pierucini (atuou como procurador da Olvepar), Mário Bertoni (ex-diretor da Copel) e Alberto Youssef (doleiro). Os acusados detidos pela Rone (grupo da Companhia de Choque da Polícia Militar) foram levados para o Centro de Triagem da Polícia Civil. Eles iriam ficar numa cela comum.

“Trata-se de quadrilha organizada e que atuou impunemente e, ao que parece, continua arraigada em setores estratégicos, gerando insegurança pela facilidade que possuem na concretização de ilícitos da mesma natureza”, diz o MP, que solicitou a preventiva para a proteção da ordem pública, econômica e garantia da instrução do processo e da aplicação da Lei Penal.

Operação

A operação entre a Copel e a Olvepar começou a ser investigada pelo Ministério Público e a Procuradoria Geral de Justiça a pedido do governador Roberto Requião (PMDB), que recebeu a denúncia de irregularidades na compra dos créditos do deputado estadual Tadeu Veneri (PT). A Olvepar, que está no centro das investigações do MP, pediu concordata em julho do ano passado. Em novembro, a Rodosafra Logística e Transportes Ltda – alegando ser uma das credoras da Olvepar – requereu a Ingo Hübert o reconhecimento dos créditos de ICMS da Olvepar relativos à exportação de produtos semi-elaborados (farelo de soja e óleo de soja) no período de janeiro de 1989 a agosto de 1996. O valor dos créditos seria de R$ 67,36 milhões.

Segundo o Ministério Público, Hübert reconheceu a existência dos créditos de ICMS. O MP acusa o ex-secretário da Fazenda de saber que os créditos não existiam e, além disso, de ter reconhecido a dívida mesmo sem ter poder para isso. A função de analisar os créditos e de legitimá-los cabe aos delegados regionais e ao diretor geral da Coordenação da Receita Estadual, e não diretamente ao secretário da Fazenda. Hübert também pediu parecer do Tribunal de Contas. O conselheiro Heinz Herwig liberou a operação, embora tenha alegado que não detinha as informações necessárias para o parecer.

Ainda segundo a denúncia do Ministério Público, Hübert comprou – por R$ 39,6 milhões, pagos em três parcelas – os créditos tidos como inexistentes da Ovelpar. Chamou a atenção do MP o fato de a operação ser concretizada em menos de dez dias (de 28 de novembro a 6 de dezembro de 2002), do pedido à liberação dos recursos, quando o tempo normal de aprovação de operações desta natureza é de em média 90 dias.

O Ministério Público afirma que, em cada parcela, a Copel emitiu diversos cheques para destinatários distintos, para diluir o montante do valor e não levantar suspeitas sobre a operação, providência que teria sido arquitetada com a atuação do doleiro Alberto Youssef, já conhecido em investigações por crimes de desvios de recursos públicos e lavagem de dinheiro.

Uma das provas apresentadas ao MP foi uma fita de vídeo gravada em uma agência do Banco do Brasil em Curitiba na qual apareciam Youssef, André Grocheveski Neto e Antonio Carlos Brasil F. Pierucini recebendo os cheques emitidos pela Copel. Estes recursos, segundo as investigações do MP, foram depositados em contas do Banco do Brasil fora do Estado. Algumas delas estão em nome de empresas de informática com sede no Rio de Janeiro. Também foram feitos depósitos em contas de agências do BankBoston (Centro e Batel), e em agências do HSBC, CitBank e Banco Real, em Curitiba.

Governo estadual anula operação

O governo do Paraná anunciou ontem que vai anular a operação que abateu uma dívida de ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços) de R$ 45 milhões da Copel (a estatal de energia) junto à Receita Estadual. A operação, como noticiou o jornal Folha de S. Paulo no sábado, seria fraudulenta. “Vamos cancelar esse ato e depois vamos atrás do dinheiro que a Copel pagou indevidamente”, afirmou o procurador-geral do Estado, Sérgio Botto de Lacerda.

O procurador se refere ao fato de a estatal ter pago o Estado com “créditos fictícios” da empresa Olvepar (Óleos e Vegetais Paraná S.A.), numa operação realizada a toque de caixa em dezembro, último mês do governo Jaime Lerner (PFL). A operação foi fechada pelo ex-secretário da Fazenda e ex-presidente da Copel Ingo Hübert. Ontem, o governador Roberto Requião (PMDB) disse que procurou o ex-governador Jaime Lerner (PFL) “para avisá-lo da fraude”, mas que ele não tomou providências.

