Do assentamento para a mesa dos consumidores

Cento e oito famílias, totalizando quatrocentos e cinqüenta pessoas, que sobrevivem da agricultura e da pecuária. Cada família possui um terreno que varia de dez a quinze hectares e o utiliza à sua maneira. Boa parte da produção é consumida pelos próprios trabalhadores e o restante é comercializado em feiras ou vendido para empresas maiores. O Assentamento do Contestado, na região da Lapa, é um dos exemplos de produtividade que está começando a se desenvolver entre os 229 assentamentos já estabelecidos no Paraná.

Vivendo como pequenos agricultores, eles desenvolvem várias frentes de produção, armazenando sementes de diversas culturas e aproveitando o máximo do solo. Milho, soja, feijão, arroz, hortaliças, frutas, mandioca e leite são apenas alguns exemplos do que é produzido nesses locais.

Os trabalhadores do Contestado estavam acampados na região há cinco anos, mas somente em 2002 foram assentados. Alguns deles trabalham em grupos, funcionando como pequenas cooperativas de produção. Nesses casos, a linha de cultivo é maior e conta com o uso do trator. Mas a maior parte atua individualmente, apostando na variedade de produção e no trabalho braçal, carpindo todo o terreno ou usando tração animal.

Os agricultores Celson José Chagas e Mário Sérgio Padilha vivem no assentamento e acreditam que, com uma assistência técnica maior, as linhas de produção poderiam se desenvolver.

Celson veio de Guarapuava quando o local ainda era um acampamento. Ele conta que sempre trabalhou com agricultura, mas nunca tinha um pedaço de terra próprio. ?Trabalhava na roça, mas não comandava o que queria produzir. Agora, depois de assentado, estou podendo organizar o que cultivar?, diz. Nessa época do ano, destaca Celson, a produção está desacelerada por causa das baixas temperaturas que influenciam diretamente no cultivo de grãos. Utilizando um carro de boi (tração animal) para arar a terra, Celson deixa preparado o espaço para o plantio. Segundo ele, o assentamento já conta com uma variedade de mais 100 sementes para cultivo. ?Depende da época do ano. Conforme as condições variam, a produção modifica?, completa.

Mário Sérgio, que foi criado na região da Lapa, aposta na comercialização do leite. Ele está finalizando um pequeno estábulo para que o trabalho seja simplificado e possa render mais. Todo o leite armazenado no assentamento é guardado em recipientes e resfriado em um dos barracões de estoque do local, até que os caminhões dos grandes laticínios da região busquem toda a produção. ?Apesar do custo, é vantajoso. Mas também produzo hortaliças e frutas para comercializar?, explica.

A força dos orgânicos

Um dos pontos mais importantes destacado pelos trabalhadores é o incentivo à produção orgânica, sem uso de herbicidas e agrotóxicos, não afetando o meio ambiente e diminuindo os riscos à saúde de quem planta. Apesar de ser uma prática recente, os agricultores apostam que este campo terá grande mercado nos próximos anos. ?Ano passado foi a primeira vez que tivemos assistência técnica, mas como o convênio com a Emater acabou, a colaboração acabou. Mesmo assim, nos viramos e desenvolvemos o que plantamos, dando mais espaço aos produtos orgânicos?, conta Celson.

Jelson Oliveira, secretário-executivo da Comissão Pastoral da Terra (CPT) no Paraná, informa que os produtos orgânicos fazem parte de um trabalho de agroecologia. Ele explica que o único empecilho para esse tipo de produto é o alto preço que se encontra nas redes de varejo. Para que a linha de produção agroecológica se torne comum, os pequenos produtores dos assentamentos receberam materiais de divulgação e informativos. ?Fizemos um processo de seleção de sementes nativas de vegetação e acreditamos que o desenvolvimento desse tipo de produção acontecerá rapidamente.

Isso já está mais concreto na região Central do Estado?, aponta Jelson. ?Além de abrirmos outra frente de produção para os trabalhadores, evitamos qualquer danificação ao meio ambiente, evitando erosões, contaminação com agrotóxicos ou plantações em locais de preservação?, frisa.

Incra promete ampliação da assistência técnica

A partir deste mês, segundo o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), a assistência técnica nos assentamentos deve crescer e se desenvolver, graças a um projeto que está sendo finalizado com apoio da Emater. Os técnicos do Incra estão realizando um levantamento em todos os assentamentos e de tudo o que é produzido nesses locais para poder saber a quantidade certa de técnicos que terá que disponibilizar. O diagnóstico também vai levantar o custo que cada produtor está tendo com a produção e a renda média de cada um.

?Não temos dados em relação a esses números porque nunca foi feito um levantamento. Se queremos desenvolver um trabalho sério, temos que começar organizando tudo?, destaca o superintendente do Incra no Paraná, Celso Lacerda.

Outros pontos destacados pelo superintendente é a aplicação do Plano de Recuperação dos Assentamentos (PRA), com melhoramentos nas estradas, e na instalação de água e luz das casas dos trabalhadores; e o desenvolvimento do plano de educação ambiental. O Incra subsidia cursos que são ministrados aos trabalhadores, para que apresentem cuidados com a questão ambiental, levando em conta os cuidados na hora da plantação.

Segundo o Incra, apenas 14 funcionários estão disponíveis para fazer a assistência técnica atualmente. ?Esse número é muito pequeno para atender todas as famílias assentadas. Por isso estamos trabalhando para que esse entrave possa ser solucionado?, afirma Lacerda.

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