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Prefeitos ganham mais que presidente Lula no Paraná

Prefeitos de 86 municípios paranaenses têm um salário maior do que o do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que é de R$ 11,4 mil (ver quadro). Nenhuma lei impede que prefeitos recebam mais do que o presidente da República. Mas é no mínimo duvidoso que quem seja o responsável por gerenciar um município tenha que ganhar mais do que quem governa um país inteiro. Uma das discrepâncias verificadas nos salários pagos no Paraná é a do prefeito de Sertanópolis (região norte do Estado), Reinaldo Ramos Reis (PSDB), que recebe R$ 18,9 mil por mês. Isso faz com que uma cidade basicamente agrícola e com pouco mais de 10 mil habitantes esteja entre as “top 10” de salário no Paraná, ao lado de municípios bem maiores e com orçamentos superiores.

Londrina, a segunda maior cidade do Estado, não figura entre as primeiras do ranking, com o salário de R$ 13,8 mil. Em contrapartida, o município de Santa Amélia, no norte pioneiro do Paraná, com 4,2 mil habitantes, paga ao prefeito R$ 11 mil. Da mesma forma, o prefeito de São Jorge do Ivaí, na região Norte, com pouco maios de 5 mil habitantes, recebe R$ 12 mil. Os menores salários pagos no Estado giram em torno de R$ 3,5 mil. Esses valores foram os informados pelos municípios ao Tribunal de Contas do Estado (TCE) no fim de 2009. Nesses seis meses já houve mudanças, conforme apurado pela reportagem de O Estado. Arapongas, por exemplo, paga atualmente R$ 19,4 mil ao seu gestor municipal. Em Maringá e Castro, o salário do prefeito hoje é de cerca de R$ 16 mil. Em Pinhais, R$ 15,6 mil.

Nos bastidores, os comentários mais frequentes de prefeitos e pessoas ligadas a eles são que esses salários são “naturais”, “justos” e “merecidos”. Quem define o salário de cada prefeito é a Câmara de Vereadores local e o prefeito não pode aumentar ou diminuir o subsídio aprovado para ele. A única condição é que o salário não pode ultrapassar o de um ministro do Supremo Tribunal Federal, de R$ 26,7 mil. No Paraná, só Curitiba atinge esse valor. “Respeitando a capacidade de cada município para essa remuneração, eu acho que um prefeito tem que ganhar bem, pela responsabilidade que assume, pelo quanto trabalha, deixando de lado inclusive afazeres particulares”, argumenta o presidente da Associação dos Municípios do Paraná (AMP) e prefeito de Castro, Moacyr Elias Fadel Junior.

Mais do que a discussão sobre o merecimento ou não do prefeito para ganhar um alto salário, é o efeito cascata que isso causa, já que o subsídio do prefeito serve de marco referencial para a remuneração de todos os servidores públicos. “Quanto maior o salário do prefeito, maior o impacto na folha de pagamento. É preciso observar a realidade local para se verificar eventuais excessos para que o pagamento de um prefeito não faça dele um marajá naquela localidade”, opina o especialista em Direito Administrativo Daniel Ferreira.

O advogado diz que se pode comparar o valor pago ao prefeito com os máximos salários pagos na iniciativa privada no município para observar possíveis discrepâncias. E sugere mudança na forma como é definido o salário do prefeito. “Não seria de mau grado que houvesse uma alteração na Constituição que fixasse parâmetros a partir da arrecadação do município”, opina. A reportagem de O Estado tentou entrar em contato com as sete prefeituras que não informaram o salário do prefeito ao TCE no ano passado, mas não obteve retorno dos responsáveis. São elas: Antonina, Curiúva, Tijucas do Sul, Salto do Itararé, Presidente Castelo Branco, Nova América da Colina e Tuneiras do Oeste. Todos os outros salários de prefeitos paranaenses, informados ao TCE em dezembro de 2009, estão em lista disponível para consulta aqui.

Portais de transparência dos municípios nem sempre são claros

A média do salário aplicado aos vereadores das maiores cidades do Estado varia de R$ 5 mil a R$ 7 mil, de acordo com os valores repassados pelas prefeituras à reportagem de O Estado. Em Ponta Grossa, por exemplo, o subsíd,io é de R$ 7,4 mil. Em Londrina, R$ 5,9 mil e em Foz do Iguaçu R$ 5,1 mil. Na última semana, o TCE informou que para atender à Lei de Responsabilidade Fiscal sobre o limite de gastos com folha de pagamento, é possível reduzir os subsídios dos vereadores. Segundo a Constituição Federal, o limite de gastos do Legislativo pode chegar até a 5% do orçamento e a despesa com pessoal, incluindo os salários dos vereadores, não pode ultrapassar 75% desse índice.

Anderson Tozato
Câmara de Municipal de Curitiba paga o maior salário de vereador no PR.

Em relação aos secretários municipais, o maior salário é na capital, R$ 12 mil. Na Região Metropolitana de Curitiba, Pinhais paga R$ 9,3 mil e Araucária R$ 7,5 mil. Em Maringá, R$ 7,8 mil. Esses e outros dados poderiam ser mais fáceis de se obter, se os municípios divulgassem as informações de forma clara em seus sites oficiais.

Desde o último mês, cidades com mais de 100 mil habitantes (que são 16 no Paraná) são obrigados a manter um portal de transparência na internet. Mas, por enquanto, os portais de transparência municipais ainda estão bem longe de serem acessíveis aos cidadãos. Salvo exceções, os portais estão pouco sujeitos à fiscalização das despesas e receitas discriminadas. A informação pode até estar na internet, mas é difícil interpretá-la. Em alguns casos, as informações disponíveis são antigas, de meses ou até anos. Isso quando o link indicado para acessar as finanças não está fora do ar (se é que algum dia esteve ali). Como tudo é recente, espera-se que esse serviço melhore. “O Brasil ainda não está aberto a esse tipo de investigação, são pequenos feudos que estão sendo desfeitos ao longo das décadas. Mas a democracia que vivemos ainda não é transparente”, analisa o doutor em Direito Administrativo Daniel Ferreira. Iniciativas não oficiais têm pipocado na internet para auxiliar os municípios nessa tarefa, como o Portal da Transparência Municipal, com sede em Salvador. A ideia é ajudar na transparência administrativa, com criação de programas para a divulgação de atos oficiais, o que pode se tornar uma tendência, pelo menos para municípios menores que não contam com essa infraestrutura.