Cheios de contas

Curitiba é a capital brasileira dos endividados

Os brasileiros nunca estiveram tão endividados. De acordo com o Banco Central (BC), em março as famílias do País deviam em média 43,99% de sua renda anual para instituições financeiras, o maior nível desde 2005. Problema que ganha dimensão ainda maior em Curitiba, apontada como a capital com maior número de devedores.

Segundo pesquisa da Federação do Comércio do Paraná (Fecomércio-PR), 86,4% das famílias curitibanas têm dívidas, a maioria com juros altíssimos, como as relativas a cartão de crédito. Dos 522.342 endividados, 130.608 estão com as contas atrasadas e 59.724 dizem não ter condições de pagar.

O dado do BC significa que os brasileiros devem aos bancos quase a metade do que ganham anualmente. “Nos países da Europa e Estados Unidos, esse número é maior. O problema é que aqui os juros são muito mais altos e estar endividado significa comprometer parte muito grande da renda com o pagamento desses juros”, avalia a professora Ana Paula Cherobim, coordenadora do Laboratório de Orçamento Familiar da Universidade Federal do Paraná (UFPR).

Comprometimento

O estudo da Fecomércio-PR aponta que os curitibanos endividados comprometem em média 32,1% de sua renda mensal com o pagamento das dívidas. A maior parte dos devedores (69,7%) compromete de 11% a 50% do que ganham por mês. Outros 19,6% gastam mais da metade do rendimento mensal para pagar as dívidas.

De acordo com o levantamento, 62,9% das famílias curitibanas endividadas têm débitos com cartões de crédito, que em média cobram juros de 192,94% ao ano. Outros 1,8% têm dívidas de cheque especial, com juros médios de 143,01% ao ano. Financiamento de automóveis é citado por 14,7% dos endividados.

Entre as famílias com renda mensal superior a 10 salários mínimos (R$ 6.780), a prestação do carro é apontada por 31,4% dos devedores. Já o financiamento imobiliário atinge 11,4%, independente da faixa de renda.

Freio no consumo

Reprodução
Compra à vista é melhor.

A inflação em alta está fazendo o consumidor pisar no freio, maneirar nas compras e organizar as contas. Esta é a avaliação do presidente da Câmara dos Dirigentes Lojistas (CDL) de Curitiba, André Luiz Pellizzaro, com base no indicador mensal do SPC Brasil.

Em maio, o índice registrou aumento de 2,24% nas vendas do comércio e de 1,97% na inadimplência, em relação ao mesmo período do ano passado. São os menores patamares de crescimento registrados desde janeiro de 2012.

A inflação registrada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) nos últimos 12 meses foi 6,5% em maio, no limite da meta definida pelo governo federal.

“A inflação compromete o poder de compra dos salários. Por isso, as famílias estão consumindo menos e buscando colocar as dívidas em dia”, afirma Pellizzaro.

Sempre que os preços sobem muito, o remédio do governo é aumentar a taxa de juros, mais um fator que inibe o consumo. Tendência apontada também pela Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC).

Segundo pesquisa da entidade, o índice que mede a intenção de consumo das famílias em maio caiu 2,2% em relação ao mês anterior e 6,2% na comparação com o mesmo mês de 2012.

Planilha

Com um cenário incerto na economia, Pellizzaro recomenda prudência ao consumidor. “A orientação é para priorizar as compras à vista e fazer uma planilha de gastos para controlar o orçamento doméstico”, ressalta.

Crédito fáci,l é o problema

Arquivo

“As dívidas com cartão de crédito e cheque especial são as piores. É o crédito fácil de ser adquirido, que os bancos empurram para os clientes. As pessoas usam e descontrolam suas despesas”, analisaa professora Ana Paula Cherobim (foto).

Para ela, o alto nível de endividamento dos brasileiros é um dado preocupante. “É problema porque cresceu muito rápido, sem que a população tenha a devida educação financeira para administrar isso. Desde o governo Lula, o País liberou muito crédito, na estratégia de crescimento através do consumo. A renda das famílias aumentou, mas o endividamento cresceu demais”, avalia.

Renegociação é a dica pra limpar o nome

Segundo a Fecomércio-PR, 25% das famílias de Curitiba têm dívidas vencidas. Ou seja, estão inadimplentes e, provavelmente, com um ou mais membros com nome sujo na praça.

Para essas pessoas, a principal orientação é não ter receio de procurar o credor para renegociar. E também reforçar o controle orçamentário, para sair logo do vermelho.

Dos 130.608 curitibanos inadimplentes, 41,4% estão com as contas atrasadas há mais de 90 dias. Para outros 37,2%, o atraso é de até 30 dias. Entre os endividados, 46,7% estão comprometidos por mais de um ano com pagamento de prestações.

A supervisora de serviços da Associação Comercial do Paraná (ACP), Simone Scuissatto, diz que a alta oferta de crédito exige maior rigor nas contas domésticas.

“As pessoas estão tendo dificuldade para controlar os gastos. Bancos e lojas oferecem cartões o tempo todo, o consumidor vai utilizando e, quando percebe, está endividado em excesso”, afirma. “A principal dica para não ficar com o nome sujo é ter organização e planejar os gastos, anotando tudo em uma agenda ou no computador”.

Inadimplência

A ACP entrevistou, em março, abril e maio, 1.300 consumidores inadimplentes, com o nome registrado no Serviço Central de Proteção ao Crédito (SCPC). O valor médio das dívidas varia de R$ 50 a R$ 200. A maioria são mulheres (59%), entre 21 a 60 anos.

“A inadimplência vem crescendo na faixa etária de 50 anos para cima, principalmente pelo empréstimo do nome. Geralmente são compras para outras pessoas da família, que já estão com restrições de crédito”, diz Simone.

Os principais motivos para a inadimplência, segundo a ACP, são: desemprego (34%), descontrole dos gastos (20%) e empréstimo do nome (19%). 41% dos devedores estão seguindo a dica de renegociar os débitos, enquanto 32% pretendem empurrar com a barriga e pagar quanto tiver disponibilidade.

Marco André Lima
Controle é importante pra sair do vermelho.