Curitibanos falam das maiores lendas da cidade

A poucos dias de uma sexta-feira 13 em agosto, começam a circular entre as pessoas histórias sobrenaturais que mexem com o imaginário de Curitiba. São lendas e “causos”, passados de geração para geração, que dão um toque especial ao cotidiano da cidade. A fórmula basicamente é a mesma: muitos fantasmas, espíritos e mistérios.

A veracidade dos “causos” é questionada por muitos. Há aqueles, porém, que juram de pés juntos que eles realmente aconteceram. Luciana do Rocio Mallon, que faz poesias na internet sobre as lendas de Curitiba, se interessa por elas desde de criança e até hoje pesquisa fatos inusitados em várias regiões da cidade. Para ela, as histórias são verdadeiras, porque muitas pessoas contam com os mesmos detalhes. “Pessoas diferentes, de vários locais da cidade, contam a mesma coisa. Com certeza tem um fundo de verdade, apesar de acrescentarem informações cada vez que contam”, opina.

“As histórias falam quase sempre em espíritos e mortes, assuntos que ainda são desconhecidos e que despertam a curiosidade. Por causa disso, elas se espalham rapidamente.”

De acordo com o radialista Algaci Túlio, atualmente ocupando o cargo de coordenador do Procon/PR, a maioria das histórias surgiu há muitos anos, quando a cidade ainda era pequena e as pessoas não tinham tantas opções de lazer. “As lendas estão ligadas principalmente com cemitérios, lugares que as pessoas evitam passar. Muitas estão ligadas com crendices. O clima do local fazia com que sentissem medo, criando situações e aparições não reais”, comenta. “Eu não acredito e nem duvido. Já vi tantas coisas que não dá para dizer.”

O taxista César Bueno, que trabalha na área há 22 anos, explica que a noite é terreno fértil à criação das lendas. Várias histórias estão ligadas a taxistas. Segundo ele, percorrer sozinho as ruas de Curitiba pela madrugada, às vezes em locais por onde nunca passou, faz com que a imaginação tome conta do motorista.

Urbenauta

Eram essas histórias que o jornalista Eduardo Fenianos gostava de escutar enquanto percorria todas as ruas de Curitiba no projeto do Urbenauta, no qual viajou dentro da própria cidade. “Toda cidade tem seu folclore urbano, e acho que isso dá um tempero especial à vida dos cidadãos. Durante a viagem, eu preferia escutar os “causos” do que resgatar a história oficial. São eles que fazem a verdadeira história dos bairros”, acredita.

Santa Maria Bueno e a Loira Fantasma

As duas lendas mais conhecidas da cidade estão ligadas a dois cemitérios. A mais antiga é a história de Maria Bueno, chamada de Santa de Curitiba e que está enterrada no Cemitério Municipal São Francisco de Paula. Ela nasceu em Morretes, litoral do Paraná, no século XIX. Era a caçula da família, entre sete irmãs, e, reza a lenda, tinha poderes paranormais.

Ainda adolescente, mudou-se para Curitiba, a fim de cuidar de um casal de idosos, que acabou morrendo. Ficou sozinha e desamparada, quando decidiu trabalhar como lavadeira. O dinheiro, porém, não dava para nada. Maria foi parar em um bordel. Um soldado se apaixonou por ela e a proibiu de seguir no meretrício, mas ela não obedeceu. O rapaz se enfureceu e decapitou Maria Bueno. Dias depois, o assassino morreu da mesma forma.

Muitas pessoas acreditam que a santa realiza milagres. As paredes do túmulo e as do cemitério próximas ao local estão cheias de flores, velas e placas de agradecimento (datadas de diferentes épocas), pelas graças alcançadas.

