Gazeta do Povo pagou multa; Requião comemora

Apesar de o jornal Gazeta do Povo e o jornalista Fábio Campana negarem a condenação pelo TSE (Tribunal Superior Eleitoral) em ação movida pelo governador Roberto Requião (PMDB) por divulgação de pesquisa de intenção de votos não registrada na campanha eleitoral do ano passado, a sentença foi proferida e o jornal recolheu a multa de R$ 50 mil no dia 29 de outubro. Já o colunista não pagou a multa e conforme despacho do TSE do dia 4 de novembro, o demonstrativo do débito foi remetido à Procuradoria da Fazenda Nacional, para inscrição em dívida ativa. A ação contra o jornal foi extinta.

A decisão do TSE foi comemorada pelo governador Roberto Requião (PMDB), que tem divergências antigas com a direção da Gazeta do Povo e da Rede Paranaense de Comunicação. Em solenidade no Palácio Iguaçu, anteontem, durante o lançamento de um programa para a extinção dos lixões a céu aberto, Requião atacou o proprietário do grupo, Francisco Cunha Pereira, e o jornalista Fábio Campana, a quem chamou de “fraudadores da opinião pública”.

Requião disse aos prefeitos presentes à solenidade que havia tido “uma alegria fantástica” ao ser comunicado da decisão do TSE sobre a ação que o PMDB moveu no ano passado quando o jornal publicou dados de uma pesquisa não registrada apontando queda nos seus percentuais de intenções de votos. “Todos os prefeitos presentes aqui sabem o que significa a manipulação de pesquisas eleitorais, a fraude de jornais e televisões, dando resultados inverídicos na tentativa de alterar o resultado final de uma eleição”, comentou o governador. Em tom provocativo, disse ainda que o proprietário do jornal e o colunista haviam ficado “R$ 50 mil mais pobres” e para ele, bastavam os R$100 mil, que devem ser pagos à Justiça Eleitoral.

O governador ressaltou que, mais importante do que o valor da multa era a sua aplicação. “O mais importante é que a Justiça Eleitoral agiu com dureza contra os fraudadores da opinião pública, no caso o jornal Gazeta do Povo e o Fábio Campana, que é um colunista da Gazeta do Povo”, afirmou. Requião se referiu ainda mais uma vez a Campana, citando que ele é funcionário da Assembléia Legislativa do Paraná. “Era até preciso que os nossos deputados olhassem se ele aparece lá ou se recebe pelo Correio o contracheque…”, atacou.

Advogado de Campana envia resposta

A direção de O Estado recebeu ontem uma carta do advogado Francisco Alpendre, que representa o jornalista Fabio Campana na ação movida pelo PMDB, apresentando a versão do colunista sobre o episódio.

É a seguinte a íntegra da carta:

“Na qualidade de advogado do jornalista Fábio Campana, profissional da mais alta credibilidade e respeitado como tal há mais de 30 anos em todo o território nacional, cumpre esclarecer fatos tecnicamente deficientes e que não correspondem à verdade publicados nos periódicos O Estado do Paraná, nas páginas 1 e 5 e Tribuna do Paraná, páginas 1 e 3 ambos datados desta quarta-feira, 12 de novembro.

Para tanto, forçoso relatar um pequeno histórico do caso em voga.

1. Em 25 de julho de 2002, o jornalista Fábio Campana, na coluna de mesmo nome publicada há quase 10 anos no Jornal Gazeta do Povo, relatou a seguinte nota:

?DISTÂNCIA

Aumentou a distância que separa Álvaro Dias de Roberto Requião. Os nove passos agora são 13. O suficiente para que o pirotécnico Edson Gradia fosse acionado ontem no arraial da Frente Trabalhista?.

2. Em agosto de 2002 o PMDB, Partido do Movimento Democrático Brasileiro protocolou REPRESENTAÇÃO junto ao TRIBUNAL REGIONAL ELEITORAL DO ESTADO DO PARANÁ requerendo a condenação do Sr. Fabio Campana e do Jornal Gazeta do Povo por, em sua ótica, terem ambos incorrido no art. 33, par. 3º. da Lei 9504/97 que assim preceitua:

?A divulgação de pesquisa sem o prévio registro das informações de que trata este artigo sujeita os responsáveis a multa no valor de cinqüenta mil a cem mil UFIR?.

