Bate-boca na audiência da CPMI do Banestado

A Comissão Parlamentar Mista de Inquérito do Banestado teve ontem uma de suas sessões mais conturbadas no Paraná.

Os trabalhos, no plenarinho da Assembléia Legislativa, foram suspensos logo pela manhã, em função de habeas corpus obtido junto ao Supremo Tribunal Federal (STF) por um dos depoentes convocados, Alberto Dalcanale Neto, que foi presidente do banco Araucária, liquidado pelo Banco Central em 2001.

O pedido, acatado pelo ministro Marco Aurélio de Mello, é extensivo a outros três depoentes e garante a prerrogativa constitucional do advogado orientar seu cliente durante o interrogatório, assegura seu direito de permanecer calado quando a resposta puder incrimina-lo e dispensa a assinatura do termo de compromisso. Liminar semelhante foi apresentada também pelos empresários Affonso Celso Braga e Affonso Celso Braga Filho, concedido pela ministra Ellen Gracie Northfleet.

Polêmica

Representando a seccional paranaense da Ordem dos Advogados do Brasil, da qual são conselheiros, os advogados Rolf Koerner e Renato de Andrade, fizeram apelo ao relator da CPMI, deputado José Mentor (PT-SP), para que o benefício das liminares se estendesse aos demais advogados e seus clientes, uma vez que se tratava do simples reconhecimento de uma norma consagrada pela Constituição Federal.

Mentor não aceitou, gerando uma acalorada discussão com Koerner e Andrade, que o interpelaram no plenário. Os dois consideraram a atitude arbitrária e informaram que vão levar à reunião de hoje da OAB-PR o pedido de representação contra Mentor e a deputada Clair Martins (PT-PR), os dois únicos membros da comissão presentes na audiência, junto à OAB federal. Como ambos são advogados com registros ativos na Ordem, os paranaenses querem que seus registros sejam cassados por desrespeito às leis que regem o exercício profissional.

A ameaça não sensibilizou Mentor, que manteve a decisão alegando que estava ali na qualidade de deputado federal, investido no papel de juiz que lhe concede a CPMI. A deputada Clair Martins aceitou a decisão do colega, mas observou que o fazia com ressalvas.

Depois dos incidentes, os depoimentos ficaram bastante esvaziados. O primeiro a falar aos deputados foi o ex-diretor do banco Araucária, Fernando da Silva Peixoto. Como está indiciado em processo que corre na Justiça Federal e já depôs outras, inclusive à CPMI, ele apenas confirmou informações que já havia dado anteriormente. A outras perguntas ele se limitou a responder que permaneceria calado.

Liminar

A ação que garantiu a Alberto Dalcanale o direito de um depoimento orientado por seu advogado informa que ele e Ruth Whately são réus em várias ações penais que tramitam na Justiça Federal do Paraná.

Conforme o habeas corpus, apenas Carlos Roque Cassimiro ainda não foi ouvido pela comissão. Em relação aos demais, a defesa argumenta que nada mais teriam a dizer à Comissão. A defesa pede a concessão de medida liminar para expedição de salvo-conduto que garanta aos investigados o direito ao “silêncio absoluto”, bem como o de não terem decretadas suas prisões. O benefício também é requerido para que não sejam obrigados a assinar termo de responsabilidade.

Polêmica atrasa trabalhos

As divergências com advogados dos depoentes convocados e uma reunião com a força-tarefa constituída pelo Ministério Público, Polícia e Receita Federal, na sede da Polícia Federal, atrasou em mais de uma hora o inicío das oitivas. Estavam previstos 14 depoimentos, mas às 18h a comissão ainda ouvia o quarto, da ex-diretora de câmbio do banco Araucária, Ruth Whately Bandeira de Almeida, que foi à portas fechadas.

Ela invocou o benefício concedido pelo habeas corpus do STF, acrescentando que já havia respondido a vários interrogatórios. A própria CPMI a ouviu por seis horas, em Brasília, em agosto do ano passado. Ela disse que já havia dado todas as informações que estavam ao seu alcançe, reafirmou que as operações realizadas pelo banco não eram ilícitas e negou que o Araucária tivésse contas “laranja”. Ainda assim, após uma conversa de seus advogados com a Mesa, a sessão foi transformada em secreta na tentativa de ouvi-la sobre fatos que teriam sido levantados após seus depoimentos anteriores.

Antes dela a CPMI ouviu outro ex-dirigente do Araucária, Fernando da Silva Peixoto, a funcionária aposentada do Banco Central na regional paranaense, Célia Marly Fávaro, e o empresário Affonso Celso Braga Filho. Célia foi confrontada com um parecer de sua autoria, dado em 1995, aconselhando o Bacen interromper as operações cambiais do banco Araucária em razão de “procedimentos irregulares contumazes”.

Ela reconheceu o documentos mas não deu maiores detalhes, afirmando que não tem lembrança dos fatos. Admitiu, entretanto, que “é espantoso” que o Banco Central tenha concedido autorização especial para o Araucária operar com as CC5 quatro meses após o seu parecer.

Braga Filho levou ao pé da letra o salvo-conduto concedido pelo STF. A todas as perguntas que lhe foram feitas deu a mesma resposta: “Reservo-me o direito de permanecer calado”.

Mentor explica prorrogação

Na entrevista que deu aos jornalistas pela manhã, o relator da CPMI do Banestado, deputado José Mentor (PT-SP) explicou que a terceira sessão feita pela comissão este ano no Paraná tem o objetivo de completar a oitiva de depoimentos para fechar as investigações de evasão de divisas para paraísos fiscais através das contas CC5 em Foz do Iguaçu e Curitiba.

Segundo ele, os trabalhos estão bastante avançados. A explicação para o pedido de prorrogação do funcionamento da comissão por mais 180 dias, que deve ser votada na próxima sessão do Congresso, é a existência de vários focos de investigação. Se o do Paraná está no fim, outros estão apenas começando. Entre esses, ele destacou operações casadas de evasão de divisas para o exterior com investimentos de valor idêntico em bancos brasileiros.

Ele não quis adiantar quais os depoimentos mais importantes a serem colhidos em Curitiba. Disse que todos são importantes para arrematar o quadro que começou a ser montado com a Operação Macuco, que apontou a remessa irregular de mais de USS 30 milhões entre 1996 e 2002.

A agenda de hoje da CPMI, ainda sujeita a alterações, prevê a oitiva do ex-diretor do banco Del Paraná, Anísio Resende de Souza; do ex-gerente do Banestado em Nova York, Ércio de Paula Santos; dos funcionários do Bemge, Líliam Hipólita Garcia, Henrique Futhyk, Cássia Regina Lázaro Werner; dos ex-diretores do banco, João José de Miguel e Miramar Bottini Filho; do gerente comercial Edmilson Rolon e do vice-presidente de Finanças do banco Ronaldo Lamounier Locatelli; do empresário Sérgio Luiz Malucelli; e dos ex-funcionários do Banco Central, Gerson Moura da Silva e Rosa Regina Mehl. Também estavam relacionados para depor o ex-funcionário do Banestado José Luiz Boldrini, e os funcionários do Bacen, José Rafael Schmidt Neto e Jackson Pitombo Cavalcante Filho.

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