Duplo fruto

Reprodução assistida aumenta o número de gêmeos no Brasil

Há cerca de 20 anos não era tão comum ver o nascimento de gêmeos no Brasil. Até porque um dos motivos que leva ao crescimento deste tipo de gravidez é a reprodução assistida, algo recente por aqui. Para se ter uma ideia, há quatro anos faziam-se cerca de 13 mil procedimentos de reprodução assistida no País (entre elas a inseminação artificial e a fertilização in vitro, as mais comuns), hoje já são 20 mil casos, um crescimento de 53,84%. Outro indicador desse aumento é que em 2006 eram 56 centros de reprodução no Brasil, hoje são mais de 100, segundo dados da Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia (Febrasgo).

Os médicos especialistas em reprodução assistida apontam vários fatores para o aumento de gêmeos nas famílias nos últimos anos. Não se sabe, ao certo, quantos nasciam há 20 anos e quantos nascem hoje, mas a certeza é que as ocorrências são mais numerosas na atualidade. E o principal motivo é a própria reprodução assistida, que na sua maioria trabalha com indução da ovulação. No método da fertilização in vitro, o médico acaba transferindo mais de um embrião para que a possibilidade da gravidez aumente. É por isso que a possibilidade de uma gestação gemelar é bem maior nesses casos. Segundo dados da Febrasgo, estima-se que de 20 a 25% das fertilizações in vitro e das inseminações artificiais resultem em gêmeos, quando naturalmente essas gestações variam de 1% a 2%.

Há também fatores naturais que podem desencadear em gravidez gemelar. Segundo o médico do Centro de Fertilidade de Curitiba, Karam Saab, as chances das mulheres na faixa etária dos 35 aos 40 anos de idade terem filhos gêmeos é três vezes maior do que as outras. E é justamente nessa idade que ocorre a maior procura por tratamentos assistidos. “Nessa idade as mulheres produzem um número maior de óvulos no mesmo mês”, explica o médico. Em seu consultório, 15% das tentativas de fertilização in vitro resultam em gestação gemelar, sendo que, segundo ele, quando se coloca um embrião as chances de gravidez são de 20%; com três embriões aumentam para até 50%.

A infertilidade tem crescido nos últimos anos, segundo Saab, e por isso a grande procura por tratamentos assistidos. Entre os fatores que levam à infertilidade (tanto em homens como em mulheres) estão a sexualidade precoce (o que pode resultar também em doenças precoces e gravidez precoce, que pode levar a abortos); a postergação da maternidade; estresse e alimentação inadequada.

Aparência igual, personalidade distinta

Uma situação gemelar curiosa é a da paulistana Jemima Pompeu e de sua irmã Késia, que têm 41 anos. Jemima vive em São Paulo e Késia está nos Estados Unidos desde os 15 anos de idade. Desta forma, as duas se comunicam apenas por telefone ou pela internet. Elas são gêmeas bivitelinas (diferentes). Por conta dessa situação atípica, Jemima resolveu criar um blog, o Vizinhos do Útero (http://vizinhosdeutero .blogstop.com), no qual há várias histórias sobre o tema.

“Até agora, no meu blog, não consegui detectar nenhuma história parecida com a minha. Quando ela foi embora eu senti uma lacuna muito grande, mas com o passar do tempo, mais madura, entendi e resolvi criar o site”, conta Jemima. Para ela, é errônea a interpretação das pessoas em relação aos gêmeos. “Ocorre muita comparação e os comentários são sobre a questão da individualidade. A maioria das pessoas confunde, acha que por haver a aparência física igual a personalidade também é igual. E não é assim.

No nosso caso, somos semelhantes só na aparência e na voz, mas as virtudes e defeitos são diferentes”, comenta. A única coisa que J,emima sente que a liga mais à irmã são os pressentimentos que ela tem. “Algumas vezes pressinto ou sonho algo que vai ocorrer com ela”, revela. A vida gemelar de “desencontros”, como Jemima define sua relação com a irmã, é bastante superficial, pois as conversas são raras. Para a blogueira (que não tem filhos), hoje há muitas diferenças em relação ao entendimento que as pessoas têm sobre gêmeos.

Ainda mais que na família dela não há casos (ao todo eles são em quatro irmãos). “Para você ter uma ideia, na época a minha mãe só soube da gravidez gemelar no parto,
pois não fez pré-natal”, conta. Ela diz, ainda, que a sua infância foi marcada por muita brincadeira no quintal, enquanto que hoje as crianças já nascem com “a mão no mouse do computador”. (MA)

Gêmeas idênticas nasceram de forma natural

Divulgação
Sulamita se surpreendeu com a gravidez de Fabiolla e Francinne.