Loira fantasma

A outra lenda conhecida pela população curitibana é a da loira fantasma. O taxista César Bueno conta que, na década de 1960, uma mulher loira muito bonita pedia uma corrida de táxi na Praça Tiradentes até o bairro do Abranches. Quando o motorista se tocava, ela não estava mais no carro. “Existe ainda uma outra versão dizendo que a loira pedia a viagem até o cemitério do Abranches. Quando chegava no local, ela pedia para o taxista aguardar um pouco. A mulher saía do veículo e entrava no cemitério, quando desaparecia”, relata Bueno.

Dizem também que a loira assustava os taxistas porque uma vez, quando ainda era viva, fez uma trágica viagem de táxi: durante a corrida, foi estuprada e morta pelo motorista. O seu espírito rondava o assassino e, um mês depois, entrou no mesmo táxi vestindo uma capa preta e escura. De repente, pediu que o carro parasse. Ela ordenou que o carro seguisse até o cemitério, onde era a sua morada. O taxista pediu para que não fizesse brincadeira com isso. Ela tirou a capa, mostrou o seu rosto e o motorista, ao reconhecê-la, teve um ataque de asma e morreu sufocado. O fantasma da loira, então, continuou assustando os taxistas.

A história da loira fantasma ganhou as páginas dos jornais e era tema de programas de rádio, depois de ter sido registrada na polícia. O radialista Algaci Túlio lembra que entrevistou o taxista atingido e uma mulher que seria a loira. “Como naquela época não havia muitas notícias, a gente aproveitava esses fatos para os programas e falávamos durante vários dias”, revela. A lenda também foi parar na televisão, depois que o radialista a transformou em uma telenovela no Canal 6.

O taxista Bueno acredita que a lenda da loira fantasma não passou de uma brincadeira entre colegas da profissão. “Eu mesmo já preguei várias peças. O motorista estava dormindo e eu abria a porta dando o comando de uma corrida. Ele, ainda meio desacordado, concordava com o cliente e saía. Somente depois via que não tinha ninguém no carro.”(JC)

Lenda da Gatta Preta

Um homem dançou na noite inteira com uma morena em um baile. Na hora de deixá-la em casa, esqueceu uma capa preta com ela. No dia seguinte, foi buscar o acessório, quando foi recebido pelos pais da garota. Eles informaram que a mulher estava morta há muito tempo e mostraram uma fotografia. Era exatamente a mesma pessoa com quem tinha dançado. Não satisfeito, foi acompanhado dos pais da morena até o cemitério onde está enterrada (São Francisco de Paula). A capa preta estava em cima de seu túmulo. A história, segundo o pedreiro Carlos Mendes de Freitas, foi confirmada por um familiar durante uma visita.

Lenda das Ruínas de São Francisco

As ruínas são o início da construção da Igreja São Francisco de Paula, em 1809, sendo um local envolto de mistérios. Conta-se que um tesouro pertencente ao pirata Zulmiro está enterrado entre os vestígios da obra. Depois de sua morte, vinha assustar as pessoas que tentassem se aproximar da sua fortuna.

Lenda da Noiva do Cemitério

Diziam que tinha uma noiva fantasma no Cemitério do Água Verde. A informação era constantemente noticiada nos jornais. Ela teria sido abandonada pelo noivo e morrido de desgosto. Os curitibanos solteiros desviam o cemitério nas noites de lua cheia, nova, minguante e crescente. Em uma dessas luas, Haroldo Perolla voltava da casa da namorada e esqueceu de evitar o local. Ele viu o véu da noiva tremulando no muro do cemitério. Teve preguiça em retornar e acabou se enchendo de coragem de enfrentar o desafio. Ao dar alguns passos, notou que o véu era o reflexo de uma página de jornal movimentado pelo vento.

Lenda do Cachorro de Três Patas

Conta-se a lenda que, quando o lobisomem não quer ficar com a forma de um ser humano e precisar caçar, se transforma em um cachorro de três patas. No bairro do Umbará, um grupo de moradores avistou um animal com essas características entrando em um galinheiro. Eles foram até o local e trancaram o cachorro no galinheiro. No dia seguinte, os vizinhos voltaram no local e notaram que o bicho tinha sumido. No galinheiro estava dormindo um padre, nu, que havia trabalhado na região.

