Poder Normativo e Arbitragem nos Tribunais do Trabalho

A resolução do Tribunal Superior do Trabalho, adotada em 20 de março de 2003, em cancelar a Instrução Normativa 04, de 1993, que estabelecia o procedimento e requisitos para a tramitação de dissídios coletivos de trabalho, marcou a reconstrução do poder normativo da Justiça do trabalho. Nos últimos anos vinha ocorrendo o esvaziamento desse instituto fundamental para o Direito do Trabalho e para as relações coletivas de trabalho. A IN-4/93-TST dificultava ao máximo a instauração e andamento dos dissídios coletivos de trabalho, assim também pela jurisprudência e precedentes normativos contrários às principais e mais importantes decisões históricas da Justiça do Trabalho em favor da classe trabalhadora e de suas entidades sindicais. Resta, ainda, a eliminação dessas orientações jurisprudenciais e precedentes normativos que criam obstáculos aos Tribunais à plena aplicação dos princípios que norteiam o poder normativo.

De março de 2003 até o presente momento podem ser anotados alguns procedimentos que têm fortalecido as decisões normativas dos Tribunais do Trabalho. O primeiro deles é a não concessão de efeito suspensivo, pelo presidente do TST, aos reajustamentos salariais definidos nos julgamentos regionais, confirmadas as cláusulas de reajuste, aumento e pisos salariais definidos na instância inicial. O segundo, é a confirmação, quer nos despachos do presidente do TST, quer nos julgamentos naquela Corte, das cláusulas historicamente consagradas nas convenções e acordos coletivos de trabalho, mantendo direitos conquistados há muitos anos pela classe trabalhadora e fruto de sua luta por melhores condições de trabalho, de salário e de vida. O terceiro, de igual importância, a gradativa ampliação de normas favoráveis aos trabalhadores, retomando os Tribunais do Trabalho, inclusive o TST, a força impositiva de suas decisões em favor dos trabalhadores, ou recuperando normas anteriores, ou fixando novas regras diante dos complexos problemas enfrentados pelos trabalhadores face as profundas alterações nas relações de trabalho. Finalmente, passou a ocorrer maior empenho do TST e dos Tribunais Regionais nas fases de conciliação, visando o acordo entre as partes, buscando resolver o conflito pela mediação judicial. Todos estes comportamentos retomam a antiga linha condutora de afirmação do poder normativo da Justiça do Trabalho, fundamental na construção do Direito Coletivo do Trabalho em nosso país.

Estamos, agora, diante da análise das reformas, a do Judiciário, que se estende por longos anos, e da legislação do trabalho, neste momento relacionada com a questão sindical, negociações coletivas e composição dos conflitos. Quanto à primeira, está em fase final de votação no Senado. Quanto à segunda, o relatório do Fórum Nacional do Trabalho está finalizado, restando a apresentação do projeto de lei e emenda constitucional.

Na esfera da reforma do Judiciário, a matéria sobre Direito Coletivo de Trabalho e, mais especificamente sobre o poder normativo da Justiça do Trabalho, é maltratada. Veja-se o que está em votação na emenda constitucional:

“Art. 115. Compete à Justiça do Trabalho processar e julgar: II – as ações que envolvam o exercício do direito de greve, exceto o previsto no art. 37, VII; III – as ações sobre representação sindical, entre sindicatos, entre sindicatos e trabalhadores ou entre sindicatos e empregadores; … § 1.º Frustrada a negociação coletiva, as partes poderão eleger árbitros. § 2.º Recusando-se qualquer das partes à negociação ou à arbitragem, é facultado às mesmas, de comum acordo, ajuizar dissídio coletivo de natureza econômica, podendo a Justiça do Trabalho decidir o conflito, respeitadas as disposições mínimas legais de proteção ao trabalho, bem como as convencionadas anteriormente. § 3.º Em caso de greve em atividade essencial, com possibilidade de lesão do interesse público, o Ministério Público do Trabalho poderá ajuizar dissídio coletivo, competindo à Justiça do Trabalho decidir o conflito, respeitado o disposto no inciso II deste artigo”.

O lamentável texto ainda é fruto do momento em que se pretendia exterminar o poder normativo da Justiça do Trabalho. Em primeiro, porque a arbitragem ainda continua facultativa e, assim, nunca será adotada. Por segundo, porque o dissídio coletivo de trabalho somente poderá ser ajuizado de comum acordo entre empregados e empregadores. Significa, na prática, que a alteração, se consumada, o que esperamos que não aconteça, será para pior, ou seja, o sepultamento da negociação coletiva judicial e do poder normativo da Justiça do Trabalho.

Quanto à proposta contida no relatório do Fórum Nacional do Trabalho, a matéria está indicada nos seguintes termos:

“II – Solução de Conflitos: Os meios de composição de conflitos coletivos podem ser públicos ou privados, contemplando a conciliação, a mediação e a arbitragem. (1) O(s) meio(s) de solução das greves, nos conflitos de interesse, deve(m) ser a conciliação, a mediação e a arbitragem. (2) Os conflitos coletivos de natureza jurídica e eventuais questões incidentais aos conflitos serão dirimidos pela Justiça do Trabalho. (a) Nos conflitos de interesse a Justiça do Trabalho poderá atuar como árbitro público, mediante requerimento conjunto das partes e de acordo com os princípios gerais da arbitragem e de regulamentação específica. (b) Vencidas as etapas previstas para a composição dos conflitos referentes à vigência dos instrumentos normativos sem solução do conflito, esses serão submetido à Arbitragem Pública Compulsória da Justiça do Trabalho, de acordo com os princípios gerais de arbitragem e de regulamentação específica. (1) Não deve haver regra rígida e pré-determinada sobre os estágios de justificação de cada meio de composição, ficando ao arbítrio das partes a utilização dos mesmos. (2) Na hipótese de composição de conflitos por instituições privadas, estas deverão depositar, no Ministério do Trabalho e Emprego, seus atos constitutivos devidamente registrados para efeito de cadastro e acompanhamento. (3) As composições proferidas pelas instituições privadas serão depositadas no Ministério do Trabalho e Emprego. (4) As composições de instituições privadas não serão revisadas, homologadas ou examinadas pelos poderes públicos, salvo requerimento dos interessados nas hipóteses asseguradas pela constituição ou legislação”.

