Vida nova

Haitianos ganham pouco e moram de forma precária

Um subembrego no Brasil vale muito mais do que um emprego de nível superior no Haiti, país que fica numa ilha da América Central que ainda não conseguiu se reerguer de um terremoto em 2012. A constatação é dos milhares de haitianos que desembarcam por aqui desde então, em busca de dignidade e sustento pras famílias que ficaram.

O que é visto pela sociedade brasileira como favela e baixa remuneração, têm sido encarado como conforto e dignidade pelos haitianos, que vêm de um país onde não há emprego, não há dinheiro, muita coisa ainda está destruída, as pessoas estão passando fome, boa parte sequer têm água para beber, e a criminalidade e a corrupção andam em níveis inimagináveis.

Basta apenas ver o último Índice de Desenvolvimento Humano (IDH), divulgado pela Organização das Nações Unidas (ONU), este mês. O Haiti teve a média 0,471 e é considerado um país de muito baixo desenvolvimento humano. Lá, a expectativa de vida é de 63,1 anos, ou seja, quase 11 anos a menos do que aqui.

Mas o que “convida” mesmo os haitianos a virem pra cá é a renda anual per capita do brasileiro. Enquanto aqui o valor médio é de 14.275 dólares por habitante, lá é de apenas 1.129 dólares.

Sem rumo

Atraídos pelos salários que eles consideram bons (mesmo não passando dos mil reais), comida farta, muito mais segurança que no Haiti e condições de sustentar a família, muitos haitianos têm vindo ao Brasil com ajuda da Pastoral do Imigrante. Ultimamente, algumas empresas têm até solicitado essa mão de obra à Pastoral.

Mas segundo Nádia Floriani, advogada da Casa Latino Americana (Casla) e presidente da Comissão dos Direitos de Refugiados e Imigrantes da Ordem dos Advogados do Brasil – Seção Paraná (OAB-PR), não existem políticas públicas migratórias, fazendo com que este público chegue ao Brasil em extrema vulnerabilidade.

Muitos haitianos sequer têm onde dormir ao chegar por aqui. Depois de receber o visto humanitário do Ministério da Justiça (com o qual podem tirar documentos brasileiros), boa parte não sabe pra que lado dar o primeiro passo. Muitos conseguem hospedagem na casa de conhecidos que já estão aqui há mais tempo, outros tentam vagas nas poucas e pequenas casas de imigração – que geralmente só abrigam por 15 a 30 dias, como a Casa do Imigrante, em Santa Felicidade.

Uma parcela acaba ficando nas ruas até conseguir teto e emprego, como foi o caso de uma mãe de 23 anos, que chegou aqui com a filha de três anos e ficou dias perambulando nas ruas.

Marco Andre Lima
Nádia: luta por abrigo e escola.

Conforto na “favela”

Assim que começam a trabalhar no Brasil e a receber os primeiros salários, muitos haitianos que estão morando de favor na casa dos amigos ou em abrigos temporários se vêem obrigados a deixar o local, já que o “aperto improvisado” começa a incomodar e os abrigos precisam dar lugar a quem está chegando sem teto e sem emprego. Mas, com a baixa renda, e ainda sem ter quem seja fiador para conseguirem um aluguel, os haitianos acabam direcionados a favelas, onde geralmente o contrato do aluguel é de boca.

O fato dos haitianos estarem se embrenhando nas comunidades pobres da grande Curitiba, aliado à falta de malícia deles com os costumes brasileiros, está fazendo com que muitos fiquem expostos à criminalidade, que geralmente é maior nestas áreas. Desde setembro do ano passado, dois haitianos já foram vítimas de crimes.

O primeiro foi Emanes Saint Louis, 22 anos, encontrado morto a facadas num beco da Vila Operár,ia, em Campo Largo. Ele trabalhava como carregador no estoque de um supermercado. A outra vítima foi Djemsy Recilien, 23 anos, que trabalhava como auxiliar de produção numa indústria de sabão e foi baleado na frente de sua casa na Vila Torres, no Prado Velho.

Suporte pra recomeçar

A organização não-governamental Casa Latino Americana (Casla) tenta dar todo o suporte jurídico e social possível, gratuitamente, não só a haitianos, mas a qualquer imigrante que venha o Brasil. Nessa massa de pessoas que procuram emprego aqui, também há nigerianos, africanos, guineenses (moradores de Guiné Bissau), sírios, entre outros. E há a expectativa de que muitos palestinos também busquem o Brasil nos próximos meses, por causa da guerra civil em Israel.

Nádia Floriani, advogada da Casla, pretende interceder junto às autoridades locais para, entre outras medidas, construir uma casa grande o suficiente de acolhida de imigrantes. Na visão dela, a terra não tem nacionalidade e todos têm o direito de ir e vir. Em outubro passado, a Casla, em parceria com outras entidades, laçou uma campanha de apoio ao imigrante, já que ainda são poucas as ONGs e sindicatos que têm abraçado a causa.

A campanha surtiu alguns pequenos resultados. Um deles foi uma parceria com a Universidade Federal do Paraná (UFPR), que através do seu Centro de Línguas (Celin), abriu um curso de português para estrangeiros, já que uma das maiores barreiras destes imigrantes para melhorar suas condições de vida por aqui é o idioma. Na terra natal eles falam francês e a língua crioula local.

Os haitianos fazem aulas de português todos os sábados no Celin, horário escolhido para não atrapalhar as atividades profissionais durante a semana. Mesmo assim, Nádia defende que o português para estrangeiros deveria existir em todas as escolas públicas, ou pelo menos em boa parte delas.

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