Jovens são as maiores vítimas da aids

Segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS), a cada ano 150 milhões de pessoas entre 13 e 24 anos se tornam ativas sexualmente no mundo. No Brasil são em torno de 4 milhões. O dado mais preocupante, porém, é que são os jovens os que menos usam preservativos nas relações, tornando-se um grupo extremamente vulnerável ao HIV, o vírus da aids. Pesquisas mostram que a relação sexual responde por 80% dos casos de transmissão da doença. Para chamar a atenção para o problema, nesta semana a ONG Ação e Cidadania lançou uma campanha nacional contra a aids, com a participação de Sandy e Júnior. O articulador da campanha foi Daniel de Souza, filho do sociólogo Betinho, que era hemofílico e morreu devido às complicações da doença, adquirida durante transfusão de sangue.

Para a diretora do Centro de Informação em Saúde, Mariângela Galvão Simão, o acesso à informação já não é mais problema e a vulnerabilidade dos jovens ocorre devido ao comportamento de risco que assumem diante da vida, característica comum da idade. Ela lembra que esse comportamento é observado não é só em relação à aids, mas também em outras situações como no abuso da velocidade e ao nadar em lugares perigosos, por exemplo.

Segundo uma pesquisa do Ministério da Saúde com jovens ligados ao Exército, a minoria costuma usar camisinha depois que ingeriu algum tipo de droga, como bebidas alcoólicas ou as ilícitas. A diretora da ONG Pela Vida em Curitiba, Clarisse Calo, endossa a afirmação. “Eles vão em festinhas, bebem e a última coisa que vão se lembrar é de se prevenir”, lamenta. Outra situação comum entre os jovens é usar a camisinha nos primeiros encontros e depois deixá-la de lado. Além disso, os namoros acabam muito rápido e logo começam outro relacionamento.

Mariângela explica que a maior dificuldade está em fazer com que os mais jovens adquiram hábitos saudáveis e salienta que, neste ponto, pais e escola têm um papel fundamental. Segundo ela, a Secretaria Municipal de Saúde desenvolve trabalhos sobre o assunto junto com colégios municipais e estaduais. Os pais também são convidados a participar.

Preconceito atrapalha

Clarisse comenta que depois que os jovens se tornam soropositivos têm muita dificuldade para pedir ajuda. Ela fala sobre o caso de um rapaz que ligou mais de 15 vezes para a ONG querendo saber sobre o risco que a família dele poderia estar correndo. “Eram dúvidas sobre o uso de banheiro, toalha e outros relacionados à área doméstica”, conta.

Segundo ela, os jovens têm muito medo de contar o que está acontecendo tanto para a família quanto para os amigos. “Eles passam primeiro por um processo de negação. Não tenho certeza se este jovem está usando camisinha em seus relacionamentos sexuais”, diz. Para ela, a sociedade ainda está despreparada para enfrentar a situação. “Há mais tolerância para o convívio social, mas quando se trata de relacionamento afetivo direto, o medo ainda é grande”, diz.

Clarisse considera que falta material educativo para essa faixa etária e as campanhas precisam ser mais intensas. “Precisamos ficar batendo sempre na mesma tecla”, diz. Ela critica também o fato de que em Curitiba não existem pessoas especializadas para atender aos jovens. Mas a cidade tem caminhado para entrar em sintonia com esse público. Mariângela conta que no ano passado mais de mil funcionários de postos de saúde foram treinados para entender melhor o que passa pela cabeça dos adolescentes. Ela explica que os jovens têm mais dificuldade do que um adulto para chegar a um posto de saúde e pedir uma camisinha ou informações. E a situação preocupa.

Segundo o último censo, Curitiba tem 462.966 jovens, 18% são adolescentes com idade entre 13 e 19 anos e 10% são jovens, com idade entre 19 e 24 anos. Segundo dados da Organização Mundial de Saúde, a metade das pessoas que contraíram o HIV no mundo foi infectada antes dos 25 anos. Em Curitiba, 23% dos homens e 30% das mulheres doentes de aids foram infectados na adolescência.

Vida normal para as crianças

A ONG Associação Paranaense Alegria de Viver (Apav) cuida de crianças com idade de zero a 12 anos que vivem com o vírus da aids, a maioria delas infectada pela mãe. Lá recebem atendimento médico, têm acesso à escola e principalmente carinho.