A proposta pretende inovar, eliminando o atual poder normativo da Justiça do Trabalho, para transformá-lo em arbitragem pública compulsória, matéria que não é definida com clareza no texto, extremamente confuso, eis que mantém o papel da Justiça do Trabalho para definir os conflitos coletivos de natureza jurídica. A proposta, se transformada em emenda constitucional e em projeto de lei, definirá quais as regras sobre arbitragem no campo do Direito do Trabalho e em como transformar o juiz do trabalho em árbitro. Matéria complexa e de difícil e longo debate no Parlamento, se a ele chegar nestes termos.

Há, assim, duas propostas diferentes e absolutamente contraditórias (1) a contida na emenda constitucional do Poder Judiciário, retrógrada e exterminadora do poder normativo (2) a contida no relatório do Fórum Nacional do Trabalho ainda não explicitada em emenda constitucional ou projeto de lei, portanto, apenas uma indicação. Quanto à primeira, deve ser rejeitada, pois é muito melhor manter o texto atual da Constituição Federal e as regras contidas na CLT sobre a matéria. Quanto à segunda, a explicitação em texto legislativo é que permitirá uma análise mais criteriosa, diante dos meandros a serem debatidos face às inúmeras inovações que apresenta no sistema de composição e solução dos conflitos coletivos.

****

2.ª REUNIÃO DA CNDRT – No dia 30 de março foi realizada a 2.ª reunião da Comissão Nacional do Direito e Relações do Trabalho do Ministério do Trabalho e Emprego, sendo apresentados o relatório final do Fórum Nacional do Trabalho sobre reforma sindical e os relatórios dos temas em debate naquela Comissão. Os relatórios que serão debatidos na Comissão são os seguintes (1) Comissões de Conciliação Prévia, elaborado por Mauricio Godinho Delgado (2) Terceirização e Cooperativas de Trabalho, da autoria de Raimundo Simão Melo (3) Fundamentos do Direito Coletivo do Trabalho, condensado por José Augusto Rodrigues Pinto e (4) Fundamentos do Direito do Trabalho, organizado por Alice Monteiro de Barros e Antonio Rodrigues Freitas Junior. Os relatórios espelham as contribuições teóricas já apresentadas pelos membros da Comissão. O encaminhamento prevê o debate de cada tema e a elaboração de um relatório-síntese para orientação do Ministério do Trabalho e Emprego face a elaboração de projetos de lei sobre a matéria em análise.

****

SEMINÁRIO NACIONAL – Seminário Nacional que debaterá a necessidade da manutenção das categorias profissionais diferenciadas e do sistema da unicidade sindical será realizado em Curitiba dias 14, 15 e 16 de abril, sob promoção da Confederação Nacional dos Trabalhadores em Transportes Terrestres e da Federação dos Trabalhadores em Transportes Rodoviários do Paraná, com o apoio e participação de todas as entidades sindicais representativas das categorias profissionais diferenciadas (informações:41.244.2523).

****

SAÚDE DOS TRABALHADORES – No jornal do Sindicato dos Empregados em Empresas de Processamento de Dados do Paraná foram publicados os relatórios do I Simpósio de Saúde do Trabalhador em Informática sobre os seguintes temas (a) A dinâmica das relações trabalho e saúde (b) Capacitação de dirigentes sindicais para implementar ações e procedimentos em saúde do trabalhador nos departamentos e secretarias de saúde (c) A saúde e segurança do trabalhador: por um trabalho decente (d) Assédio moral (e) Cinesioterapia laboral (informações: 41.254.8330)

****

LIVRO – Em mais uma obra importante paras as letras jurídicas, com edição da Editora LTr, foi lançado em Curitiba, pela Associação dos Magistrados do Trabalho da 9.ª Região, durante o Fórum Internacional de Direitos Humanos e a OIT, o livro do juiz do trabalho Leonardo Vieira Wandelli sobre “Despedida Abusiva – O Direito (do Trabalho) em busca de uma nova racionalidade”.

****

ENTREVISTA – A revista Trabalho, dirigida por Silvonei Sérgio Piovesan, edição de março, publica entrevista do juiz presidente do TRT/PR. Dr. Fernando Eizo Ono, abordando temas da atualidade jurídica e social. Diz o magistrado sobre um dos pontos por ele analisados na importante entrevista: “Não sou simpático à idéia de que é necessário flexibilizar a legislação trabalhista para criar empregos, isso porque ela não é a responsável pelo desemprego. O desemprego é conseqüência de outros fatores, especialmente a estagnação econômica. O desenvolvimento econômico é que levará à redução do desemprego. O empresário não vai contratar empregado que não precisa, independentemente de ser fácil, difícil, barato ou caro. Ninguém pode ser contra a modernização, a adaptação da legislação trabalhista aos novos tempos. Porém, isso não pode ser feito com o sacrifício da proteção mínima do trabalhador. Flexibilizar eliminando direitos trabalhistas é retrocesso”.

edesiopassos@terra.com.br

Voltar ao topo