PF acha relatório com ataques à Lava Jato na casa de executivo da Odebrecht

Entre os documentos apreendidos na casa do presidente da Odebrecht Infraestrutura, Benedicto Barbosa Silva Junior, no Rio, a Polícia Federal encontrou um relatório no qual são feitas críticas à linha de investigação da força-tarefa da Operação Lava Jato. Segundo o texto, o Ministério Público Federal está equivocado em atribuir às construtoras a organização do cartel para fraudar contratos com a Petrobras, e aponta o governo, os políticos e os partidos como “origem” e “objetivo central” do esquema de corrupção que se instalou na estatal.

As argumentações contidas no documento, que é apócrifo, indicam qual deve ser a linha de argumentação dos diretores da construtora, entre eles o presidente afastado e preso desde 19 de junho de 2015 Marcelo Bahia Odebrecht, no acordo de colaboração premiada que pretendem oferecer ao Ministério Público Federal. A intenção dos principais dirigentes da Odebrecht de colaborar com a Justiça foi anunciada nesta semana. O acordo, no entanto, nem começou a ser discutido. Os procuradores da força tarefa já deixaram expresso que querem informações consistentes, não teorias.

O texto foi encontrado pela Polícia Federal nas buscas da 23.ª fase, a Acarajé, que teve como alvo principal o casal de marqueteiros João Santana e Mônica Moura. O relatório, de oito páginas, estava junto com uma série de documentos que estavam na casa de Benedicto Barbosa, entre eles a longa planilha que relacionava nomes de quase três centenas de políticos de 24 partidos ao lado de valores. A “superplanilha”, como está sendo chamada a lista nos bastidores do poder, é a maior relação de políticos e partidos associada a pagamentos de uma empreiteira capturada pela Lava Jato desde o início da operação, há dois anos.

Distorção

O documento inicia afirmando que as opiniões do Ministério Publico no seu site sobre Operação Lava Jato correspondem a uma “distorção da realidade”. “O MP atribui organização do esquema de corrupção às empreiteiras, não ao governo, tratando financiamento de partidos políticos como uma consequência, não como origem objetivo central do esquema de corrupção. No entanto, seria necessário aprofundar as investigações antes de, apressada superficialmente, contar mentiras no site”, diz o texto.

O argumento é que as informações já disponíveis pela força-tarefa, como o que foi informado em delações premiadas, indicam que não foram as empreiteiras as “responsáveis iniciadoras” da corrupção na Petrobras. De acordo com o texto, ao analisar os fatos dessa forma, o Ministério Público adota uma “interpretação corporativista leviana, que só aborda um lado da questão, colocando Petrobrás os políticos como vítimas”.

Na interpretação contida no documento, o Ministério Público adota esta linha de não denunciar prioritariamente os políticos com mandatos, especialmente os dos partidos da base aliada do governo, porque isso poderia alterar a alçada jurídica das investigações, transferindo a competência para instâncias superiores, onde, segundo o documento, “vai dar em pizza”.

“Querem julgar rapidamente os empresários como os responsáveis pelas mazelas da corrupção no país, tornando-se heróis da pátria, julgando somente uma parte do problema, como se esta fosse causa principal, talvez porque considerem que verdadeira causa, que será julgada pelo STF, vai acabar em pizza.”

Após longa e detalhada explanação sobre o processo de contratação da Petrobras para grandes obras de engenharia pesada, o relatório afirma que a estatal, de posse de diversos desses instrumentos, e outras grandes empresas “sempre puderam impedir formação de cartéis de fornecedores”.

De acordo com o texto, os casos do Lava Jato nasceram, em certas áreas da Petrobras, “do achaque, da concussão, de empresas prestadoras de serviços fornecedoras que, equivocadamente, aceitaram praticar sobrepreço em benefício de agentes públicos, políticos seus partidos, com participação de doleiros para lavagem do dinheiro”.

A corrupção, portanto, não teria nascido das “empreiteiras”, segundo argumento contido no documento. “Ao contrário, tais empresas, com longa tradição de prestação de serviços à Petrobras, dentro da maior lisura, forçadas a contribuir para projetos de poder, começaram aceitar participar de práticas criminosas para poder conquistar contratos e cobrar seus recebíveis.”

Otários

O texto aponta duas questões, como se feitas aos responsáveis pela investigação da Lava Jato. “Que empresário, numa situação normal de concorrência, estaria disposto a se arriscar para, espontaneamente, cooptar agentes públicos para participar de esquemas de corrupção?”, questiona o documento.

Numa referência ao ex-diretor de Abastecimento da Petrobras, Paulo Roberto Costa, figura central do esquema revelado pela Lava Jato, o texto pergunta se o “amigo Paulinho” teria sido corrompido e, “generosamente” dividido o dinheiro com políticos. “Dá para acreditar que diretor da Petrobras ‘amigo Paulinho’ e outros, teriam sido corrompidos por propostas milionárias de suborno iniciadas por empreiteiras, que, generosamente, teriam tomado iniciativa de dividir suborno com dezenas de políticos com seus partidos? Será que o Ministério Público acha que somos todos otários, para acreditar nisso?”

A Odebrecht foi procurada para esclarecer e comentar o documento mas não se manifestou.