O sociólogo Luiz Werneck Vianna, da Pontifícia Universidade Católica do Rio (PUC-Rio), vê a democracia brasileira como se estivesse atrás de trincheiras. Se há risco de ruptura institucional, há também a reação de entidades para mantê-la protegida e imune a ataques. “A ameaça nos ronda, ela está presente em nós, mas foi identificada”, diz Werneck em entrevista ao Estado, em referência ao que chama de “capitalismo iliberal” no mundo.

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“A defesa da democracia, que está contida no texto constitucional, é muito poderosa para ser removida”, completa ele, autor de livros sobre a formação política do País, como A Democracia e os três Poderes no Brasil.

A semana que precedeu este 15 de setembro, Dia Internacional da Democracia, foi marcada por intenso debate sobre o tema. A declaração do vereador Carlos Bolsonaro (PSC-RJ), filho do presidente Jair Bolsonaro, de que “por vias democráticas” a transformação do País não acontecerá “na velocidade que almejamos” gerou críticas na Câmara, no Senado e do presidente em exercício, Hamilton Mourão.

A procuradora-geral da República, Raquel Dodge, pediu “esforço para impedir que a democracia morra”, enquanto o ministro decano do Supremo Tribunal Federal (STF), Celso de Mello, defendeu a independência do Ministério Público – após Bolsonaro dizer que indicou Augusto Aras à Procuradoria-Geral da República (PGR) por seu alinhamento de ideias com o governo. Questionado sobre as reações, Carlos respondeu que sua frase foi mal interpretada.

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Werneck vê essas manifestações como “resistência” a tentativas de se enfraquecer órgãos independentes e pilares da República. Ao Estado, ele enumerou o que considera sinais de resiliência da democracia no País.

Reação

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“Acho que a resposta da nossa sociedade já foi dada”, diz o professor sobre a reação à mensagem postada pelo filho do presidente. Ele acredita que declarações que colocam em dúvida a validade do processo democrático têm sido rebatidas pela sociedade civil, por instâncias do Judiciário, do Congresso e do MP. “A maior trincheira que a democracia brasileira tem hoje é a Carta de 1988”, diz ele. “Ela tem uma concepção democrática muito forte, muito consistente, e que tem 30 anos de vida. Poucas constituições brasileiras duraram tanto.”

Partidos

Também parte da reação, segundo ele, seria uma eventual aproximação entre partidos de centro e de centro-esquerda. O objetivo neste caso seria se colocar como alternativa ao eleitor que não se identificaria mais com a polarização. “A fisionomia que isso vai assumir mais à frente ainda não está inteiramente definida. Mas se sabe o contorno”, ele diz. “O contorno é de um liberalismo progressista.”

Mundo

“Capitalismo iliberal” é a definição que Werneck e outros estudiosos da ciência política dão a linhas ideológicas que, segundo eles, uniriam Bolsonaro a outros líderes mundiais, como Donald Trump nos EUA, Viktor Orbán na Hungria, Boris Johnson no Reino Unido e Matteo Salvini na Itália, entre outros. Em comum, eles têm um discurso nacionalista e contra organismos internacionais. “Na Inglaterra, o (Boris) Johnson está emparedado. Na Itália, a tentativa de capitalismo iliberal, pelo menos por ora, foi varrida do mapa. Está lá uma coalizão de centro-esquerda”, diz. “Por falta de sustentação social, esses arautos do capitalismo iliberal, do tipo de (Steve) Bannon, não têm encontrado guarida”, diz ele sobre o ex-estrategista de campanha de Donald Trump nos EUA, que hoje coordena o grupo O Movimento, do qual o deputado Eduardo Bolsonaro (PSL-SP) é representante no Brasil.

PGR

A indicação de Aras à PGR – visto no Ministério Público Federal como uma sinalização de que a escolha levou mais em conta o alinhamento com o governo – preocupa pouco o sociólogo. Ele lembra que Bolsonaro não é obrigado legalmente a escolher um nome da lista tríplice eleita por membros da entidade, e que Aras estará “sob estrita vigilância da sua corporação”. “Como ele vai poder operar em desconcerto com a esmagadora maioria da sua corporação? De algum modo, vai ser obrigado a atuar dentro de certos parâmetros constitucionais. Se violar, caberá a nós denunciar.”

Militares

“Acho que eles não vão cair em aventuras. Se o Mourão servir de termômetro para alguma coisa, eles não entrarão numa aventura liberticida.” As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.