História da Lapa está relacionada aos trilhos

A histórica Lapa, a 64 km de Curitiba, nasceu por volta de 1731, às margens da Estrada do Mato, que era um trecho histórico do caminho de Sorocaba (SP) a Viamão (RS). Sua primeira denominação foi Capão Raso. Ainda hoje, a cidade preserva sua história, que tem como um dos marcos a ferrovia. A primeira estação ferroviária foi inaugurada em 18 de novembro de 1891, em meio ao palco das sangrentas lutas do Cerco da Lapa, do confronto entre maragatos e as forças republicanas. A somatória de fatos e acontecimentos justifica em parte o entusiasmo da população em resgatar a linha férrea, consolidando mais um ponto turístico.

Depois da privatização do transporte ferroviário, em 1996, iniciou-se um processo de abandono das estações, tanto que a da Lapa, a mais antiga da região, chegou a ser incendiada. Apesar disso, um projeto de restauração alimenta a esperança de lapeanos. O movimento pró turismo férreo, criado em 1999 e encabeçado pelo empresário e consultor em turismo Marcio Assad, vem fomentado a retomada destes passeios turísticos. A seu favor está o sucesso obtido com outras iniciativas similares. Como exemplo, o dia 13 de junho de 1999, quando a Maria-Fumaça voltou a percorrer os trilhos ferroviários do Paraná, no trecho Curitiba a Lapa. A viagem não marcou apenas as comemorações do aniversário da cidade, mas o retorno, depois de oito anos, desta importante locomotiva. Três dias após o anúncio da viagem, todos os 280 lugares estavam vendidos.

Toda esta história foi relatada por Assad, no ano passado, aos alunos e ao professor de Economia da Faculdade Educacional da Lapa, José Evano Dutra, que encampou a idéia e criou o projeto Trabalho Prático Econômico e Turístico (Trapet). O projeto tem por objetivo trazer de volta a Maria-Fumaça, resgatando o passeio turístico entre as estações Lapa e Lavrinha. A intenção é percorrer 18 km, marcados por atrações desde a partida até à chegada do trem. “As pessoas serão recepcionadas com a banda ou pelo grupo de serestas, com trajes típicos da época”, explica Assad. A expectativa com isso é movimentar as pousadas, restaurante e demais estabelecimentos comerciais ao longo do trecho. O projeto prevê ainda um centro de artesanato na estação Lavrinha, onde deverão ser comercializados os doces típicos da região.

Segundo o professor Dutra, o projeto foi encaminhado à ABPF-PR (Associação Brasileiras de Preservação Ferroviária Regional Paraná) que está dando todo o apoio e também à Prefeitura Municipal da Lapa, que está negociando a compra das duas estações. Mas a concretização do projeto, diz Assad, depende da América Latina Logística (ALL) ? concessionária das ferrovias da Malha Sul da Rede Ferroviária Federal (RFFSA) ? em conceder a faixa de horário. Mas a ALL alega que só tem a concessão do transporte de carga. Segundo a Assessoria de Comunicação da empresa, a autorização neste caso é da União, por meio da Agência Nacional de Transporte Terrestre (ANTT).

A RFFSA tinha um compromisso histórico que agora poderá ser resgatado. Como a Estação da Lapa já foi restaurada, restam apenas as obras junto a Estação Lavrinha. O trecho que está sendo proposto tem forte pólo turístico, como o conhecido Spa da Lapinha, freqüentado por artistas e autoridades nacionais. Além de ser uma ligação férrea curta, não há passagem de nível. “A cidade aguarda ansiosamente a concretização deste projeto, que vem de encontro aos interesses do município”, destacou Assad.

O passeio de Maria-Fumaça de Curitiba até a Lapa, que fez muito sucesso na década de 80, não está sendo cogitado. Primeiro, pela demora. O trajeto levaria cerca de duas horas e meia para ser concluído, afinal seria um trecho de 94 km. E segundo, ao contrário da bucólicas imagens registradas pelas janelas da antiga locomotiva a vapor, o viajante iria ver, por exemplo, as favelas de Pinhais.

Primeira estação, de madeira

A Lapa ganhou sua primeira estação ferroviária em 18 de novembro de 1891, uma edificação de madeira. Depois veio a Estação Engenheiro Bley, em 18 de fevereiro de 1914. Na década de 50 ocorreu uma série de modernizações com a instalação no final de 1949 da Rio da Várzea, em 1950 a da Lavrinha e, em 1952, a construção da nova Estação de Lapa, então em alvenaria.