A diretora executiva Maria Rita Teixeira explica que os pequenos que vivem no local levam uma vida normal. O único inconveniente são as doses de medicamentos que precisam ser ingeridas diariamente. Ela diz que antigamente eles até tomavam alguns cuidados especiais para que as doenças oportunistas não aparecessem, como evitar pegar sereno, pés no chão e até mesmo com a alimentação. Agora a rotina é bem parecida com a de qualquer criança.

Quem está em idade escolar começa a freqüentar estabelecimentos públicos. Maria Rita conta que o desempenho escolar deles é muito bom. Mas, no início, foi difícil as escolas aceitarem a presença deles. Hoje, afirma, a receptividade é excelente. O relacionamento com os colegas também é natural. “As crianças não têm preconceito”, explica Maria Rita, e até os pais chegam a se oferecer para ajudar na ONG. Para chegar a esse ponto não foi fácil, foi preciso passar muita informação sobre o assunto.

Na casa há crianças que nasceram com o vírus e hoje já estão com 12 anos. K. é um exemplo e um orgulho. Ele foi infectado em uma transfusão de sangue. Na época, sua perspectiva de vida não era das melhores. Em um ano chegou a pegar oito vezes pneumonia, além de tuberculose e varicela. Hoje, com os medicamentos, são raras as vezes em que vai ao hospital. “Eles dão uma lição de vida muito grande. É impressionante a força de cada um, aceitando bem todo o tratamento”. (EW)

5.057 notificações na capital

Em Curitiba, o primeiro caso de aids foi registrado em 1984. De lá para cá foram notificadas 5.057 pessoas doentes, sendo que 90,6% estão na faixa etária de 13 a 49 anos. A média atual é de 600 novos doentes de aids por ano na cidade.

Por mês, a Prefeitura realiza 1.300 testes com gestantes e mais 1.600 na população em geral. Quem está com o vírus recebe gratuitamente o medicamento do Ministério da Saúde. O Brasil tem, aproximadamente, 600 mil portadores do vírus da aids, o HIV. Desses, em 597 mil portadores incluem-se as pessoas que já desenvolveram aids e excluem-se os óbitos.

Mais pobres

A aids continua a atingir cada vez mais as camadas mais pobres da população e com escolaridade mais baixa. Em 1987, 21% dos casos eram de pessoas analfabetas e com o primeiro grau incompleto. Hoje o número subiu para 63%.

Um dado positivo é que a letalidade diminuiu significativamente no País com a distribuição de medicamentos anti-retrovirais. Em 1986, 86% das pessoas que contraíam o vírus morriam, em 2000 o número caiu para 16%. Mas é importante lembrar que a prevenção é importante porque ainda não existe cura para a doença. (EW)

Mais mulheres infectadas

Um dado que preocupa é a feminização da doença. Quando ela surgiu, havia 7 homens doentes para cada mulher. Agora existe um homem para duas mulheres, sendo que na faixa etária de 13 a 24 anos, a proporção já está igual. Isso acaba tendo reflexos no número de gestantes com o vírus. De acordo com o obstetra do Departamento de Tocoginecologia do Hospital de Clínicas, Renato Sbalqueiro, em quatro anos triplicou o número de mulheres grávidas com o vírus em Curitiba e região.

Sbalqueiro conta que entre 1997 e 1998 de cada mil gestantes, uma era soropositiva. Hoje, de cada mil, 10 estão infectadas. A média de atendimento semanal no HC fica entre 10 e 17 pacientes. Desde outubro de 2001 até hoje já passaram por lá 197 pacientes, sendo que a idade delas varia muito. Há adolescentes de 14 anos e também senhoras acima de 40 anos. Sbalqueiro afirma que a grande maioria contraiu o vírus em um relacionamento fixo, por isso recomenda sempre o uso do preservativo. “Se deixar de usar uma vez, outras vão acontecer”, diz.

É recomendação do Ministério da Saúde que todas as gestantes façam o teste de HIV. Em Curitiba, ele é feito através do acompanhamento pré-natal nas unidades de saúde. Quando o resultado é positivo, elas são encaminhadas para tratamento no HC, Hospital Evangélico e Unidade de Saúde do Bairro Novo.

Com o tratamento, as chances de o bebê nascer com o vírus caem para 2% e em alguns casos a chances chegam a ser nulas. (EW)

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