Pedágio inteligente

A literatura conta que nas ruas de Cingapura o fluxo do trânsito é controlado através de um pedágio escalonado inteligente. Em vez de rodízios com números de placas (que inevitavelmente levam quem pode à compra de um segundo carro, frustrando o objetivo principal da medida), cada veículo cingapurano tem um chip através do qual é monitorado constantemente e paga para ter a liberdade de andar por onde quer. A conta vem no fim do mês. Passar em determinadas ruas em horário crítico pode custar até três dólares. A proprietários, a ladrões ou a desavisados.

Circula pela internet uma informação que traz, junto, uma recomendação expressa: “Repassem este e-mail, porque este tipo de informação ninguém fica sabendo”. Ninguém sabe a autoria da corrente. A fonte citada é o Diário Oficial da União e refere-se à Lei 8.675, que, segundo ali se informa, regulamenta a cobrança de pedágios em todas as rodovias brasileiras. No artigo 8.º – sempre segundo a nota – estaria estabelecido que desde o dia 7 de julho, da zero hora do dia que antecede os finais de semana e feriados prolongados até às seis horas do mesmo dia (sic) “não será cobrado pedágio em nenhuma rodovia, tendo acesso livre todos os usuários, carros de passeio e caminhões”. A medida, atribuída a uma iniciativa do ministro dos Transportes, teria o objetivo de “diminuir a grande quantidade de veículos que saem dosprincipais centros urbanos congestionando as rodovias.” Se utilizado o horário da zero hora às seis da manhã “o tráfego nas estradas terá uma redução de40%.”

A informação, como se vê, é confusa. E o número da lei citada nada tem a ver com a matéria invocada. Na própria internet pode-se pesquisar: a Lei 8.675 é de 7/7/1993 e, longe do pedágio, dispõe sobre a transferência temporária e simbólica da sede do governo federal para a cidade de Salvador, na Bahia.

Feita a necessária ressalva, há que se admitir que o movimento para isenções e cobrança diferenciada de pedágio existe e é sério. Somente na Câmara Federal circulam quase setenta propostas e projetos de lei, dispondo sobre a cobrança, redução e isenção de pedágios nas rodovias brasileiras. Uma delas, por exemplo, simplesmente proíbe a cobrança de qualquer tipo de pedágio em estradas com pista única Ä uma vergonha nacional tupiniquim a que o Paraná está também exposto.

À medida que cresce a consciência popular, recua o governo em suas equivocadas ações que visam cobrir sua própria e crônica irresponsabilidade no setor rodoviário. Outro dia, o governo de São Paulo se viu obrigado, depois de muita pressão popular, a realizar acordo com uma das concessionárias para a redução em até 50% no valor do pedágio cobrado sobre a Rodovia Castelo Branco. O desconto, já anunciado, não deixou os moradores satisfeitos. Quem passa por ali todos os dias sabe quanto pesa no bolso a abusiva cobrança.

Por ser tempo de campanha eleitoral, é natural que os debates sobre a matéria ganhem dimensão maior. Tem candidato prometendo o que dificilmente vai cumprir depois, como, aliás, ocorreu no Paraná nas últimas eleições para governador. Mas também é natural que esse tema seja aprofundado, incluindo a participação da Justiça, que, em julgados recentes, vem fixando o entendimento de que caminho único é caminho que necessariamente deve estar livre desses gravames que geralmente aproveitam à iniciativa privada sem resposta adequada à satisfação dos interesses públicos. Não que o exemplo de Cingapura seja o melhor, mas do amplo debate pode nascer um pedágio mais inteligente, que se distancie dessa sanha arrecadatória em que nos metemos.

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