A jornalista Sulamita Mendes teve gêmeas (idênticas) há 22 anos (Fabiolla e Francinne). No seu caso, a gravidez foi natural e causou surpresa na época. “Tínhamos até um pouco de tabu em falar nisso”, conta ela. Depois de várias gerações na família com muitos filhos (a avó teve 12 filhos e faleceu no parto de gêmeos; e depois as outras gerações tiveram no máximo cinco filhos, e a Sulamita teve apenas três: além das gêmeas, tem mais um menino), veio a gravidez gemelar. E natural, pois na família de seu ex-marido já havia casos.

“Foi um espanto na época. Primeiro meu, pois eu trabalhava bastante, não tinha tempo para nada. Depois veio a pergunta: como vou criar duas crianças?”, lembra. Com a situação financeira estabilizada, Sulamita conseguiu criar as gêmeas (idênticas) com a ajuda de uma enfermeira nos primeiros meses. Segundo ela, as duas menininhas até transformaram o casamento, que não ia muito bem, em momentos prazerosos e fraternos.

Porém, apesar das boas condições, nem tudo eram flores. Afinal, há 20 anos as fraldas descartáveis eram artigos de luxo, não havia tanta oferta de comida pronta como há hoje (tanto para crianças como para adultos), não tinham as famosas escolhinhas nem tantas opções de lazer para bebês. “Na ecografia eu cheguei a me revoltar com o médico, eu disse que ele era um incompetente”, relembra. Porém, apesar das dificuldades, hoje os filhos são a razão de viver da jornalista. “São bênçãos, Deus me ensinou o que é o amor fraterno pelos meus filhos. Hoje eles cuidam de mim”, emociona-se.

Já a professora Edimara Klaine Stella, de 30 anos, fez fertilização in vitro para ter filhos.

Engravidou de gêmeos (Heitor e Isabela, que têm um ano e dez meses hoje) e, para cuidar deles, vive uma realidade diferente daquela da Sulamita. Embora não seja nada fácil cuidar de dois bebês (ainda mais quando não se tem babá) ela conta que as facilidades dos dias de hoje ajudam muito. “Eu não me imagino trocando fraldas de pano”, brinca ela. A fase da amamentação foi a mais difícil, pois cuidar dos dois na mesma hora foi complicado. “Hoje eu sinto orgulho, paixão e realização”, diz ela, que lembra de outras facilidades atuais, como o atendimento médico, os hospitais equipados (não fossem eles talvez as crianças não tivessem saúde), o micro-ondas e até a máquina de lavar. (MA)

Gravidez gemelar apresenta o dobro do risco da normal

O grande dilema dos médicos hoje é diminuir a quantidade de gestações gemelares nos métodos de reprodução assistida. Isso porque, segundo eles, esse tipo de gravidez apresenta o dobro de riscos, principalmente depois dos 30 anos de idade. A gestação de trigêmeos ou mais apresentam riscos ainda maiores. O médico do Centro de Fertilidade de Curitiba, Karam Saab, considera que 15% (a taxa de nascimento de gêmeos por meio das técnicas artificiais que ele verifica em seu consultório) é um,a taxa muito alta.

Compartilha da mesma opinião o médico e presidente da Comissão de Reprodução Humana da Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia (Febrasgo), José Gonçalves Franco Júnior. Ele informa que chega a 60% a quantidade de casais que emitem o desejo de ter gêmeos. Segundo Franco, os estudos já realizados no Brasil apontam
que é possível obter bons resultados com a transferência de no máximo dois embriões na reprodução assistida. “Mas ainda há muita resistência dos médicos para fazer isso.

Requer mudança de opinião. Se o serviço for bom não é difícil de conseguir uma gravidez desta forma”, afirma. Franco Júnior afirma, ainda, que no Brasil não há uma política restritiva de transferência de embriões. Para o médico Saab, há que se desestimular a prática e estudar ainda mais para se conseguir, com apenas um embrião, chances de 50% de gravidez. “Muitas mulheres dizem que desejam ter gêmeos, mas nós desencorajamos. A gravidez gemelar tem um risco maior, pode deixar sequelas. O ideal é tentar
no máximo dois embriões”, opina Saab. (MA)

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