Estatuto do adolescente não é nada paternalista

O Estatuto da Criança e do Adolescente está de aniversário. Mas há um grande erro das pessoas, autoridades e principalmente da mídia quando se fala dele. O Estatuto não veio para trazer a irresponsabilidade, e de modo algum tem sentido protecionista, como entende a maioria das pessoas.

Pensar que não acontece nada ao adolescente quando for autor de crime ou delito, é muito errado. É um verdadeiro absurdo. É comum se confundir inimputabilidade que é capacidade de receber a pena com irresponsabilidade. O infrator responde por tudo o que cometer. Começa pela advertência até a internação. O que acontece, é que o Estatuto mudou apenas a terminologia, pois internação nada mais é do que privação da liberdade. Um infrator pode ficar até três anos “internado”, o que parece pouco, mas na realidade, isso não foge muito do que acontece com os crimes cometidos por adultos.

Um exemplo claro foi a condenação do ator de TV Guilherme de Pádua, assassino de Daniela Peres. Ele pegou 20 anos, mas com o relaxamento da pena ficou recluso mesmo somente três anos, o que é igual a qualquer caso de adolescente que tenha cometido um delito grave. O jovem infrator recebe, progressivamente penas de advertência, reparação de danos, liberdade assistida, semiliberdade ou internação. Os especialistas na área defendem a tese de que “não adianta punir”, entendendo que isso funciona muito mais como satisfação para a sociedade, porém de eficiência duvidável. “Desde 1984 várias penas restritivas de direito foram modificadas. De lá para cá muitas delas implicam só em prestação de serviços à comunidade como forma de pagar pelo erro.

Em 1989, quando o Brasil assinou na ONU a Convenção Universal dos Direitos da Criança, se comprometeu a trazer para sua lei interna o Estatuto do Menor e do Adolescente. Tanto é assim que já consta da Constituição Federal em seus artigos 204 e 227. Com ele a criança e o adolescente ganharam direitos, mas também obrigações, ou seja, sua cidadania. Agora, qualquer deles, como o cidadão adulto, pode ser preso em flagrante ou por ordem judicial. Fora a isso, o que existe é desinformação sobre seus os direitos e deveres.

O processo penal para menores infratores é mais rápido do que para o adulto. O da criança e do adolescente, tem no máximo 45 dias para ser resolvido, quando que para o adulto, pode ser arrastar por anos e anos, engavetado e esbarrando na burocracia jurídica.

A própria sociedade e o Estado por “usarem” essa falta de informação que envolve até a polícia se furtam dos problemas. Cerca de 90% dos casos de crimes cometidos por adolescentes e que chegam até a Delegacia, implicam em envolvimento com drogas. E aí entra o papel dos pais. Estamos num ponto em que os pais simplesmente dizem que não podem fazer mais nada. Entretanto, o dever de correção não acabou. E o saudável rigor educacional deve persistir, mesmo porque, com a evolução da sociedade a educação dos filhos ganhou mais um chefe de família, que não se restringe mais apenas ao homem. Hoje homem e mulher são os chefes da família, com direitos e obrigações idênticos. O desarmamento da sociedade é outro ponto fundamental para a não violência. Nos finais de semana homicídios banais são cometidos, por adolescentes, em ônibus urbanos de Curitiba. Em várias ocasiões a polícia apreende com os criminosos, armas de fogo ilegais. Por aí se vê que a sociedade está fortemente armada, colocando em risco sua própria integridade. É inexplicável e condenável a facilidade com que consegue comprar uma arma hoje em dia.

Falta de perspectiva

Especialistas no tema delinqüência juvenil entendem que a falta de perspectiva, independente da condição social ou econômica do adolescente, é em geral a principal causa da marginalidade. O mais complicado é a “vida pobre” e não à condição de pobreza, ao contrário do que mostram as estatísticas. Veja-se o caso de Brasília, onde os jovens atearam fogo e acabaram matando o índio Pataxó. Lá é comum os jovens queimarem e matarem mendigos que dormem pelas ruas. Aqui em Curitiba, por sua vez, existem as torcidas organizadas dos grandes clubes de futebol, que saem depredando ônibus e agredindo pessoas e as gangues que saem à noite e nos fins de semana para atos criminosos. As torcidas levam símbolos que dizem algo sobre violência.

A caveira, símbolo da morte, usada como escudo dos Fanáticos do Atlético é um sinal de violência. O roqueiro have metal, estilizado pelos adeptos da Império, principal torcida do Coritiba ou ainda o próprio nome de uma das maiores torcidas organizadas do Paraná Clube: Fúria, são igualmente símbolos da violência. Esses grupos querem demonstrar força, poder, domínio. É uma tentativa de verbalizar coisas que não conseguem mostrar livremente dentro de casa ou na sociedade. Um desenho onde foi interpretado o símbolo de autoridade na visão de um adolescente, aparece, atrás de uma escrivaninha um homem gigante, com os olhos esbugalhados e uma aparência extremamente autoritária, olhando para um menino, bem pequeno, ajoelhado e cabisbaixo. Toda vez que o jovem não vê possibilidades de progredir ele agride o meio que o frusta. Daí a necessidade dele viver sempre se agrupando, descobrindo o mundo aos “bandos”, como se um fortalecesse o outro, dentro de uma mesma filosofia.