Lenda da Santa Maria Polenta

Maria Polenta era conhecida em toda a cidade por suas curas milagrosas. Em uma ocasião, foi procurada por um jogador do Coritiba que havia quebrado a perna, uma fratura exposta, em um jogo de futebol. Ela se recusou a atendê-lo no princípio, mas devido a sua insistência, acabou “arrumando” a perna desde que o jogador procurasse um médico. Após alguns dias ele voltou e Maria Polenta questionou se ele tinha cumprido a promessa. Recebeu um não como resposta. De tanto insistir, o jogador finalmente procurou e o levou até a curandeira. O profissional queria saber o que ela havia feito para curar algo tão grave, já que na perna não tinha mais fratura nenhuma.

Lenda do Fantasma Suicida da Reitoria

Luciana do Rocio Mallon, baseando-se em depoimentos de funcionários da Universidade Federal do Paraná, conta que um estudante havia se apaixonado um por uma professora casada com um homem muito ciumento. O marido, desconfiado, pediu para a esposa não visse mais o aluno, que não aceitou o fim do relacionamento. Ele se jogou do décimo primeiro andar do prédio de Ciências Humanas da Reitoria. A partir deste dia, toda madrugada de sexta-feira pode-se ouvir a alma do aluno rondando a faculdade.

Lenda do Mendigo Macabro de Curitiba

Entre os anos de 1982 e 1986, foi muito divulgada uma história sobre um mendigo que batia no portão das casas impacientemente, até o morador atendê-lo. Com um bebê enrolado em um pano, o mendigo falava que precisava de esmola, informando para o morador dar o que podia. Caso não doasse, ele matava a criança naquele mesmo instante. O abordado dava o dinheiro temendo o pior. Quando recebia a esmola, o mendigo tirava a manta do bebê, que na verdade era uma boneca. Ele dizia que o morador era um covarde e desaparecia. Fala-se que o homem era a alma de um mendigo que viveu no século XIX e que carregava sempre uma boneca com ele. Mas após uma briga com um bandido, ficou ferido e acabou morrendo.

Lenda da Carona

O tio Jane e seus sobrinhos voltavam para casa depois de passarem pelo Capão Raso. A carroça seguia no ritmo do trote dos cavalos. De repente, viram um tal de Zé, que tinha fama de ser um lobisomem. Eles resolveram não parar para dar carona. A carroça continuou no seu destino. A estrada estava vazia e, até chegar no Umbará, eles não foram ultrapassados por ninguém. Quando alcançaram o local que queriam, se surpreenderam ao encontrar o tal Zé ao lado da igreja. Passaram a se questionar como ele tinha parado lá. Como resposta, disseram que era um comprovação de que o homem era realmente um lobisomem.

Lenda da Mansão do Batel

Segundo o taxista César Bueno, na década de 1950, uma mulher muito bonita pegou um táxi para percorrer vários cantos da cidade. Depois, ordenou ao taxista que se dirigisse para uma mansão do Batel. Ela entrou na casa e pediu para o motorista esperar do lado de fora, pois havia esquecido a carteira e iria pegá-la. O taxista, enquanto esperava, notou uma movimentação dentro da mansão. Aguardou meia hora, quando resolveu procurar a mulher. Bateu na porta e ninguém atendeu. Entrou na casa e notou que havia muitas pessoas em um velório. O motorista ficou procurando a cliente entre as pessoas que estavam ali. Ele aproveitou e deu uma olhada no caixão. O defunto era a mesma mulher que, pouco tempo antes, estava dentro do táxi.

Fonte: site www.usinadeletras.com.br; livros Umbará – do barro ao mar e Água Verde – o bairro da esperança, do jornalista Eduardo Fenianos; e depoimentos dos entrevistados.

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