Prostituição de jovens migra para parte da RMC

A prostituição acabou sendo a solução – por necessidade, por convencimento ou por falta de estrutura familiar – para muitas crianças e adolescentes que precisam conseguir dinheiro para o sustento. Em Curitiba, a situação é muito delicada, mas está sendo combatida por uma força-tarefa formada pela polícia e por entidades de defesa da infância e juventude. Como se está fechando o cerco, muitas meninas e meninos estão passando a atuar na Região Metropolitana de Curitiba, principalmente nas cidades mais próximas.

Segundo a procuradora Margaret Matos de Carvalho, quando a atividade é reprimida, há duas maneiras de tentar escapar: deixá-la um pouco de lado ou migrar para outros locais. A segunda opção está sendo escolhida pelas prostitutas infantis ou seus “agentes”. “O grupo de fiscalização se restringe apenas a Curitiba. Deveria haver uma equipe com mais elasticidade para conseguir melhores resultados”, afirma.

Outra hipótese para a migração é a origem das crianças: talvez elas sejam de cidades da Região Metropolitana e vão para Curitiba todos os dias. “A prostituição envolve um intercâmbio muito grande e a rotatividade é intensa. Aqui também trabalham meninas do interior do Estado. Essa é uma estratégia para oferecer novos atrativos”, explica Margaret. A procuradora cogita ainda que a desestruturação que pode haver nas cidades da Grande Curitiba, com baixos índices de desenvolvimento, possa estar incentivando a prática.

A falta de estrutura familiar e a necessidade de ajudar no sustento da casa estão entre os principais motivos para o ingresso de crianças e adolescentes na prostituição. Inclusive com a anuência dos pais, em muitos casos. “O problema é sempre familiar. Por isso, trabalhar a reestruturação da família é o mais importante, apesar de ser o mais difícil, para conseguir tirar as crianças da prostituição”, comenta a procuradora.

Os casos mais graves começam por volta dos oito anos de idade, mas a grande parcela está concentrada entre 14 e 16 anos, informa o delegado Silvan Rodney Pereira, que participou de uma CPI da prostituição infanto-juvenil na Assembléia Legislativa, em 1995. Meninos representam quase 50% de todo o universo. “A prostituição é um caminho que não se descobre sozinho. É levado por alguém, podendo também ser um menor iniciado. Quando uma criança entra no circuito, cria-se um produto de alto valor no mercado. Quanto maior o crime, maior o preço”, conta. Para ele, alguns pais não sabem da atividade dos filhos. Outros, no entanto, incentivam a prostituição, que passa a ser um problema secundário, por somente estarem interessados no ganho que se pode ter. As prostitutas atuam nas ruas, por agenciamento ou ainda em prostíbulos. Esses estabelecimentos fazem a exploração usando documentos falsos, para não serem pegos.

Recaídas são freqüentes

Pereira diz que a maioria das pessoas que entraram nessa vida ainda cedo conseguem sair da “profissão”. Esse processo, porém, envolve muitas recaídas. Isso acontece porque normalmente um emprego “normal” fica em desvantagem financeira em relação aos programas.

Como exemplo, ele cita a situação de uma menina que sai da prostituição e vai trabalhar em uma loja. Ela será assediada porque exala sensualidade, requisito para o trabalho anterior. Além disso, ganha um salário bem mais baixo do que quando se prostituía. Se ela consegue R$ 260 por mês na loja, trabalhando oito horas por dia, pode ganhar muito mais se fizer programas apenas uma vez por semana.

“Acaba abandonando o emprego e vai de novo para a prostituição, pelo menos por mais uma temporada. Ou faz bico, trabalhando de dia e retomando a antiga atividade à noite, para um dinheiro extra. A pessoa está propensa a levar uma vida com dignidade, mas não consegue recursos para isto”, complementa o delegado. Hoje, os fatores que mais podem ajudar na saída da prostituição são o próprio sofrimento do trabalho e a conversão religiosa.