O projeto de reativação das estações Lapa e Lavrinha significa novos pontos turísticos e atrativos para o município e a tão esperada volta da Maria-Fumaça. Para o presidente da Regional Paraná da Associação Brasileira de Preservação Ferroviária (ABPF), Carlos Dias Correia Augusto, para o projeto vingar é preciso antes de mais nada a prefeitura abraçar a causa. O primeiro passo foi dado a cerca de dois meses com uma reunião entre os parceiros. A ABPF-PR se comprometeu em parceira com a ALL e a Fundação Educacional da Lapa em fazer o projeto para restauro da locomotiva e equipamentos ferroviários. Segundo Carlos Dias, no momento, a Associação está empenhada em buscar patrocínio, principalmente do setor privado que é menos burocrático. “Acredito que não será difícil reativar este sonho no Paraná. É preciso empenho da Prefeitura, Secretaria Municipal de Turismo, vontade da ALL e parceria com o BRDE (Banco Regional de Desenvolvimento do Extremo Sul).”

A ABPF, entidade sem fins lucrativos fundada em 1977 e que atua no Paraná desde 1994, tem como principal missão o resgate da memória ferroviária. Mas para que isso aconteça é preciso que cada município, que tem uma empresa que gerencia as linhas férreas, desenvolva o projeto de reativação e turístico. E a associação então trabalha com o projeto de restauro das locomotivas a vapor.

O significado

Como a Lapa era uma região de extração da madeira e erva-mate, a reativação da ferrovia significa a oportunidade de mostrar aos munícipes e também turistas como tudo acontecia, principalmente no início do século passado. A ferrovia alavancou o comércio e principalmente o setor agrícola, já que a região era produtora, entre outras coisas, de arroz, aveia, alhos, cebola e milho.

Além de indústrias, o histórico município tem o pólo turístico, que deverá ganhar forças com a concretização do projeto de reativação das duas estações. Para o consultor em turismo, Márcio Assad, que é lapeano, colocar novamente nos trilhos a Maria Fumaça representa, em particular, resgatar a memória da família. Afinal seu avô, Elias Kallil Saad Mattar, que veio do Líbano, instalou-se na cidade devido à ligação férrea. “Ele mantinha o intercâmbio com os parentes graças à linha férrea. Mandava produtos agrícolas que recebia do litoral do Paraná, como cachaça, rapadura e banana e também os da região que era o leite da Lapa. A internet da época era o trem,” conta.

O comércio do seu avô era freqüentado pelos tropeiros e caixeiros-viajantes. Mas a partida e a chegada dos trens, também marcou as relações dos casais da época. Afinal, era a condução que o rapaz tinha para ver a namorada. Além disso, a diversão das moça na época era ver o trem chegar, trazendo novidades da cidade. (JM)

Bons tempos eram os de viagem de trem

O precursor do movimento pró turismo férreo foi um projeto lançado em 1984, em Brasília, durante Congresso Nacional da Abav (Associação Brasileira de Agência de Viagem). O projeto previa, entre outros trajetos, uma viagem de Maria-Fumaça de Curitiba a Lapa, com duas e três saída por mês. O passeio turístico que começou a ser operado em fevereiro de 1986, foi considerado o melhor receptivo no sul do Brasil, tendo levado a histórica cidade mais de dois mil turistas.

A segunda tentativa, também de sucesso, ocorreu em 1999, quando depois de oito anos sem percorrer os trilhos ferroviários do Paraná, Maria Fumaça, construída em 1941, voltava à ativa. O trajeto entre Curitiba e Lapa, elaborado pela Associação Brasileira de Preservação Ferroviária – Regional Paraná -marcava as comemorações no dia 13 de junho do aniversário da Lapa.

Para a viagem, a ABPF do Paraná teve que pedir emprestada à regional de Santa Catarina a Maria-Fumaça que fazia o trajeto turístico “Ferrovia das Cachoeiras” que ia de Rio Negrinho a Corupá (Vale do Itapocu).

O passeio de Maria-Fumaça, também chamado de “trem casamenteiro” por ter circulado no dia de Santo Antônio, teve como atração a passagem em cima de trilhos construídos no início do século passado. O chamariz era a paisagem, marcada por muito verde e casarões antigos. Durante o trecho de 80 quilômetros havia apenas uma parada de 15 minutos para abastecimento da máquina na Estação de Balsa Nova. (JM)

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