Londrina –
Gaudêncio Mazzer, 89 anos, é um dos convidados especiais da comemoração de 7 de Setembro, por ter contribuído com a construção da história de Londrina. A paixão pela música invadiu o agricultor há mais de seis décadas. Primeiro era um burro que levava o então iniciante instrumentista do sítio até o centro da cidade do interior de São Paulo, para tocar clarineta com sapateiros, açougueiros e outros colegas. Depois foram os pés e o rosto que ficaram vermelhos pela terra da Londrina, que o acolheu e lhe deu oportunidade de fazer das centenas de partituras que sabia tocar, uma profissão. Mal podia imaginar que, 53 anos depois, a contribuição prestada à construção da história do município seria reconhecida, formalmente.No desfile cívico deste 7 de Setembro, Gaudêncio Mazzer, 89, será um dos convidados especiais para a comemoração, que deve reunir no centro da cidade londrinenses de todas as idades, até daqueles que nem haviam nascido quando o músico fundou a Banda Municipal e ali permaneceu até o ano passado. “Em 1948 ensaiamos pela primeira vez e, um ano depois, fizemos nossa primeira apresentação. Uns músicos eram mais capacitados, outros menos, mas todo mundo se emocionou quando ouviu”. Foi assim que seo Gaudêncio começou a contar a história da formação da Banda Municipal que, ativa até hoje, embala todas as comemorações do município.
De forma saudosista e emocionada, o músico relembrou a primeira vez que se apresentou em Londrina, na escadaria lateral da Catedral Metropolitana, durante horas a fio. “Foi aquela alegria, um acontecimento que ninguém esperava naquele dia. Tinha muita gente naquele chão que ainda era de terra vermelha.” Músico da Banda Municipal por 53 anos, Mazzer resolveu interromper as atividades há pouco mais de um ano por falta de disposição. Segundo ele, as pernas já não estavam tão fortes. Aliado à energia gasta para tocar um instrumento de sopro, esse fato acabou comprometendo seu equilíbrio no palco. “Tenho bastante fôlego ainda, meu coração é forte também, mas depois de alguns minutos eu perco equilíbrio e saio do palanque parecendo bêbado”, brincou o músico, que também é um dos fundadores da Associação Comunitária de Idosos de Londrina (Acil).
Emoção
Hoje, seo Gaudêncio disse ficar emocionado quando ouve a Banda Municipal tocar sem a sua participação, já que marcou bons momentos em sua vida por mais de meio século. “Quando escuto minha banda, não consigo ficar olhando mais que 15 minutos. Apesar do meu coração ser forte eu não agüento muito.” A clarineta do músico está desmontada e ainda faltam algumas peças para consertar, mas suas atividades paralelas não foram interrompidas. Ele continua escrevendo músicas e partituras. Muitas histórias já foram vivenciadas pelo músico e seus companheiros. Algumas emocionantes, outras inusitadas, mas as mais lembradas por Mazzer são as engraçadas. Brincadeiras de criança eram escolhidas para descontrair o pessoal antes e até durante as apresentações. “Uma vez um músico da banda colocou pimenta, daquelas mais ardidas, nos nossos instrumentos. Todo mundo ficou vermelho de tanto que ardia e desesperado para tomar água”, contou, relembrando depois o dia em que um dos integrantes da banda amarrou o pé de todos os outros com cordas, para que levassem um tombo quando ficassem de pé.
Começou com sanfona
O primeiro contato de “seo” Gaudêncio com a música foi na adolescência, quando tocava sanfona junto com o pai em festas de casamento. “Ele tocava a principal e eu tocava uma mais simples. A gente fazia isso para ganhar um dinheirinho para a família, mas eu aproveitava e dançava bastante com as italianinhas que moravam lá em Sertãozinho (interior de São Paulo) e que também iam para as festas.” Depois, aos 23 anos, Mazzer, que trabalhava na roça, começou a conhecer os músicos com os quais formaria uma banda no interior de São Paulo. “Eu trabalhava até o sol desaparecer para depois montar no meu burro, chegar no centro da cidade e encontrar o pessoal.”
Depois de muitos anos, Gaudêncio Mazzer se mudou com a família para Londrina, onde conheceu Maria, que mais tarde viria a ser sua mulher, mãe de seus dois filhos e avó de seus seis netos e onde, hoje, recebe a homenagem em um dos dias mais importantes para a cidade. O patriotismo de uma nação é, para o músico, o dever de todo e qualquer cidadão. “Fiquei feliz demais quando recebi o convite para participar da comemoração, que é muito importante para o povo. Se estamos aqui, temos de honrar o dever de ser patriotas”, disse, enquanto discutia a situação política nacional atual como uma das conseqüências da falta desse sentimento. O músico londrinense será homenageado pela Prefeitura de Londrina como forma de agradecimento a todas as composições da Banda Municipal, conforme explicou a secretária municipal de Educação, Carme Baccaro Sposti. “Procuramos chamar alguns segmentos diferentes. Um deles é o dos músicos da Banda Municipal, que fundou o conjunto. Homenageando o seo Gaudêncio, estaremos estendendo a homenagem a toda a banda, que sempre nos acompanhou em todas as comemorações.”