Um índio nas areias do litoral paranaense

Foto: Mara CornelsenSerá que alguém imagina que um índio que é craque em samba e adora atender crianças carentes mora no litoral? Pois mora. É a história que Tribuna conta na edição de hoje, dando continuidade à série de reportagens a respeito da gente das nossas praias. Já apresentamos o Mestre Eugênio, da Ilha de Valadares; o ?Jacaré?, de Santa Terezinha; o ?Seu Zé?, que aprendeu tocar violão com Pixinguinha. Hoje é a vez do ?Índio?, cuja toca fica em Praia de Leste.

Ele ainda é presidente do Grêmio Recreativo Vai na Rolha Quem Quer, o bloco carnavalesco que representa a Vila das Torres nos carnavais de Curitiba. Mas agora está à beira-mar. Desiludido com a violência, com o tráfico de drogas e com o envolvimento na criminalidade de garotos que viu crescer, Luiz Serafim Alves, 60 anos, o ?Índio?, como é mais conhecido, transferiu sua toca para a Praia de Leste, onde está morando há dois anos. Montou um pequeno bar – na verdade a imitação de um oca, coberta com palha e cheia de prateleiras rústicas – onde vende cachaça, cerveja e caldo de mocotó, entre outros petiscos. Dali tira o sustento e ainda luta para criar o novo Grêmio Recreativo Toca do Índio, em um barracão alugado pelo amigo Noel, à margem da rodovia que liga Praia de Leste à BR-277.

Foto: Mara Cornelsen?Índio? tem este apelido porque nasceu na Aldeia dos Iguapes, na Paraíba, filho de uma índia da tribo Mamanguape. Aos 11 anos saiu de casa para acompanhar parques e circos. Foi parar em São Paulo. Aos 18 anos resolveu conhecer Curitiba. Chegou, gostou e se instalou na Vila das Torres. Mesmo sendo praticamente analfabeto, começou a trabalhar como assistente social. Criou o bloco Vai na Rolha Quem Quer, que depois virou grêmio. Ensinou batuque para as crianças, ajudou a construir creches, ajudou a escrever um livro, servia de acompanhante para quem ficava doente, comprava remédios do bolso para auxiliar aos mais necessitados. Fez amizade com todo mundo e viu a criançada crescer.

?Muita gente virou gente boa. Outros infelizmente preferiram seguir o mau caminho?, comenta.

Durante as campanhas políticas sempre era procurado para ajudar a eleger um ou outro. Prometiam um monte de coisas e depois, nada! Ao falar das promessas não cumpridas ?Índio? chora. Ele gostaria de retornar à Vila, prosseguir com seu trabalho junto às crianças, mas queria ter um emprego fixo, com carteira assinada, para garantir o sustento na velhice. Como nunca teve, decidiu tentar a sorte no litoral e começar tudo de novo.

Com alguns instrumentos e muita dedicação, ?Índio? está iniciando outro projeto. Reúne crianças carentes da periferia das praias e as convida para aprender a fazer batucadas no barracão. ?Pelo menos ali elas ficam fora da rua. Têm contato com a música e não têm tempo para pensar em bobagens?, diz. No local também instalou um karaokê, na esperança de ensinar a turma a cantar. Já tem pelo menos uma dúzia de garotos interessados, com idades a partir dos 7 anos. Os pais também podem participar dos ensaios e a idéia é colocar o bloco na rua, já neste Carnaval. ?Vamos encher um ônibus com crianças, levar os instrumentos e todo mundo vai desfilar no calçadão da Praia de Leste. Será o primeiro bloco carnavalesco desta praia?, garante. Depois de passadas as festas de Momo, ele quer continuar incentivando as crianças a tocar e também a jogar futebol, um esporte que sociabiliza e dá disciplina. Dentro de suas limitações, ?Índio? faz o que pode para ajudar crianças, sua grande paixão. Prova disso é que tem 12 filhos. A filha mais velha já está com 40 anos.

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