Desobediência pode levar diretores do Ibama à prisão

O presidente do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), Marcus Luiz Barroso Barros, o diretor de Florestas do órgão, Antônio Carlos Hummel, e o coordenador geral de Florestas Nacionais e Reservas Equivalentes, Alberto da Costa Meira Filho, responderão por crime de desobediência de decisão judicial. Eles se negam a dar a autorização para que a empresa Moreira e Silva Indústria e Comércio de Madeiras, de Fazenda Rio Grande, exporte um carregamento de 931 m³ de mogno que está parado no Porto de Paranaguá desde novembro do ano passado. A empresa conseguiu o direito de exportar a madeira na Justiça.

A acusação de crime de desobediência consta no despacho da juíza Vera Lúcia Feil Ponciano, da 8.ª Vara Federal de Curitiba, expedido em 17 de fevereiro. A juíza encaminhou ofício informando o Juizado Especial Criminal, que analisa ainda esta semana o pedido de prisão. Segundo o despacho, os acusados se recusaram, por três vezes, a cumprir ordem judicial para fornecer à madeireira a autorização Cites. A atribuição desse documento cabe apenas à diretoria de Florestas do instituto. A licença estabelece os procedimentos para exportação e importação de produtos florestais de acordo com a Convenção sobre o Comércio Internacional de Espécies Ameaçadas, cuja sigla em inglês é Cites.

Depois das negativas do órgão, a Moreira e Silva pediu a prisão dos dirigentes, mas a juíza indeferiu o pedido, por entender que não é atribuição de juíza cível, apesar de reconhecer que houve o crime.

A assessoria de imprensa do Ibama informou que a legalidade do carregamento não está provada. ?Já ganhamos em todas as instâncias e o Ibama se recusa a conceder o que é de direito da empresa?, rebate o advogado Paulo Roberto Ferreira Silveira, que representa a madeireira. O órgão informou que ainda existe recurso no Superior Tribunal de Justiça (STJ) em Brasília.

O Ibama também está sendo multado diariamente em R$ 20 mil enquanto não conceder o Cites. Essa decisão foi dada pela juíza em 17 de dezembro do ano passado. A multa hoje está em R$ 1,3 milhão. Por esse motivo, os dirigentes também podem responder ao Tribunal de Contas da União (TCU) por causar multa a autarquia pública. Caso sejam considerados culpados por desobediência, os acusados podem ser detidos de quinze dias a seis meses, além de pagamento de multa.

Batalha jurídica teve início em 2001

O mogno em questão foi comprado em 2000 pela empresa paranaense da Serraria Marajoara Indústria e Comércio e Exportação, que, segundo o advogado Paulo Roberto Ferreira Silveira, tinha um Projeto de Manejo Florestal Sustentável (PMFS) e autorização do Ibama para explorar o produto. A Marajoara está envolvida em uma polêmica semelhante no Pará. Segundo o Ibama, um primeiro laudo confirmava que o mogno fora obtido dentro do PMFS. Mas um segundo laudo – emitido após a Moreira e Silva comprar a madeira – afirma que o mogno da Marajoara foi roubado de terras indígenas e áreas públicas. ?Esse é um problema do Ibama. Quando a Moreira e Silva comprou o mogno, ele era legal. Além disso, a briga aqui não é para derrubar mais nenhuma árvore, é para poder vender propriedade legal da empresa?, diz Silveira.

Em 2001, a Moreira e Silva beneficiou a madeira e fez um contrato para vender a uma empresa norte-americana. Em outubro daquele ano, o Ibama baixou a instrução normativa número 17, proibindo o corte, industrialização e comercialização da espécie, com efeito retroativo. Mesmo assim, a Moreira e Silva conseguiu um mandado de segurança para que pudesse concluir a venda. Começou aí a batalha jurídica que terminou com o pedido de prisão. ?Existem documentos em que o próprio Ibama comprova que o carregamento é legal?, explica o advogado. ?Tanto que ganhamos decisão favorável para comercializá-la em todas as instâncias.?

Depois do julgamento, que terminou em 2003, vencido pela empresa paranaense, o órgão recebeu diversas notificações para conceder as licenças necessárias para a exportação do carregamento. O Ibama no Paraná forneceu a Autorização de Transporte para Produto Florestal (ATPFs) para que a Moreira e Silva levasse a carga até Paranaguá. Em janeiro último, o Ibama baixou uma portaria dando poder apenas ao departamento de Florestas para fornecer o Cites, e negou a licença à Moreira e Silva, contrariando ordens judiciais.

Segundo Silveira, até mesmo a Procuradoria do Ibama teria aconselhado ao departamento de Florestas que fornecesse a licença. ?Não podemos suportar uma situação em que uma empresa luta na justiça, ganha, e o poder público não tem força para fazer cumprir o que foi determinado?, protesta. Silveira conta que, após a liberação, continuará a processar o Ibama, já que a Moreira e Silva teve perda com a variação cambial, houve depreciação do produto, e tem de pagar multas pelo tempo que a carga está parada no porto. ?Espero uma punição severa ao Ibama?, diz. A reportagem de O Estado tentou ouvir os dirigentes do órgão, por telefone, durante dois dias, mas a assessoria de imprensa informou que eles só teriam disponibilidade para comentar as acusações hoje. (DD)

Doação para ONG complica Marina

No ano passado, o Ibama fez uma doação de 6 mil toras de mogno apreendidos para a ONG Fase (Federação de Órgãos para a Assistência Social e Educacional). Esse processo acabou respingando na ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, já que seu marido, Fábio Vaz de Lima, é ex-secretário do influente Grupo de Trabalho Amazônico (GTA), um conglomerado de 200 ONGs que atua na Amazônia. A Fase é uma das integrantes do GTA. Houve denúncias de que a política de doação do Ibama seria uma forma de esquentar madeira ilegal extraída da Amazônia.

O próprio TCU condenou a doação, dizendo que ela foi promovida sem observar os princípios da isonomia, impessoalidade e publicidade. ?Ao menos nos elementos trazidos aos autos, não ficaram claros os motivos que levaram à escolha da Fase como donatária?, disse o relator do processo, ministro Humberto Souto ao Jornal do Brasil. Uma reportagem da revista Isto É denunciou superfaturamento num plano de manejo na Amazônia em reservas extrativistas feito pelo Conselho Nacional de Seringueiros – ONG com ligações estreitas com Fábio Vaz de Lima. (DD)

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