Dia da consciência negra

Mesmo com conquistas, negros ainda se sentem discriminados

O Brasil comemora hoje o Dia Nacional da Consciência Negra com longo caminho a percorrer na luta pela igualdade racial. Apesar de conquistas importantes nos últimos anos, a população afrodescendente ainda se sente discriminada, principalmente na hora de procurar espaço no mercado de trabalho.

A Tribuna percorreu ruas do centro e conversou com diversos trabalhadores negros. Todos disseram que já sofreram preconceito na hora de buscar emprego. E reclamam que é muito difícil superar um candidato branco com as mesmas qualificações na disputa pelo posto de trabalho.

Antes de se tornar cantor e modelo, Alexandre Melo teve dificuldade para encontrar o ganha-pão. “Percebi que muitas vezes era discriminado por minha cor, pelo cabelo grande. Já fui fazer entrevista e fui dispensado sem responder a nenhuma pergunta. A situação hoje é melhor do que a enfrentada por meu pai, mas ainda existe muito racismo”, ressalta.

Preconceito

“Aqui em Curitiba há muito preconceito”, diz a ajudante de vendas Marielen Letícia Ferreira, que veio do Mato Grosso do Sul há cinco anos. “Em muitos lugares, as pessoas olham de forma diferente, te tratam de forma grosseira. Não só na hora de procurar emprego, mas em todo tipo de relacionamento”, acredita.

Natural de Curitiba, Mirian Liar tem a mesma impressão. “A gente percebe que algumas pessoas ficam com receio logo que você se aproxima. Acham que é bandido. Quando procurei trabalho, me olhavam da cabeça aos pés, com cara estranha, e nunca me chamavam. Por isso trabalho com minha mãe no carrinho de pipoca”, afirma.

Ciciro Back
Alexandre: discriminação.

Salário sempre mais baixo

As queixas da população negra encontram respaldo em dados levantados por diversos institutos. Segundo o Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese), os negros representam quase metade (48,2%) da força de trabalho nas regiões metropolitanas do País. Porém, os salários são em média 36,11% menores que os da população não negra.

Em Curitiba, de acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), os negros ocupam 26,54% dos postos de emprego. Não existem dados específicos sobre a renda dos afrodescendentes na cidade, mas segundo o professor Romeu Gomes de Miranda, ex-presidente do Conselho Estadual de Educação e membro da Associação Cultural de Negritude e Ação Popular, no dia a dia é possível verificar que a situação é a mesma, ou ainda pior do que no restante do País.

Elite

“Há uma barreira notável e extraordinária para o negro galgar empregos com remuneração maior. Isso é facilmente constatado quando se observa postos de trabalho considerados de elite”, aponta. “Quando se vai ao shopping, banco ou grande empresa, se percebe que só existem negros trabalhando na limpeza ou segurança. Não é por falta de qualificação. É fruto de grande preconceito, com raízes históricas”.

Dia de trabalho normal

O Dia da Consciência Negra é comemorado hoje com trabalho normal em Curitiba. A tentativa de derrubar a liminar que suspendeu o feriado em homenagem a Zumbi dos Palmares na cidade foi frustrada na noite de segunda-feira, quando o ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal (STF), não aceitou o pedido protocolado pela Câmara de Curitiba.

A justificativa de Mendes foi a falta, na documentação enviada pela Câmara, da cópia da decisão do Tribunal de Justiça que suspendeu o feriado. A corte local atendeu pedido da Associação Comercial do Paraná (ACP) e do Sindicato da Industria da Construção Civil (Sinduscon), que questionaram a validade da lei que instituiu o dia de folga.

O outro lado

A Câmara, porém, nega que tenha falhado na ação. “Não tivemos acesso ao acórdão do TJ em tempo. Solicitamos o documento no dia 11 de novembro, mas só o que conseguimos foi a certidão, sem o teor da decisão”, diz o presidente vereador Paulo Salamuni.

Apesar do revés, a Câmara e entidades do movimento negro vão continuar brigando na Justiça. Além das ações que correm no TJ e no STF, que ainda serão analisadas no mérito, recurso no Conselho Nacional de Justiça (CNJ) tenta colocar Curitiba entre os mais de mil municípios em que a data é comemorada com feriado.

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