3. Não obstante, o PMDB requeria a censura prévia da coluna do jornalista Fabio Campana e do Jornal Gazeta do Povo, com pedido de tutela inibitória sem a ouvida de ambos.

4. Primeira mentira do atual Governador: O SR. ROBERTO REQUIÃO DE MELLO E SILVA JAMAIS PARTICIPOU DESTA AÇÃO. Conforme comprova documento acostado a este ofício, este cidadão não é parte. Não é autor. Não é assistente litisconsorcial. Não é sequer terceiro interessado. É tão interessado nela quanto o Presidente do Congo.

3. Em agosto do mesmo ano, o Sr. PAULO CÉSAR BELLIO, juiz auxiliar do Tribunal Regional Eleitoral do Estado do Paraná REJEITOU, tanto em relação ao jornalista Fabio Campana quanto ao jornal Gazeta do Povo, em respeito ao direito constitucional da liberdade de expressão e informação o pedido de censura prévia proposto pelo PMDB e posteriormente considerou a ação IMPROCEDENTE, corroborado pelo então Procurador Regional Eleitoral Sr. João Gualberto Garcez Ramos.

4. Não conformado, o PMDB recorreu ao Egrégio Tribunal Regional Eleitoral do Estado do Paraná buscando nova decisão.

5. Em decisão UNÂNIME, composta por um colegiado, incluindo o ínclito representante do Ministério Público Eleitoral o TER REJEITOU a apelação, dando novo ganho de causa ao jornalista Fábio Campana e à Gazeta do Povo com a seguinte assertiva: ?a pequena nota divulgada no jornal do dia 25 de julho, tão combatida, contendo mera opinião a respeito do quadro eleitoral, não se enquadra na pesquisa eleitoral em seu sentido técnico-jurídico, necessário de prévio registro?.

6. Não conformado, o PMDB interpôs embargos de declaração, declarando haver omissão no julgamento do Tribunal.

7. Mais uma vez, não teve sucesso.

8. Não nos cansemos. Mais uma vez açodado, o PMDB interpõe, junto ao Presidente do Tribunal Regional Eleitoral do Estado do Paraná, RECURSO ESPECIAL, objetivando levar o processo até o TSE, onde uma Turma composta por Ministros daquela Casa poderia apreciar, pela 4.ª vez, o mesmo pedido.

9. Considerando que os requisitos legais não estavam preenchidos, a Presidência do TRE/PR, cargo ocupado à época pelo eminente Desembargador Gil Trotta Telles nega seguimento ao Recurso Especial.

10. Pela 5.ª vez inconformado (não percamos a conta) o PMDB ingressa com um “recurso” chamado Agravo de Instrumento, objetivando levar o processo até o TSE.

11. A Exma. Sra. Subprocuradora Geral da República, Dra. Helenita Caiado de Acioli e o então Procurador-Geral Eleitoral, Sr. Geraldo Brindeiro concluíram no parecer a respeito do Agravo de Instrumento que ?não restou demonstrada a violação dos preceitos legais invocados nem tampouco ficou caracterizada a divulgação de pesquisa eleitoral sem prévio registro, uma vez que a nota em comento limitou-se a mera opinião eleitoral?.

12. Disseram mais: (…) o acórdão decidiu com base no contexto probatório carreado para os autos. Destarte, o conhecimento do recurso implicaria no revolvimento de fatos e provas, vedado nessa instância, a teor da jurisprudência dominante nos tribunais superiores (pág. 118 dos autos).

13. Não obstante, em julgamento em forma de despacho, O Ministro Carlos Velloso, NA LONGÍNQUA DATA DE 08/05/03 (há mais de seis meses, portanto), mesmo com 6 julgamentos anteriores desfavoráveis, deu ganho de causa ao PMDB, tratando curiosamente no mesmo ato da subida do Agravo de Instrumento e do Recurso Especial em mero despacho, SEM CONSULTAR O PROCURADOR REGIONAL ELEITORAL para este último julgamento e, ainda mais grave, SEM LEVAR O CASO AO JULGAMENTO DO PLENÁRIO DO TRIBUNAL SUPERIOR ELEITORAL, não permitindo ao jornalista Fábio Campana e do jornal Gazeta do Povo exercerem seu amplo direito constitucional de ampla defesa.

