Requião pedirá prisão do presidente do Sinapro

O governador Roberto Requião garantiu ontem que iria pedir a prisão do presidente do Sindicato Nacional de Produtores Rurais (Sinapro), Narciso Rocha Clara. A entidade estaria programando para hoje uma carreata de protesto em Curitiba contra o governador, e as crescentes invasões de terra no Paraná.

Segundo Requião, o sindicalista responde a diversas ações criminais na Justiça de São Paulo, e não iria permitir a entrada dele no Estado. Mesmo com a ameaça do governador, Narciso Clara confirmou a carreata, mas não a sua presença na capital paranaense. Ele rebateu as acusações alegando que “fora-da-lei é ele (Requião), que não cumpre ordem judicial e compactua com a criminalidade do MST”.

Em entrevista ao O Estado, Clara confirmou que a entidade está contratando um serviço de segurança patrimonial para monitorar e inibir as invasões de terras no Brasil. O sistema ? que ele não quis adiantar quanto custará ? será rateado entre os ruralistas associados ao Sinapro ? 160 mil no Brasil e 22 mil no Paraná. O serviço vai contar com equipamentos de alta tecnologia, contando com ronda terrestre e aérea, além de sistemas com câmeras digitais. Clara disse que inicialmente esse serviço será disponibilizado para nove estados.

No Paraná, os trabalhos de segurança monitorada vão começar pela região do Vale do Ivaí, onde o Sinapro acredita que o movimento dos sem terra irá concentrar as invasões. Narciso Clara disse que existem hoje no País 338 propriedades invadidas em 22 estados. Todas possuem ordem judicial para a reintegração, mas nenhuma foi cumprida. No Paraná, segundo o Sinapro, são 69 invasões com dezessete reintegrações. “Se eles estão radicalizando pela esquerda, nós vamos radicalizar pela direita”, disse

O presidente criticou severamente o governador do Paraná, dizendo que ele é “o militante número dois do MST”. “O primeiro é o presidente Lula”, disse. Segundo Clara o Paraná ocupa hoje a segunda posição no Brasil em termos de áreas invadidas ? perdendo para Pernambuco ?, e isso seria “culpa do governador”, que estaria apoiando o movimento. O Sinapro foi a entidade que pediu a intervenção federal no Paraná, aceita na semana passada pelo Tribunal de Justiça (TJ).

Estelionato

O Departamento Jurídico do próprio Sinapro confirmou que há contra o presidente da entidade um inquérito criminal por estelionato no Rio Grande do Sul. O Ministério Público Federal reabriu esse inquérito, que investigava cobrança de contribuição considerada lesiva por agricultores gaúchos. A Federação da Agricultura do Estado do Paraná (Faep) informou que a classe produtora rural não reconhece o Sinapro como seu representante. Segundo a Faep, o sindicato presidido por Clara distribuiu no Paraná 22 mil boletos de contribuição, com valores de até R$ 1.500,00.

O governador Roberto Requião também não poupou críticas ao presidente do Sinapro. “É um marginal paulista que não entrará no Paraná”, garantiu.

Secretário aguarda ordem judicial

No final da tarde de ontem, o secretário de Segurança Pública, Luiz Fernando Delazari, declarou que Narciso Rocha Clara, que se intitula presidente do Sinapro, pode ser preso se vier ao Paraná hoje para participar da manifestação anunciada. Delazari apresentou à imprensa documentos e ofícios policiais e judiciais, comprovando que o Sinapro é uma entidade ilegal e que Narciso Clara responde a diversos inquéritos policiais, inclusive com algumas condenações -a maioria por estelionato.

Ainda ontem estes documentos seriam enviados para o delegado titular do Cope (Centro de Operações Policiais Especiais), Luiz Carlos de Oliveira, que seria responsável por tomar as medidas policiais cabíveis – pedir a prisão preventiva de Clara e providenciar policiamento especial no Aeroporto Afonso Pena, de onde partirá o manifesto do Sinapro, e no trajeto até o Palácio Iguaçu, para cumprir a ordem judicial de prisão do acusado.

Preso

O secretário Delazari disse “não ter dúvidas” de que a Justiça paranaense expediria a ordem de prisão de Narciso Clara de ontem para hoje. “Esse cidadão está incorrendo em uma série de sanções penais”, comentou Delazari. Uma delas é a ordem emitida pela Justiça de São Paulo, impedindo o presidente do Sinapro de se afastar da comarca de Carapicuíba, no interior paulista. Nesta cidade, Clara foi preso em flagrante no dia 3 de junho passado, dentro do Fórum, fazendo-se passar por advogado de um traficante. Ficou detido até o dia 9 de junho e está em liberdade provisória, respondendo pelo crime.

De acordo com Luiz Fernando Delazari, “o Paraná vive um momento delicado por causa do conflito entre o MST e os ruralistas”, e o governo do Estado não vai “admitir conturbação da ordem social”. “É inaceitável que um cidadão com uma ficha criminal extensa venha promover baderna aqui”, concluiu. (Bia Moraes)

Comissão de mediação tenta apaziguar os ânimos

O trabalho da comissão de mediação formada pelos governos estadual e federal, que foi ontem para Quedas do Iguaçu, negociar a situação das famílias do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) que ocupam a Fazenda Araupel desde sábado, não deve ser fácil. Além do próprio deslocamento até o local, atrapalhado pela chuva, os dois lados envolvidos na questões demostram posições antagônicas à proposta que a comissão pretende fazer. Ontem apenas a ouvidora nacional agrária, Maria de Oliveira, se deslocou de carro até o município. Hoje, o procurador-geral do Estado, Sérgio Botto de Lacerda e o diretor-geral da Secretaria de Segurança pública, Marco Antônio Berberi, também seguem para Quedas do Iguaçu.

