Obras paralisadas representam dinheiro público jogado no lixo

É muito difícil calcular a quantidade de dinheiro público desperdiçado no Estado com obras paralisadas. Não existe no País qualquer mecanismo que concentre esses dados para dar uma dimensão do tamanho do problema.

Apenas sabe-se que ele existe. Em Matinhos, por exemplo, foram gastos cerca de R$ 1 milhão – valores atualizados em 2001 – para construir um ginásio de esportes que foi utilizado apenas uma vez. A obra está abandonada, sendo destruída pela ação do tempo.

Segundo o Instituto Brasileiro de Auditoria de Obras Públicas (Ibraop), criado em 2002, uma boa parte das obras não é concluída devido a deficiências de planejamento e projeto.

A quantidade de problemas apresentados na construção do Ginásio de Matinhos é um exemplo de má execução de um projeto. Existem várias falhas estruturais. O material usado na cobertura é inadequado. O ferro já está todo corroído devido a maresia.

O caimento do telhado também está errado, pois em um dos lados a água da chuva caía sobre as arquibancadas, que descia até a quadra, danificando o piso de madeira. Hoje é possível ver algumas plantinhas crescendo no lugar onde deveria haver gente praticando esporte.

Mas os problemas não param. Os equipamentos de proteção no alto das arquibancadas também eram de ferro e não tinham a altura suficiente para impedir a queda das pessoas. O local escolhido também é inadequado devido a força do vento.

Parte do telhado já foi arrancado. As paredes do prédio estão todas pichadas. As portas de ferro das lojas construídas no local foram danificadas.

Além dos problemas estruturais, outros são apontados pelo Tribunal de Contas do Estado (TCE): falta de alvará para construção, ausência de preço máximo na licitação, contratação indevida de preços adicionais, ausência de publicação de termos aditivos, recebimento da obra sem que estivesse concluída integralmente.

O Ginásio de Matinhos figura entre as 1.055 obras levantadas pela força-tarefa do TCE em 2002 como obras inacabadas. Dessas, cerca de 90 foram escolhidas para abrir processo de responsabilização. O TCE está apontando o prefeito que exercia o cargo na época, Francisco Carlim dos Santos, engenheiros e a empresa que executou a obra como responsáveis pelo problema.

O processo está em fase de responsabilização individual e os acusados têm prazo para se defenderem. Se considerados culpados, devem ter que devolver aos cofres públicos o dinheiro gasto.

Francisco também é o atual prefeito da cidade. Durante uma semana, O Estado tentou contato por telefone e pessoalmente. Mas ele não quis atender a reportagem para comentar a situação da obra e o destino que deve ser dado a ela.

Segundo o vereador de oposição Sandro Moacir Braga (DEM), está tramitando na Câmara Municipal um projeto de lei para doar o ginásio, ou o que sobrou dele, à Universidade Federal do Paraná, para a construção de uma concha acústica.

Deficiência de planejamento

O presidente do Instituto Brasileiro de Auditoria de Obras Públicas (Ibraop), Pedro Paulo Piovesan de Farias, explica que a causa mais comum de paralisação de obras, de empreendimentos mal-sucedidos e sem finalidade, é a deficiência de planejamento e de projeto, e não a má fé.

Ele diz que até a própria nomenclatura confunde as pessoas. Para se licitar uma obra, é preciso elaborar o projeto básico e muitos técnicos entendem que se trata apenas de um documento simples, que não exige muitas especificações. Acham que será possível fazer mudanças no decorrer do empreendimento.

No entanto, depois que a obra é licitada, é preciso concluir o projeto sem alterações. A lei não permite mudanças já que pode abrir brecha para o beneficiamento de algumas empresas.

Mas se os técnicos de prefeituras têm dúvidas a respeito da nomenclatura, o mesmo ocorria com o próprio TCE. Em 2000, foi criado o (Ibraop) para discutir o assunto e tentar padronizar o trabalho dos auditores.

Em 2006, o TCE baixou uma resolução padronizando o entendimento, e os auditores passaram a fiscalizar as obras sob este prisma, o que também deu mais segurança para as prefeituras e empreiteiros. O Paraná é o pioneiro e vem ajudando a difundir a regra para o resto do País. Pedro Paulo acha que com normas mais claras devem ocorrer menos problemas nessa área.

Além da falta de um projeto bem elaborado e da confusão na nomenclatura, outro problema que faz com que surjam obras inacabadas é a descontinuidade política.

Os administradores não querem continuar determinados empreendimentos e o dinheiro que já foi aplicado acaba sendo desperdiçado, contrariando o que diz a Lei de Responsabilidade Fiscal: o orçamento deve contemplar as obras que já existem e depois novos empreendimentos.

O engenheiro cobra um planejamento a longo prazo. ?Não adianta sair colocando todo mundo na cadeia. Virão outras pessoas e farão a mesma coisa. É preciso mudar a cultura, fazer planejamento a longo prazo, estudar as demandas do povo, o crescimento do País?, diz Pedro Paulo. (EW)

Problemas são inúmeros

Além do Ginásio de Matinhos, outras obras fazem parte da lista do Tribunal de Contas do Estado (TCE). Em Tamarana, deveria ser construída uma Colônia Penal Agrícola. Vários prédios chegaram a ser erguidos em 1981, mas a obra nunca foi levada adiante. Boa parte foi demolida e alguns barracões continuam em pé. Recentemente, o local foi invadido por oito famílias de trabalhadores sem terra.

Segundo informações do secretário municipal de finanças, Cleudemir José Catai, existe um processo para a doação do terreno para os agricultores. Em 1989, na cidade de Maria Helena, foi construída uma ponte próxima ao Rio Marfim, que nunca ligou nada a lugar nenhum. É uma construção no meio de um pasto. O TCE não conseguiu localizar os dois processos para dar uma resposta sobre o que está acontecendo.

O Tribunal de Contas, entre outras funções, fiscaliza o emprego de recursos estaduais e municipais na construção de obras. Mas não são todas que acabam passando pelo seu crivo, já que há dezenas em todo o Estado e seria inviável manter uma estrutura compatível com esta demanda. O TCE segue algumas regras para escolher as obras a serem fiscalizadas, como o montante de dinheiro envolvido e relevância. (EW)

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