Lerner nega ter sido avisado por Requião

O ex-governador Jaime Lerner (PFL) divulgou nota ontem desmentindo que seu sucessor, o governador Roberto Requião (PMDB), o tenha comunicado previamente sobre irregularidades na venda de créditos de ICMS para a Copel: “Em nossos contatos durante o período de transição de governo, no final do ano passado, tal assunto nunca foi tratado”, diz a nota.

E prossegue afirmando que a única solicitação em relação à Copel foi o cancelamento de novos contratos de fornecimento de energia: “Consultei o presidente da Copel sobre esta solicitação e decidimos atendê-la”. O ex-governador qualifica de “bastante comum” a operação de venda de créditos de ICMS, e afirma que ela não precisa de autorização prévia do governador do Estado:

“O denuncismo que tomou conta do Paraná nas últimas semanas faz parte de um processo político, que visa unicamente desqualificar moral e administrativamente o governo anterior”, afirma Lerner na nota que distribuiu, acrescentando que “a cada dia novos questionamentos são produzidos e distribuídos à imprensa tendo como fundamento principal o desejo da atual administração de promover processos sumários de condenação contra membros do governo anterior. Aguardo com serenidade que os fatos sejam apurados a fundo, na esfera competente, e confio plenamente na isenção do poder Judiciário, que saberá assegurar a supremacia da verdade e a justiça”, diz a nota divulgada pelo ex-governador.

Ex-governador terá aposentadoria

O arquiteto Jaime Lerner (PFL) vai receber, a partir de março, o valor bruto de R$ 12,05 mil por mês devido à sua condição de ex-governador do Estado. É a segunda aposentadoria conquistada pelo ex-governador; a primeira foi concedida devido ao fato de Lerner também ser funcionário público aposentado (arquiteto) do IPPUC – Instituto de Pesquisa e Planejamento Urbano de Curitiba.

Lerner solicitou a aposentadoria de ex-governador (chamada tecnicamente de “verba representação”), por meio do requerimento numero 5415398/8, em 23 de janeiro deste ano – pouco mais de três semanas depois de deixar o Palácio Iguaçu. O pedido tem efeito retroativo. Por isso, Lerner receberá, em 1.º de março, um salário bruto de R$ 24,1 mil – a aposentadoria acumulada em janeiro e fevereiro. Descontado-se o valor do Imposto de Renda retido na fonte, Lerner receberá um valor líquido de R$ 18,2 mil. A aposentadoria é mensal e vitalícia.

O pedido tem base legal. O Artigo 85, parágrafo 5, da Constituição Federal, garante aos ex-governadores esta prerrogativa. Segundo a Diretoria de Recursos Humanos da Secretaria Estadual de Administração e Previdência, no caso dos ex-governadores, a chamada “verba de representação” equivale ao ganho mensal de um desembargador do Estado.

Olvepar alega inocência

“Com referência às notícias veiculadas sobre a concessão de crédito da Olvepar envolvendo o ex-secretário da Fazenda do Estado Ingo Hübert temos a informar:

1. O crédito em questão refere-se a impostos de circulação de mercadorias pagos indevidamente no período 1989 a 1996 pela referida empresa, conforme já atestado em muitas sentenças judiciais por todo o País, envolvendo todas as instâncias, inclusive a Justiça Federal.

2. A não incidência do imposto, no caso, deve-se à exportação de produto de soja modificado quimicamente e preenchendo os demais requisitos da Lei Complementar n.º 65, de 15 de abril de 1991. O reconhecimento deste direito tem sido praticamente pacífico também no Judiciário paranaense.

3. O processo da Olvepar começou a ser analisado do ponto de vista jurídico e administrativo no início de 2002, tendo recebido um parecer jurídico favorável da 6.ª Inspetoria do Tribunal de Contas do Estado em 2 de maio de 2002.

4. O mencionado parecer ressalta que “conforme versa o artigo 97 inciso I do Código Tributário Nacional, aquele que pagar indevidamente o exigido, sob nome de tributo, tem direito à sua restituição independentemente de protesto pela sua recuperação ou de fazer prova de ter sido induzido a erro no pagamento…”.

5. Em novembro de 2002, a Olvepar voltou a formular o pedido de restituição, juntando cópias de notas fiscais das exportações realizadas, planilhas e respectiva memória de cálculo da atualização do indébito.

