Código Florestal restritivo impactaria menos produção

Se a presidente Dilma Rousseff vetar o projeto de lei aprovado na Câmara que reforma o Código Florestal e retomar um texto nos moldes do votado no Senado no fim de 2011, a perda de produção agrícola no País pode ficar em torno de 3 milhões de hectares. O número, que considera a recuperação de matas ciliares, foi obtido com base em análise de especialistas em cima de cálculo do Ministério do Meio Ambiente sobre quanto deveria ser recomposto de vegetação natural com o texto do Senado.

No ano passado, uma projeção feita no Departamento de Florestas da Secretaria de Biodiversidade e Florestas do MMA considerou que, ao todo, seriam necessários recuperar cerca de 31,5 milhões de hectares (Mha), sendo 18 Mha de Reserva Legal e entre 12,5 Mha e 15 Mha de Área de Preservação Permanente. No entanto, especialistas ouvidos pelo Estado ponderam que o foco tem de ser em APP, visto que o texto do Senado prevê a possibilidade de o déficit de reserva legal ser compensado em outra área.

Por outro lado, em APPs, pesquisas apontam que o grosso de sua ocupação não é para produzir arroz e feijão. Cerca de 80% do uso irregular é de pecuária de baixa produtividade – somente os 20% restantes seriam de fato são ocupados por agricultura. Daí o cálculo de que a perda de área para produção agrícola seria de no máximo 3 Mha.

A questão é delicada hoje no Brasil porque faltam dados sobre como se dá exatamente a ocupação do solo no Brasil. Cálculos a partir de imagens de satélite não são 100% precisos e ainda não existe uma adesão dos proprietários ao cadastro rural.

Compensação polêmica

Os ruralistas, por exemplo, têm uma visão mais dramática. A senadora Kátia Abreu (PSD/TO) considera que se voltar o texto do Senado, o Brasil vai acabar abrindo mão de toda a área prevista na recuperação – que ela diz ser ainda um pouco maior, de 33 milhões de hectares.

Ela questiona, por exemplo, a compensação de RL em outro lugar. “Só temos 27,7% de área de produção agrícola no Brasil, descontados os 11% que são preservados nas propriedades particulares. O resto do País é terra devoluta do Incra, terra de índio, parques nacionais ou terras de Marinha e Exército e cidade. Onde eu vou arrumar floresta para compensar mesmo? É lógico que é em área de produção.”

A análise considerada pela comunidade científica é bem diferente. De acordo com cálculos do agrônomo Gerd Sparovek, da Esalq/USP, sobram áreas para fazer essa compensação.

“A sobra que existe de vegetação natural fora de APP e RL e de Unidade de Conservação são 294 milhões de hectares. Não é tudo propriedade privada, claro. Isso inclui terra pública não destinada, que não tem titulação e que não sabemos quanto é exatamente”, afirma. “Mas tem área suficiente em todos os biomas. O que acontece é que alguns Estados não têm, como São Paulo e Paraná. As propriedades deles teriam de compensar no mesmo bioma, mas em outros Estados.”

O texto do Senado prevê essa possibilidade. E pressupõe também que a compensação é uma espécie de mecanismo de mercado. “O proprietário que ceder sua terra para outro proprietário resolver seu déficit vai receber por isso. Não é bondade”, diz.

O próprio censo agropecuário do IBGE de 2006 – o mais recente – conta uma história diferente. Segundo o levantamento, os proprietários rurais declararam a existência em suas terras de 94 Mha de florestas, sendo 50,2 Mha destinadas para APP ou RL; 8,2 Mha são de florestas consorciadas com pastagem e 35,6 Mha são de matas e florestas fora de APP. Em teoria, a compensação poderia também ocorrer aí.

Pastagem improdutiva

Por isso, defendem pesquisadores, o foco se volta para as regiões de mata ciliar. Nelas sim a recuperação envolve transformar área hoje usada para produção.

Segundo projeção feita por Sparovek sobre o total de déficit de área protegida em propriedades agrícolas hoje no Brasil, com base no Código Florestal ainda vigente, faltam cerca de 55 Mha de APP. Desses, 45 Mha seriam ocupados por pecuária e 10 Mha por agricultura. Daí sai a proporção citada no início do texto.

E recuperar pastagem, dizem os cientistas, é na verdade um bom negócio para o próprio produtor. Como em geral no Brasil a produtividade dessas áreas é muito baixo, em torno de uma cabeça de gado por hectare, investimentos que pudessem ao menos dobrar isso acabariam liberando cerca de 70 Mha no País e compensariam a “perda” com a recuperação de mata. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.