Conseqüências mais comuns como a privação na vida familiar, que pode estar ligada ao desamor, a falta de atenção e a pouca convivência com os pais. A figura paterna, quase sempre, está associada a autoridade muito severa ou ainda à total liberdade, o que são extremos negativos. Atividades extras como o esporte, estudos ou até o trabalho podem contribuir para canalizar uma “sementinha” que existe em cada um deles. A filosofia popular “mente vazia é oficina do diabo”, é muito certa. Então é importante que os pais fiquem sempre muito alerta com os filhos, pois qualquer tipo de comportamento anormal ou diferente é o indício que alguma coisa está acontecendo. É importante ainda que os pais digam “não” de vez em quando, mas ao fazerem, precisam apresentar alternativas e ensinar o caminho mais correto. É muito importante observar os pequenos delitos. Esse é um tipo do comportamento que dificilmente cai de pára-quedas. Sempre há uma pré-disposição.

O ódio é um sentimento reprimido pela sociedade, mas é preciso tolerância para controlá-lo. Os pichadores e grafiteiros geralmente expressam conduta anti-social. É de se observar o interesse da juventude hoje pelos filmes de terror, que funcionam como uma espécie de descarga da ira. Todo cuidado deve ser tomado, pois até mesmo o estudo e o bom comportamento em demasia estressam as pessoas. O desarmamento, a valorização do papel da família, a escola, a música e a educação física são pontos primordiais para o bom desenvolvimento do caráter da juventude.

Não a ” filhinhos de papai”

É uma regra geral e não pode ser apontada como perfil oficial do delinqüente jovem. Quando o autor pertence a famílias de classes alta ou média, antes de ser fichado há a interferência de advogados, políticos e autoridades, que trabalham por “debaixo dos panos”, para preservar a imagem do adolescente e dos seus pais e familiares. Não é um fato isolado, mas foi confirmado pelas autoridades policiais do Instituto de Ação Social do Paraná, os quadros comparativos levantados pela entidade, com base em Curitiba. O IASP atende casos registrados na Região Metropolitana de Curitiba e adolescentes encaminhados por juizes de varas criminais do Interior do Paraná. São comuns advogados autoritários, políticos influentes e telefonemas até de Brasília para “limpar o nome de um jovem criminoso”.

No Centro Integrado do Adolescente Infrator o movimento é elevado. O número de detidos sempre supera o quadro de vagas existentes, mesmo com a rotatividade que obriga o Estatuto da Criança e do Adolescente, que obriga a solução para cada um dos casos num prazo de 45 dias. No entanto a reincidência é menor. Os jovens condenados passam por educandários, onde aprendem um ofício e têm atividades para o dia todo. O quadro de delinqüência é maior entre os rapazes, mas as moças “também aprontam”.

Perfil

Mesmo que não represente a realidade absoluta, o perfil do delinqüente adolescente é traçado pela ausência da família, da família desestruturada ou por famílias formadas apenas pela convivência de membros desgarrados de outras famílias. Há sempre, entre eles, o envolvimento com drogas, álcool, fumo, experiências negativas e condições sócio-econômicas desfavoráveis, como dificuldades até para comer e morar. Tudo isso é compromisso do Estado, da sociedade, mas que acabam ignorados.

Tudo começa pelo menino de rua, progredindo com as pequenas infrações e se acentuando com a cultura marginalizante em que sobrevivem. É em contato com outros garotos que já estiveram presos e que passam a ser para eles ídolos o alguém do qual dependem para segurança e vida mais “privilegiada”. A partir daí o grupo passa a exercer pressão sobre o menor que se vê impelido a cometer delitos sob pena de ser novamente rejeitado. A família desestruturada é onde esse problema se aprofunda. Leve-se em conta também a desestabilidade da sociedade, até o ponto do menino de rua não se institucionalizar mais como cidadão. A violência não tem origem genética e os modelos que hoje aí estão, são a imitação da sociedade.

Culpados

Há culpa e muito da mídia, da censura e até, mesmo que em escala bem menor, no papel da Igreja. A proibição e a limitação ao sexo foi exagerada e ainda perdura em alguns casos, mas as cenas com requintes de sadismo passam a todo o instante com total liberdade e estão até nos desenhos animados e vídeo games. É preciso fazer sérias restrições aos consagrados programas policiais, que geralmente trabalham com a fachada de moralização, mas que na realidade são uma verdadeira escola de agressividade, despejando o ódio e imagens que agridem as pessoas. Para ele isso tudo faz com as crianças principalmente e as pessoas em geral percam a sensibilidade e passem a conviver com fatos negativos, como se isso fosse normal.

Sobre os filhinhos de papai, não apenas a polícia, os órgãos de segurança, mas a própria justiça e a imprensa recebem pressões para evitar condenações e divulgação desses casos, acobertando uma grande incidência de crimes .

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