Na reunião de terça-feira, em Curitiba, ficou definido que a comissão iria propor aos sem-terra que se deslocassem para outra área, no acampamento conhecido como da bacia, onde integrantes do movimento estão acampados desde 1999. Por sua vez, a comissão também pretende avaliar a propriedade e tentar comprar parte dela para assentar os sem-terra.

O gerente administrativo da Araupel, Edson Araújo, afirmou que a empresa não tem o menor interesse em se desfazer de suas terras. Ele destacou que a produção de manufaturados para exportação, uma das atividades da empresa, depende do espaço físico e que se esse espaço diminuísse, a produção também cairia. “Nós já cumprimos a nossa parte social, em 97 vendemos 28 mil hectares de terras onde estão os assentamentos Ireno Alves e Rio Bonito do Iguaçu”, lembrou, destacando que esta semana empresa foi premiada pela Federação da Indústria do Estado do Paraná (Fiep) como a 17.ª maior exportadora do Estado.

“Não saio”

Os sem-terra também mantém uma posição irreversível. “Não vamos sair daqui para a área da bacia. O governo tem é que comprar as terras e fazer aqui um assentamento modelo”, revelou Adélson Schwalemberg, coordenador do MST. Ele disse que a situação no acampamento é tranqüila e que os trabalhadores já dão quase como certa a vitória. “Temos 1.500 famílias aqui e mais mil estão chegando”, revelou, destacando que o movimento está investigando o cultivo de soja transgênica na Fazenda Araupel. “Se isso for verdade será mais um motivo para que as terras sejam destinadas para a reforma agrária”, disse.

Morte

Joel de Lima Vaz, 39 anos, que estava acampado na Fazenda Araupel foi morto na madrugada de ontem com um tiro no pescoço e golpes de facão. Os irmãos Antônio, Sebastião e João Maria de Almeida foram detidos. “O Sebastião foi liberado. Já os outros dois confessaram autoria do crime”, revelou o delegado de Quedas do Iguaçu, Daniel Freitas. A suspeita é que o crime foi motivado por uma disputa por um Fusca. “Pode ser algo plantado para atrapalhar o movimento. Estamos investigando isso, já que os envolvidos foram empregados de fazendeiros da região”, afirmou Schwalemberg. (Lawrence Manoel)

Para governador, só emprego diminui tensão

O governador Roberto Requião concedeu uma entrevista à Rádio CBN, ontem, e falou sobre as medidas para geração de emprego e para a solução do problema da terra no Paraná. “Não adianta travar um combate contra os sem-terra. A causa do problema, do desespero do desemprego, tem que ser atingida. Temos que acenar com a esperança do emprego e, em uma soma de fatores, estamos gerando seiscentos empregos por dia. A cada dois dias, criamos a quantidade de empregos equivalente a uma montadora de automóvel”, declarou Requião.

Entre as medidas de geração de emprego citadas pelo governador estão as tributárias, como a isenção e redução de ICMS das micro e pequenas empresas e os quatro anos de diferimento de ICMS para as empresas que se instalarem nas regiões mais pobres do Estado. Além disso, Requião ressaltou que a economia também foi estimulada por uma safra recorde. “Estamos, com isso, de uma forma rápida, gerando empregos”, disse, lembrando que o Paraná tem 2,2 milhões de paranaenses vivendo na miséria.

Com relação ao Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra, Requião acredita que é mais um movimento “contra a caristia, de gente procurando emprego, ávida pela sobrevivência do que realmente um movimento pela reforma agrária, embora tenha muito agricultor também”.

Requião enfatizou que, durante o seu governo, ocorreram 25 invasões e foram feitas sete reintegrações de forma pacífica. A próxima, segundo o governador, deve acontecer na próxima segunda-feira, em Campina da Lagoa, região Centro-Oeste do Estado. Para evitar confrontos, o governo está anunciando desde já que a Polícia Militar vai fazer a reintegração, durante o dia, e convocando a imprensa, pedindo a presença do Ministério Público e para o desembargador Oto Sponholz determinar a ida de um observador da Justiça. “Vamos fazer a reintegração de uma forma limpa e clara”, garantiu o governador.

Mediação

Além disso, o problema da terra no Paraná está sendo discutido pelo governo do Estado em parceria com várias lideranças rurais. “Estou discutindo essa situação com o Ágide Meneguetti, da Faep (Federação da Agricultura do Estado do Paraná), com o Edson Neme Ruiz, da Sociedade Rural de Londrina, com o João Paulo Koslovski, da Ocepar (Organização das Cooperativas do Estado do Paraná), com lideranças civis, das instituições patronais vinculadas à terra e com proprietários de terra”, explicou. “Todos sabem que há um problema social pela frente e sabemos também que esse problema social não pode ser resolvido com a invasão de propriedades, mas com equilíbrio.”

Requião ressaltou que o Paraná tem cerca de 80 mil pessoas acampadas e que não admite utilizar a violência para resolver a questão.

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