Em anexo de delação premiada, o marqueteiro João Santana informou ao Ministério Público Federal que o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e a ex-presidente Dilma Rousseff tinham ciência de pagamentos oficiais e de caixa 2 feitos como contraprestação aos serviços prestados em campanhas eleitorais. De acordo com ele, falou diversas vezes com Lula e Dilma quando necessitava fazer cobranças. “Nestas oportunidades, tanto Lula como Dilma se comprometeram a resolver o impasse e, de fato, os pagamentos voltavam a ocorrer. Tanto os pagamentos oficiais, quanto os recebimentos de valores através de caixa 2”, informa o marqueteiro no seu anexo de delação premiada.

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No depoimento aos investigadores, Santana fala da relação da Odebrecht no pagamento das dívidas de campanha e diz que Dilma e Lula sabiam que a conta seria paga com recursos de caixa dois da empreiteira baiana.

Ele narra ainda que o ex-ministro da Fazenda Antônio Palocci dizia que decisões definitivas sobre pagamentos dependiam da “palavra final do chefe”, em referência a Lula. Em dois momentos da campanha à reeleição de Lula, Santana diz ter ameaçado interromper os trabalhos em razão de inadimplência. Depois disso, o petista pressionou Palocci que “colocou a empresa Odebrecht no circuito”, segundo o anexo da delação.

Na delação, Santana foi questionado por procuradores quais questões que, segundo Palocci, dependeriam do “respaldo do chefe”. O marqueteiro disse que eram questões referentes aos valores totais de seus honorários nas campanhas.

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João Santana diz, em seu relato, que soube por sua esposa que Palocci tinha “poder quase absoluto” sobre o fundo de caixa dois do PT manuseado pela Odebrecht.

A empreiteira baiana revelou na delação premiada de seus executivos que havia uma conta corrente destinada aos governos do PT e abastecida pelo Setor de Operações Estruturadas, conhecido como departamento da propina da empresa.

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O marqueteiro confirma a existência da conta corrente. Segundo Santana, Palocci o questionou “você tem conta no exterior?”. Após uma resposta afirmativa, o ex-ministro da Fazenda disse que depósitos seriam feitos fora do País pela Odebrecht “para segurança de todos” e que a empresa tinha “o respaldo do chefe”.

Conforme os delatores, a campanha de 2006 marcaria o início de um relacionamento com o PT que se arrastaria até 2014, com a reeleição da então presidente Dilma Rousseff.

Em seus anexos de delação, Mônica Moura contou que acertou com Palocci, em 2006, os valores de caixa 1 e caixa 2 para a campanha de reeleição de Lula. Na ocasião, o petista teria informado a ela que parte do dinheiro por fora seria desembolsado em espécie e parte pela Odebrecht. Ele a teria orientado a procurar Pedro Novis, então presidente do grupo.

“O presidente Lula sabia do valor total da campanha – tanto o que seria pago oficialmente e o que seria pago por fora -, porque Palocci relatou a Mônica Moura diversas vezes, durante a negociação, na fase de discussão sobre valores, que ‘tinha que falar com o Lula, porque o valor era alto, e ele não tinha como autorizar sozinho'”, diz trecho de anexo da delação da empresária, entregue por sua defesa à Lava Jato.

“Depois, na última reunião de fechamento, (Palocci) voltou dizendo que ‘o valor da campanha (total) tinha sido autorizado pelo Presidente'”, acrescenta o documento.

Mônica Moura disse que os serviços de comunicação prestados para Lula custaram R$ 24 milhões, sendo que R$ 10 milhões teriam sido pagos de forma não oficial. Metade deste valor teria sido entregue em espécie a ela própria por um assessor de Palocci, em várias ocasiões, nos anos de 2006 e 2007.

O dinheiro, segundo ela, era acondicionado em caixas de sapato e roupas, e repassado numa casa de chá do Shopping Iguatemi, em São Paulo. A outra metade teria sido depositada pela Odebrecht na conta Shellbil, de João Santana, no exterior.

Anexo

O anexo de delação premiada é o documento em que o delator informa ao MPF o que irá contar no processo de delação. A colaboração de João Santana, assim como a de sua esposa, Mônica Moura e de um funcionário do casal, André Santana, foi assinada pela Procuradoria-Geral da República (PGR) e homologada pelo Supremo Tribunal Federal (STF). Isso significa que, a partir de agora, o que foi dito à Lava Jato pode ser usado para embasar abertura de inquéritos ou reforçar investigações já em curso.

Os anexos da delação do casal se tornaram públicos nesta quinta-feira, 11, após o ministro Luiz Edson Fachin derrubar o sigilo da delação. João Santana ficava responsável pelo contato com os principais líderes políticos, enquanto Mônica Moura, empresária, tratava de negociações financeiras.

No anexo entregue à PGR, consta que “João Santana teve um convívio íntimo inegável com Lula e Dilma, e tem plenas condições de expor com detalhes esses encontros que trataram de pagamentos não oficiais”.

O marqueteiro conta como voltou a trabalhar com Lula, antes da campanha do petista à reeleição, em 2006. Santana participou de um “diagnóstico eleitoral” para eleição do ex-presidente quando ainda era sócio do publicitário Duda Mendonça, em 2001. Em 2005, quando veio à tona o escândalo do mensalão, Santana diz ter sido chamado a Brasília de forma urgente.

No dia 24 de agosto daquele ano, foi levado por um carro oficial à casa de Palocci e de lá foram ao Planalto para encontro com Lula. Santana diz aos investigadores que Palocci afirmou que seria feita uma consultoria de pré-campanha, pois Lula seria candidato à reeleição se superasse a crise política. O presidente indicou que os pagamentos seriam feitos por Palocci e que o então ministro da Fazenda disse que a imagem de Lula seria preservada e Santana ficaria responsável pela campanha de reeleição.

Procurada por meio de assessorias, a ex-presidente Dilma Rousseff e o ex-presidente Lula ainda não enviaram manifestação sobre o assunto. O advogado de Palocci não atendeu contato da reportagem até o momento.