Golpe pode desabrigar 150 famílias em Matinhos

Cerca de 150 proprietários de sobrados e apartamentos em Matinhos podem perder suas casas a qualquer momento. Eles moram em conjuntos espalhados por toda a cidade e a maior parte deles nem se conhece. A única coisa que têm em comum é o fato de terem caído no mesmo golpe aplicado pelo pastor Osmar Jesus Molonha.

Através de anúncios em jornais, Molonha oferecia sobrados com pagamento facilitado. Começou a fazer isso em 1995 e continua até hoje. Ele vendeu sobrados no Conjunto Residencial Floresta, no bairro Santa Lúcia, em Matinhos, no Conjunto Planalto, no bairro do Bom Retiro, também em Matinhos e, por último, no conjunto Maranatha, em Caiobá. Só no mês passado, depois de acreditarem durante anos nas promessas de regularização dos imóveis, alguns moradores perceberam que correm o risco de perder seu patrimônio.

Os donos de imóveis dos três conjuntos descobriram que suas casas estavam penhoradas para quitar dívidas do pastor. Réu em mais de 20 execuções penais, Molonha foi processado por um dos compradores que enganou e, como garantia do pagamento da dívida, teve os bens penhorados. Ao descobrirem o fato, os moradores correram até o cartório da cidade e só então viram que suas casas não existem. Não há registro dos imóveis e tudo não passa de lotes de terras vazios, todos em nome de Molonha.

O problema vem desde a época da construção, já que toda a documentação das obras está irregular. Molonha não pagou as taxas devidas e por isso a Prefeitura não cede a documentação necessária para a averbação das benfeitorias construídas. Pior ainda, o engenheiro responsável pela construção dos três conjuntos é Durval Ferreira Romualdo, que, em 1996, era também o secretário de Obras da cidade. O prefeito na época da construção dos sobrados era Francisco Carlim dos Santos, conhecido por Xiquinho, e que é o atual prefeito de Matinhos.

Alguns moradores desconfiaram da maracutaia ainda em 1997 e existem cartas registradas na Prefeitura, enviadas para o prefeito Xiquinho e para o diretor de Urbanismo, Luiz Fernando Freire, comunicando das irregularidades. Porém, mesmo sabendo que algo estava errado, a Prefeitura continuou aprovando mais projetos de Molonha e do engenheiro Romualdo.

Um morador, que prefere não se identificar, comprou um sobrado no conjunto Planalto, em outubro de 1997. Até hoje não conseguiu registrar o imóvel que custou R$ 21 mil. Ele está tentando de todas as formas regularizar a situação do imóvel e isso tem lhe rendido sérios problemas. Já teve a casa invadida duas vezes e até ameaça de morte já sofreu.

Ainda em 1997, a vítima escreveu uma carta e enviou para o então prefeito de Matinhos, o Xiquinho. A carta denunciava irregularidades na obra. O então secretário de Obras do município, Luís Carlos Vanalli, também recebeu o documento. A resposta veio dias depois, assinada pelo então diretor de Urbanismo, Luiz Fernando Freire – que ocupa o mesmo cargo na atual gestão do prefeito Xiquinho – e que também assinou a carta de resposta enviada para o morador este ano, depois que ele novamente procurou a prefeitura para informar das irregularidades.

Processo resultou em penhora

O processo que resultou na penhora dos bens do pastor Osmar Jesus Molonha foi impetrado pelo subcomandante do Exército Luiz Carlos Ferrari. Ele mora na Lapa e atualmente trabalha em São Francisco do Sul, em Santa Catarina. Ferrari comprou um sobrado de Molonha no conjunto Planalto.

Ele conta que fez um acordo com Molonha que, em um ano, deveria apresentar toda a documentação do sobrado, devidamente repassada para o nome de Ferrari. ?Paguei 18 das 42 parcelas e ele continuava me enganando. Então parei de pagar o sobrado e o pastor me ameaçando de tomar meu imóvel. Foi quando, num fim de semana, aparece uma senhora de Maringá na frente do meu sobrado, querendo saber quando eu desocuparia o imóvel?, conta Ferrari. ?Ele vendeu meu imóvel para essa mulher. Pegou dela uma casa em Maringá como parte do pagamento e disse que eu era um inquilino inadimplente, que logo sairia da casa. Foi aí que entrei na Justiça?, explica o subcomandante.

Ferrari teve ganho de causa porque Molonha acabou julgado à revelia. Como não compareceu no tribunal, teve os bens que estão em seu nome penhorados, para quitar a dívida. ?Informei todos os moradores do condomínio e dei o telefone do meu advogado. Quero resolver o meu problema e a idéia é que seja encontrada uma solução ideal para todos, já que todo mundo foi enganado pelo pastor?, afirma.

Mas muita gente não gostou da ameaça de perder a casa e um dos moradores do conjunto Maranatha entrou com um embargo, para impedir a penhora. De acordo com Ana Paula Santos Valadão, advogada responsável pelo processo de embargo, o objetivo é conseguir excluir o terreno – onde foram construídas as casas do conjunto Maranatha – da execução de cobrança. ?O juiz que deferiu a penhora só tomou conhecimento dos bens através do registro de cartório e no cartório só existe registro dos terrenos. Entramos com um embargo para mostrar ao juiz que existem sobrados nesses terrenos e que esses não estão averbados por causa da documentação irregular?, explicou a advogada. (SR)

Secretário desconhece caso

Procurado pela reportagem de O Estado, o atual secretário de obras do município, Luiz Carlos Vanalli, disse que desconhece o caso. No entanto, existem cartas protocoladas e enviadas a ele datadas de janeiro e fevereiro deste ano. ?Nada chegou em minhas mãos?, disse. No entanto, quando questionado que o problema já vem desde a última gestão do prefeito Xiquinho, quando ele também era secretário de Obras, Vanalli preferiu não responder e disse que não sabe de nada.

O diretor de urbanismo Luiz Fernando Freire disse que Molonha teve alvará de construção liberado na antiga gestão do prefeito Xiquinho porque apresentou toda documentação correta. ?Mas as irregularidades que foram aparecendo se deram em outras gestões e a Prefeitura não pode fazer nada. Como ele não pagou os impostos devidos, não há como liberar documentação para averbar as casas. Mas o IPTU é cobrado da mesma forma?, explica.

Em fevereiro deste ano, os moradores do conjunto Maranatha, em Caiobá, foram informados que suas casas iam para leilão em maio por causa da falta de pagamento de IPTU. Uma das moradoras e que também caiu no golpe de Molonha conta que eles pagavam para o pastor o valor do IPTU. Porém Molonha nunca pagou o imposto, que está atrasado desde 1998. ?Só não consigo saber como a prefeitura cobra o IPTU de imóveis que legalmente não existem?, questiona a moradora.

Para evitar o leilão, os moradores do conjunto dividiram a dívida em parcelas iguais, a serem pagas em 36 vezes. Ao todo, eles vão pagar cerca de R$ 12 mil.

Pastor

O pastor Osmar Jesus Molonha foi procurado pela equipe de reportagem. Na sede do templo Caminho da Verdade, no bairro Boqueirão – onde Molonha também mora – um de seus filhos disse que o pastor não poderia atender a equipe porque estava acamado.

Um dia antes, ele foi visto em Matinhos, circulando com sua S-10. O pastor é dono de nove templos da igreja Caminhos da Verdade. Depois que os problemas começaram a pipocar, não apareceu mais na casa onde morava em Matinhos. Também parou de atender as ligações das pessoas com quem fez negócio e trocou o número do telefone celular. (SR) 

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