Ocorrências diminuíram no Centro

Segundo dados do delegado Silvan Rodney Pereira, várias ocorrências foram registradas na área central de Curitiba nos últimos dois anos, envolvendo crianças e adolescentes. Algumas delas: assédio sexual, ato obsceno, estupro, corrupção de menores, atentado violento ao pudor e favorecimento à prostituição, entre outras. Em 2004, até o momento, não foi registrado nenhum caso.

Ele acredita que o fato de nenhuma ocorrência ter sido detectada este ano está relacionado ao exemplo de conduta que acompanha o combate à prostituição, o que não acontece em outros crimes. “Enxergo a prostituição como campo fértil para o surgimento de outros crimes. Se existe o combate, há a interferência no tráfico de drogas, indiretamente no consumo de bebidas alcoólicas, e até mesmo em crimes como furtos e roubos. A prostituição está intimamente ligada às drogas. A primeira coisa que fazem (os cafetões e cafetinas) é drogar as meninas, que ficam alienadas, e ainda ganham dinheiro no repasse”, aponta Pereira.

O delegado expõe que a polícia não faz um combate sistemático por avaliar que existem outras prioridades. Então, acaba sendo acionada quando ocorre algum crime de muita repercussão envolvendo esse tipo de conduta, ou quando algum organismo nacional ou internacional levanta a questão e mostra a sua gravidade. “Há toda uma mobilização das autoridades, que promovem um combate que acaba sendo modista”, afirma.

Como em todos os crimes, a adoção de políticas econômicas e sociais é a solução para eliminar a prostituição infantil, segundo Pereira. Para ele, existe uma tolerância mal interpretada pelas autoridades. O dinheiro que paga a prostituição vem de outros crimes, como roubos e desvio de verbas. “Quem trabalha não gasta nisso. Ninguém gasta um dinheiro suado nesses locais. A prostituição está muito próxima da alta sociedade. Por causa da tolerância, muitas autoridades e pessoas que defendem a atividade freqüentam os prostíbulos. Ela gera a predominância na relação.”

Punição

Os clientes que pegam prostitutas infanto-juvenis podem ser indiciados por sedução de menores, independentemente da situação delas. O artigo 217 do Código Penal diz que é crime seduzir mulher menor de 18 anos e maior de 14, e ter com ela conjunção carnal, aproveitando-se de sua inexperiência ou justificável confiança. A pena é de reclusão de até 4 anos.

No caso das pessoas que ajudam a prostituir crianças, o crime é de corrupção de menores, segundo o artigo 218. Ele informa que corromper ou facilitar a corrupção de pessoas maiores de 14 anos e menores de 18, com ela praticando atos libidinosos ou induzindo a praticá-lo ou presenciá-lo, a pena varia entre 1 e 4 anos de reclusão.

Juventude é chamariz para a violência sexual

A pouca idade de algumas mulheres talvez seja o chamariz para outro crime: a violência sexual. O indicativo veio através de uma pesquisa do serviço de atendimento às vítimas de violência sexual, do departamento de Tocoginecologia do Hospital de Clínicas (HC), em Curitiba. A maioria das mulheres que procurou por socorro no local tinha menos de 19 anos, e muitas delas ainda eram virgens. O hospital faz 16 intervenções desse tipo por mês, totalizando 50 em toda a cidade.

O coordenador do serviço, professor Rosires de Andrade, conta que na maior parte dos atendimentos foi preciso utilizar anticoncepcionais de emergência para evitar a gravidez indesejada, e medicamentos para a prevenção de doenças sexualmente transmissíveis (DST).

A violência sexual vem acompanhada de um estresse após o trauma: “As mulheres precisam ficar mais alertas do que normalmente. Não existe um perfil de homem que pratique a violência ou da mulher atingida. Não se sabe o que passa na cabeça do agressor, pois não são as mais bonitas, as mais feias, as que somente usavam saia ou qualquer outro parâmetro. Tem que tomar cuidado 24 horas por dia”, orienta.

O serviço do HC, pioneiro no Paraná, funciona desde 1997. Surgiu pela necessidade de se ter um local onde o atendimento fosse rápido e que não causasse mais trauma ainda. As mulheres que vão até o HC são recebidas por uma equipe treinada, que disponibiliza um kit de medicamentos para uma ação imediata de prevenção.

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