Em menos de duas semanas após a posse do novo governo, decisões tomadas por Jair Bolsonaro, por integrantes de seu primeiro escalão ou por seu partido, o PSL, foram vistas com desconfianças na base mais fiel de seguidores do presidente da República, a chamada rede bolsonarista na internet.

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O acordo com o presidente da Câmara, Rodrigo Maia, a indicação do filho do vice-presidente, Hamilton Mourão, para cargo mais alto no Banco do Brasil e até mudanças na legislação armamentista, uma das bandeiras de Bolsonaro, geraram discórdia nas redes sociais entre apoiadores e influenciadores digitais da ‘nova direita’.

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As primeiras críticas de apoiadores de Bolsonaro surgiram no dia seguinte à posse, dia 2, quando o PSL anunciou que referendaria a reeleição de Rodrigo Maia (DEM) à Câmara. Seguidores do presidente associaram a aliança à “velha política” e ao “toma lá da cá”, práticas que o próprio presidente diz combater.

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Bolsonaro, então, já como presidente empossado, retuitou uma publicação do perfil ‘Coluna de Direita’, no Twitter, que dizia que “algumas pessoas têm de entender como se joga xadrez” – depois, a publicação foi apagada do perfil do presidente. Os 52 deputados eleitos pelo PSL, partido do presidente, devem votar em Maia em troca presidência de comissões importantes como a Constituição e Justiça.

Nomeação

As divergências na rede bolsonarista aumentaram após a nomeação do filho do vice-presidente, Hamilton Mourão, como assessor especial da presidência da Banco do Brasil. O salário de Antônio Hamilton Rossel Mourão, funcionário de carreira da instituição, foi triplicado depois da posse do pai – de R$ 12 mil para R$ 36 mil.

Mourão disse que o filho “tem mérito” e que foi “perseguido anteriormente”. A justificativa não agradou a todos. Para o perfil Senso Incomum, que tem pouco mais de 100 mil seguidores no Twitter e apoia o presidente, o general Mourão começou “errando terrivelmente”.

Outro influenciador digital na rede bolsonarista que criticou a promoção do filho de Mourão foi o jornalista e apresentador Allan dos Santos, para quem a nomeação não tinha “odor de nova política”. “O VP (vice-presidente) errou feio e ninguém que o critique pode ser tratado como inimigo”, escreveu no Twitter.

Ao jornal O Estado de S. Paulo, Santos disse que a crítica que fez e a repercussão que ela teve são exemplos de que, segundo ele, a “direita não pensa em bloco.” “A publicação foi criticada e isso é bom, pois mostra que as pessoas da direita não pensam em bloco, como ocorria na era PT – onde as divergências eram camufladas. A mídia quer me entrevistar sobre esta publicação, mas jamais mostrou a discordância entre Rui Costa Pimenta do PCO e Jean Wyllys do PSOL”.

Para ele, os comentários representam a liberdade de “expor nosso ponto de vista ao problema em questão e o confronto de ideias, fundamental para a uma vida social sadia”. “Como jornalista, não escondo de ninguém o meu apoio ao presidente. O que não significa deixar de expor opiniões divergentes. É o próprio presidente que me dá essa segurança, uma vez que ele é aberto ao diálogo”.

Armas

Tema caro aos bolsonaristas, a posse e o porte de arma geraram intenso debate nas redes após o SBT divulgar a minuta do decreto elaborado pelo Ministério da Justiça – a proposta pode restringir a posse de armas de seis para duas por pessoa e também exigir a presença de um cofre para armazenar armas de cano curto em casas com crianças, adolescentes e pessoas com deficiência mental.

Um dos maiores defensores da legalização do porte e posse de armas no País, Bene Barbosa, presidente da ONG Movimento Viva Brasil e autor do livro Mentiram Para Mim Sobre o Desarmamento, criticou a proposta do presidente.

Também ativo nas redes sociais, um dos filhos de Bolsonaro, Eduardo, rebateu e disse que estão “criticando o decreto sem o conhecerem”. Menos de dez minutos depois, Bene foi às redes e cobrou a publicação da minuta do decreto das armas. A cobrança levou à reação de outro filho do presidente, Carlos, responsável pela estratégia do presidente nas redes sociais durante as eleições. “Falar menos do que não sabe dos fatos”.

Bene reagiu: “São 30 anos trabalhando e abrindo mão de muita coisa. Isso me dá um pouquinho de direito de comentar o que eu bem entender. Não se trata de antecipação, mas de cuidado. Entendeu o porquê?” O bate-boca virtual levou o músico Roger, do Ultraje a Rigor, a entrar na discussão pedindo para que a discussão ocorresse no privado para “não darem munição à oposição”.

Ao jornal, Bene disse que não se trata de um descontentamento com o presidente, e sim de uma preocupação compartilhada no meio de atiradores e colecionadores, onde Bene é influente. “Essa decisão (do decreto) está a cargo do ministro Sérgio Moro, e a gente não tem conhecimento nem dados para saber qual o posicionamento dele”, disse. “As críticas, em última análise, são ao ministro, que é de onde está vindo essa minuta. O que não significa que, na hora de assinar, o documento também seja completamente diferente”, ponderou.

Bene deseja que a lei não gere mais restrições do que há hoje. “Não adianta flexibilizar de um lado e engessar do outro. Ter a arma para defesa trancada no cofre é inútil, não serve para nada. Além disso, hoje, são seis armas. Reduzir é criar mais restrição”.

Para o cientista político Luiz Bueno, professor da Faap, críticas a ações do governo são naturais. Para ele, o que pode acelerar o processo é o “desencontro de informações” como ocorreram nos últimos dias como o possível aumento do IOF.

Bueno diz ainda que, após a campanha, a realidade se impõe. “Às vezes, as pessoas esperam mais do que é possível em termos de negociações e concessões que o governo terá de fazer”, diz. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.