A Comissão da Verdade de São Paulo está convencida de que o envolvimento de agentes diplomáticos dos Estados Unidos com a ditadura militar (1964-1985) foi mais direto do que se imagina. Por causa disso, seus integrantes vão enviar à Comissão Nacional da Verdade uma solicitação para que analise mais detidamente as denúncias sobre a presença de americanos nas sessões de interrogatório de presos políticos.

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A decisão foi tomada ontem após depoimento do ex-deputado federal Ricardo Zarattini (PT-SP) durante uma audiência pública da comissão. Ele recordou que, em 1969, quando esteve preso no Recife, na sede do Departamento de Ordem Política e Social (Dops), foi interrogado na presença de dois funcionários do consulado americano. Um deles era Richard Huntington Melton, que mais tarde se tornou embaixador dos EUA no Brasil.

Segundo Zarattini, o interrogatório ocorreu após várias sessões de tortura. “Os dois não me torturaram”, esclareceu. “Um deles me perguntou: ‘Por que você é contra os Estados Unidos?’ Eu respondi que não era contra os Estados Unidos, mas contra o imperialismo”.

Zarattini militava no Partido Comunista Revolucionário e tentava organizar um movimento de guerrilha rural na zona canavieira pernambucana. Depois do interrogatório, disse ontem, não viu mais os americanos.

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Só foi saber que um deles era Melton em 1989, quando foi nomeado embaixador e os jornais publicaram fotos dele. O caso provocou polêmica na época e a aceitação da nomeação, o chamado agreement, demorou mais que o usual. Segundo informações obtidas por Zarattini, o Itamaraty teria consultado o Ministério da Justiça, que afirmou não haver indicação do envolvimento de Melton com o Dops.

A Comissão Estadual vai oficiar a Comissão Nacional e a Comissão Helder Câmara, de Pernambuco, para que seja investigado de maneira mais detalhada o envolvimento de Melton com a repressão. “A participação do agente diplomático no interrogatório é gravíssima”, disse ontem Amélia Telles, assessora da comissão. “E esse caso não é único.”

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Zarattini disse que decidiu rever o caso de Melton após a leitura de reportagem do Estado, publicada em fevereiro, revelando que um agente do consulado americano em São Paulo era frequentador assíduo do Dops paulista. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.