Primeira imunização

PR assina nesta quarta acordo com Rússia por vacina de covid-19 questionada por cientistas

Foto: Aniele Nascimento / Gazeta do Povo / Arquivo

Um dia após a Rússia anunciar a primeira vacina de covid-19 do mundo, o governo do Paraná vai assinar um termo de cooperação para que a imunização seja produzida no estado. Quarta-feira (12), o governador Ratinho Jr vai se reunir por videoconferência com o embaixador russo no Brasil, Sergei Akopov, para definir os termos do acordo.

A parceria deve permitir que o Instituto de Tecnologia do Paraná (Tecpar) faça testes, produza e distribua a vacina Sputnik V, anunciada nesta terça-feira (11) pelo presidente russo Vladimir Putin sob forte suspeita da comunidade científica internacional. Pelo acordo, a imunização passará pela fase 3 de teste no Paraná, justamente a etapa que não foi feita na Rússia. Se aprovada aqui no estado, o protocolo será compartilhado com a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) para aprovação e liberação para vacinação da população.

Em apenas dois meses, os estudos em Moscou não concluíram todas as etapas de testes e divulgação de resultados que comprovem a eficácia e segurança da imunização. Mesmo assim, a vacina será produzida pelo Ministério da Saúde da Rússia em setembro e aplicada na população daquele país já em outubro.

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No fim de julho, o chefe da Casa Civil do governo Ratinho Jr, Guto Silva, se reuniu em Brasília com o embaixador russo para encaminhar o acordo. O governo estadual colocou à disposição a estrutura do Tecpar para a produção da vacina.

Chefe da Casa Civil do governo do Paraná, Guto Silva, com o embaixador russo, Sergey Akopov, na reunião de julho acordo de produção de vacina da covid-19. Foto: AENPr

“Após esse ajuste com o governo da Rússia, as tratativas tecnológiccas e científicas começam. É importante nos pautarmos pela ciência, segurança e transparência nesse processo”, afirmou o diretor-presidente do Tecpar, Jorge Callado, em entrevista ao canal Globo News.

Questionado sobre o fato de o governo do Paraná estar buscando uma vacina que não passou por todas os testes, Callado afirma que o objetivo do acordo é justamente buscar esclarecer dúvidas. “É um começo em que buscamos intercâmbio de informações. E só avançaremos se tivermos informações.Como instituto tecnológico, temos que estar abertos a novas tecnologias. Prudência e segurança são palavras-chave nesse processo”, reforça Callado, afirmando que a vacina russa só será aplicada se a Anvisa aprová-la.

A segurança da vacina Sputnik V para a covid-19 e a veracidade de seus dados foram colocadas em xeque após a Rússia dizer que pretende vacinar a população já em outubro. Ao anunciar a vacina nesta terça, o presidente Putin informou que sua própria filha já teria sido imunizada com a descoberta.

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A produção da vacina a partir de setembro, antes da conclusão de todos os testes e da divulgação dos resultados que comprovem eficácia e segurança, gerou críticas de especialistas, além de desconfiança.

Outras vacinas

A Rússia não é o único país a prometer uma vacina ainda este ano. Na China, o Exército aprovou o uso limitado da vacina da CanSino em seus militares pelo período de um ano. Os EUA fecharam acordo para compra de 100 milhões de doses da vacina da Pfizer que está sendo desenvolvida com a BioNTech até o final de 2020.
A Rússia, porém, foi a primeira a anunciar a vacinação em massa nos próximos meses. A imunização ainda está em fase 2 de ensaios clínicos. Ao todo, há 27 vacinas em fase de testes em humanos, das quais seis estão em fase 3 (a última antes da aprovação), e 139 em estudos pré-clínicos (em animais), segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS).

Para a bióloga Natália Pasternak, pesquisadora do ICB-USP e presidente do Instituto Questão de Ciência, a falta de transparência da pesquisa russa é malvista e não representa boa prática científica. “Todas as vacinas sérias feitas por empresas e universidades de renome estão comprometidas com a transparência. Isso não foi feito com a vacina da Rússia, que para nós, cientistas, não existe. Não sabemos nada sobre ela, qual é a tecnologia empregada, os resultados da fase pré-clínica. Não foi feita uma publicação”, diz.

Luciana Leite, diretora do Laboratório de Desenvolvimento de Vacinas do Instituto Butantan, diz que até é possível que a Rússia tenha vacina em curto prazo, mas tudo depende de quão restritivos ou permissivos são os órgãos regulatórios do país. Para Luciana, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), que regulamenta todos os medicamentos e vacinas produzidos ou importados no Brasil, é minuciosa para permitir a produção de vacinas, até para fármacos produzidos fora do país.
Além disso, a produção acelerada enfrenta uma barreira no órgão sanitário. “No Brasil podemos ficar tranquilos porque a Anvisa, e quem trabalha na área de produção de vacinas sabe, é muito rigorosa.”


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