Ana Cristina da Silva Toniolo, filha do ex-presidente da Eletronuclear Othon Luiz Pinheiro da Silva, investigado por suposto envolvimento em esquema de pagamento de propina nas obras da usina nuclear de Angra 3, disse, em depoimento nesta sexta-feira, 29, que o pai recebeu dinheiro da Deutschebras por meio de um contrato fictício. Alegou, porém, que os recursos eram lícitos. Segundo ela, Othon explicou que precisava receber uma comissão devida pela empresa, da qual foi sócio, referente a contratos que ele havia ajudado a conquistar no passado.

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“Na época, achei que eles estavam apenas arrumando uma forma legal de a empresa receber aquele dinheiro. O contrato não era verdadeiro, era para justificar o recebimento daquela participação”, disse em depoimento de cerca de duas horas à 7ª Vara Federal Criminal do Rio de Janeiro.

Ana Cristina entrou como sócia na Aratec Engenharia, empresa do pai, em 2004. No ano seguinte, quando Othon foi nomeado presidente da Eletronuclear, ela assumiu a administração da companhia. Ela alegou, porém, que só passou a exercer de forma efetiva funções administrativas em 2008 – antes disso, era a secretária de Othon quem recebia contratos e emitia notas fiscais.

Mesmo à frente da administração da Aratec, Ana Cristina assegurou diversas vezes durante em seu depoimento que apenas seguia ordens do pai. A obediência, segundo ela, era uma cobrança sempre presente na família de Othon, hoje militar da reserva. “Papai nunca se meteu no meu serviço, eu também não me metia em nada dele”, afirmou, alegando não saber detalhes dos trabalhos supostamente realizados.

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Era Othon quem entrava em contato com a filha dizendo para que ela tratasse dos contratos com CG Consultoria, JNobre Engenharia e Consultoria e Deutschebras, todas suspeitas de terem intermediado pagamentos de propina da Andrade Gutierrez, uma das empresas que atuava em Angra 3, para o ex-presidente da Eletronuclear. Sócios das duas primeiras empresas reconheceram, em audiência na última quarta, 27, que atuaram como intermediários, mas disseram desconhecer que o dinheiro era ilegal.

‘Ordem’

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Segundo Ana Cristina, uma vez recebida a ordem do pai, ela era instruída pelos próprios sócios das empresas envolvidas sobre como proceder. Da CG Consultoria, por exemplo, recebia contratos por correio e tabelas por e-mail os valores e datas dos pagamentos. A filha, que também é engenheira, afirmou que nunca soube detalhes do serviço prestado por Othon. “Pai militar, criado em fazenda, só filha mulher. É difícil”, disse. “Nem questionava.”

A filha de Othon argumentou, porém, que os contratos com a CG e com a JNobre eram reais e se referiam a trabalhos efetivamente realizados. “Pelo que eu entendi, não era (contrato fictício)”, afirmou. Prova disso seriam os estudos realizados por ela, uma espécie de “relatório final” de cada projeto.

O Ministério Público Federal em Curitiba detectou, porém, que pelo menos um dos estudos apresentados por Ana Cristina era plagiado da internet. “A orientação era que eu elaborasse um estudo a partir de uma compilação de dados. Então, fiz uma compilação de dados a partir de informações encontradas na internet”, defendeu-se.

Ana Cristina afirmou que ficou magoada com o pai quando ele, em depoimento, acusou seu marido de ter sido o responsável pelas operações ilícitas. “Isso foi um choque para a família. Fiquei muito magoada, meu marido também. Vi ali uma tentativa de ele sair de uma situação de estresse”, afirmou. “Ele virou minha família do avesso.”

A filha de Othon, porém, alternou as declarações ressentidas com momentos emocionados em que narrava o nacionalismo do pai e o esforço dele em produzir heranças relevantes na área de energia para o País. Também disse que o pai sempre foi amoroso e, por duas vezes, chorou. “Meu pai sempre teve preocupação de nos preservar de qualquer atividade dele. Preservar a família era prioridade número um”, afirmou.

“No afã de fazer a coisa certa, ele fez errado”, acrescentou Ana Cristina. “Acho que ele não podia imaginar que estaria me fazendo esse mal.”