6. Em 2 de dezembro de 2002, a 6.ª Inspetoria do Tribunal de Contas do Estado forneceu novo parecer em que conclui: “…em face da decisão plenária do Supremo Tribunal Federal, acerca da correta interpretação …da Lei Complementar 65/91…estando as operações de exportação fora do campo de incidência do ICMS… e de direito, motivo pelo qual pode ser deferida a restituição do montante pleiteado, o qual, por óbvio, constitui créditos acumulados em decorrência de exportações, passível de transferência”.

“Destaque-se por fim que a documentação encartada foi examinada por amostragem, tendo sido possível verificar a veracidade das informações nelas contidas”.

7. Com base na Lei 11.580/96 e nas declarações acima expostas, foi deferido o crédito de R$ 67,3 milhões em 3 de dezembro de 2002, referente ao período 1989 a 1996, corrigido pelos critérios contidos no memorial de cálculos e submetido ao Tribunal de Contas do Estado.

8. Deferidos os créditos, é fato comum a sua comercialização no mercado, sendo que muitas empresas costumam aplicar o seu giro de curto prazo com grande vantagem financeira na compra e compensação dos mesmos no pagamento de seus tributos.

9. A Copel, que costumava movimentar cerca de R$ 13 bilhões por ano, ou R$ 250 milhões por mês, como muitas outras empresas, aplicava recursos financeiros nos diversos mercados de curto prazo, a fim de maximizar o rendimento. Por óbvio, sempre presumindo total legalidade e legitimidade.

10. Na operação em rela, onde a Copel comprou R$ 39,6 milhões compensando R$ 45 milhões, teve um rendimento de cerca de 19% no mês de dezembro.

11. O Estado, além disto, baixou, por essa importância, o seu passivo de créditos de impostos, referente a exportações que ocorreram através do Paraná. Portanto, não houve prejuízo nem para a Copel, nem para o Estado.

12. O fato de a empresa haver incorrido em falência em agosto de 2002 não altera o direito ao crédito que ela auferiu de 1989 a 1996, quando estava em plena atividade.

13. A destinação dos recursos resultantes da venda do crédito é de interesse e responsabilidade exclusiva de quem cedeu o crédito.

14. O ex-secretário da Fazenda jamais travou conhecimento ou teve contato com as pessoas terceiras citadas pela imprensa.

15. A presença de funcionário da Copel no desconto de cheques em agência do Banco do Brasil não era usual nem do conhecimento da administração da empresa, conforme noticiado, porém, e por outro lado, também não significa necessariamente conivência com qualquer ato lesivo aos interesses da mesma, nem em conduta ilícita.”

Assessoria Jurídica

Polícia Federal pede ajuda ao FBI

A equipe de policiais federais que investiga prática de lavagem de dinheiro por meio da agência do Banestado em Nova York reúne-se hoje com agentes do FBI, a polícia federal americana, para acertar os detalhes finais da abertura de investigação sobre o caso na Justiça dos Estados Unidos.

Os policiais brasileiros pretendem mostrar aos americanos que a maioria dos cerca de US$ 30 bilhões que teriam passado pelo Banestado de Nova York tem origem ilícita. No ano passado, a equipe da PF (Polícia Federal), então composta pelo delegado Castilho Neto e pelos peritos Renato Barbosa e Eurico Montenegro, conseguiu a quebra do sigilo bancário das 137 contas movimentadas pelo Banestado.

Em apenas cinco delas, entre os anos de 1996 e 1997, foram movimentados US$ 14,9 bilhões – daí a estimativa de que nos dois anos subseqüentes o montante chegaria aos US$ 30 bilhões.

Segundo o estudo da polícia, obtido pela Folha, três doleiros tinham atuação direta ou indireta em pelo menos oito contas bancárias: Alberto Youssef, que atua no Paraná e em São Paulo, Sílvio Roberto Anspach, que vive em Miami (EUA), e Alexander Diógenes Ferreira Gomes, de Fortaleza.

Documentação

De volta a Nova York, agora também com o reforço do delegado Antonio Carvalho e do perito José Taleires, a equipe iniciou as negociações para conseguir a documentação referente à movimentação das contas em 98 e 99, além da ampliação da quebra de sigilo já obtida, de tal forma que consigam chegar aos beneficiários finais de todas as operações.

O FBI investiga as operações do Banestado desde 1997, quando, nos levantamentos relacionados a um caso de narcotráfico, acabou descobrindo a conta da empresa Nager Fidelity, uma “offshore” com sede no Uruguai suspeita de estar sendo usada para lavar dinheiro de traficantes.

O procurador que aparece nos papéis da conta da Nager Fidelity, responsável por um movimento de US$ 72,4 milhões, é Carlos Eduardo Bechara Mussi.

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