Médicos teriam criado uma “indústria de partos”

Os dois médicos acusados de realizar cobranças indevidas de pacientes e de induzir partos com o uso de um medicamento conhecido como Cytotec no Hospital e Maternidade de São José dos Pinhais foram afastados ontem de suas funções. O afastamento foi concedido pelo juiz Ivo Faccenda, da 2.º Vara Civil da cidade, a pedido do Ministério Público. Há suspeita de que a substância usada tenha provocado a morte de bebês, paralisia cerebral, entre outros problemas.

O número de partos realizados pelos médicos Eldo Ern e Cristina Cerniaki surpreendeu os novos diretores do hospital, que assumiram o cargo em abril deste ano. Em agosto, os dois sozinhos realizaram 103 partos, enquanto os outros 10 médicos do hospital juntos fizeram apenas 36. Cada médico plantonista recebe do Sistema Único e Saúde (SUS) o referente à quantidade de procedimentos realizados, cerca de R$ 121,00. Juntos os dois receberam R$ 12.463, enquanto os demais R$ 4.356,00. Outros dois hospitais da cidade também perderam para os dois médicos, o Hospital e Maternidade Nova Clínica fez 65 partos e o Hospital Municipal Atílio Talamini 76, durante o mesmo mês.

Para conseguir números bem superiores aos outros colegas, os médicos estariam usando uma substância abortiva, de uso restrito. “Não importa em qual fase gestacional, ela produz forte contrações que pode levar ao aborto ou ao nascimento”, diz o promotor Divonzir José Borges. Além disso, quando ela é ministrada, a informação deve constar no prontuário do paciente, o que não vinha ocorrendo.

Denúncia

Os dois médicos começaram a ser investigados quando pacientes denunciaram ao hospital a cobrança por serviços que o SUS já paga. A nova diretoria abriu a sindicância para apurar o caso e encaminhou a denúncia ao Ministério Público. Durante as investigações o hospital verificou que estava sendo usada uma grande quantidade de Cytotec. Daí se chegou ao número recorde de partos feitos pelos dois médicos.

Até agora já foram verificados cinco casos suspeitos de cobranças indevidas, com valores que variam entre R$ 100,00 e R$ 800,00. De acordo com o provedor do hospital, Moacir Piovesan, a sindicância interna e o MP estão também apurando se há outras pessoas envolvidas, já que vários documentos teriam sido fraudados pelos médicos. Divonzir avalia que as investigações devem durar pelo menos 60 dias. O promotor está analisando casos entre 2001 e 2003. Dos 34 volumes, ele estudou oito, onde constam casos de morte e paralisia cerebral. A maioria dos bebês atendidos nasceu após completar 32 semanas (sete meses), sendo que a fase gestacional dura 40 semanas. Eldo trabalha há cerca de 20 anos no hospital e Cristina há pelo menos 6.

Pode causar paralisia cerebral

O médico obstetra e chefe de Gabinete da Secretaria Estadual de Saúde, Gleden Prates, explica que o Cytotec foi lançado há mais de 10 anos para tratamento gástrico. Depois descobriu-se que um dos efeitos colaterais eram as contrações uterinas, provocando abortos e ela teve o uso restringido a hospitais. Há alguns médicos que defendem seu uso, outros são contra. Depois de aplicada no organismo ela pode provocar contrações muitos fortes, uma atrás da outra. Se o médico não realizar uma cesariana ou aplicar medicamentos, o bebê pode morrer. Também diminui a quantidade de oxigênio que vai para o bebê. Com isso, entre diversos problemas ele pode causar a paralisia cerebral. A venda e o uso do medicamento são controlados pela Vigilância Sanitária.

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