14. O jornalista Fabio Campana, por meio de seu corpo jurídico, discutindo a legalidade formal da decisão, interpôs, mesmo depois do trânsito em julgado da sentença, Ação Rescisória, que , segundo Humberto Theodoro Júnior, ?é o meio eficaz de reparar a injustiça da sentença transitada em julgado, quando o seu grau de imperfeição é de tal grandeza que supere a necessidade da segurança tutelada?. Trata também de interpor Medida Acautelatória no STF já que entende tratar-se de violação ao seu direito constitucional de liberdade de expressão e opinião. Mais do que jornalista. Como cidadão.

15. Não obstante, ainda que fosse condenado de maneira irreversível e que estes recursos tivessem sido julgados desfavoráveis (fato este que até agora não aconteceu), o Jornalista Fábio Campana contestaria, por meio de embargos, a liquidez e legitimidade do débito junto à Fazenda Pública da União, órgão competente para cobrar dívidas contraídas junto à Justiça Eleitoral.

16. Curiosamente, o Sr. Roberto Requião de Mello e Silva possui vários não recolhidos, como atesta certidão deste órgão em poder deste advogado. Curioso, também, é que o próprio Governador Roberto Requião, à época em que era Senador da República, no ano de 1999, votou AUTO-ANISTIA em favor de si próprio para não pagar as multas cometidas por infração à legislação eleitoral (disponível em www.senado.gov.br). Com muita propriedade o jornalista José Neumanne Pinto, em artigo publicado no Jornal da Tarde em 12/12/99, relatou o fato ?Se não sobra em (Jader) Barbalho moral para cobrar ética de quem quer que seja, não lhe falta companhia. Na semana passada, ainda na mesma semana passada, seu colega de partido e companheiro de púlpito moral, Roberto Requião (PR), atribuiu o fato de votar a favor da auto-anistia do pagamento de multas por infrações cometidas contra a legislação eleitoral ao fato de possuir sangue nas veias. Ainda recorreu ao nobre exercício de legítima defesa para justificar o que não passou de “causa própria”. O combativo senador, que vive a esfregar o dedão e a depenar com a língua a reputação de acusados nas CPIs em que adora brilhar, não é primário em infrações contra a legislação eleitoral?.

17. De todo o exposto, conclui-se, apoiado em documentos e não em meras bravatas:

O Sr. Roberto Requião de Mello e Silva não processou o jornalista Fábio Campana e o Jornal Gazeta do Povo, conforme documento em anexo, que demonstra a inicial do processo.

O Sr. Roberto Requião de Mello e Silva não recebeu nem receberá qualquer quantia em dinheiro do Jornal Gazeta do Povo, do jornalista Francisco da Cunha Pereira Filho, seu diretor e do jornalista Fábio Campana. Passará, portanto, um natal magro e sem muitos atrativos pecuniários.

O Jornalista Fábio Campana ainda contesta, em Brasília, a legitimidade da decisão monocrática do Ministro Carlos Velloso, apoiado em pareceres de todo o corpo do Ministério Público.

Ainda que não obtivesse êxito neste processo, o que cremos não acontecerá, o jornalista Fabio Campana contestaria junto à Fazenda Pública Nacional o débito por meios legais.

O jornalista Fábio Campana, ao contrário do Governador do Estado, jamais pagou à Fazenda Pública Nacional quaisquer débitos referentes à infrações eleitorais muito menos legislou em causa própria, procurando eximir-se de suas obrigações legais.

O jornalista Fábio Campana continuará exercendo sua profissão como sempre.

O jornalista Fábio Campana confia nas opiniões do Ministério Público Eleitoral do Estado do Paraná e da República.

Agradecendo a atenção dispensada, mantenho-me à disposição para dirimir quaisquer dúvidas, bem como para a apresentação de todos os documentos relatados neste esclarecimento.

Curitiba, 12 de novembro de 2003 Francisco Alpendre Advogado.”

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