Bebês podem ser tratados dentro da barriga da mãe

Bebês que ainda não nasceram e com problemas de má formação já podem ser submetidos a tratamentos médicos dentro da barriga da mãe. Devido aos avanços na área da Obstetrícia, diversas crianças têm sido salvas ou tido a qualidade de vida assegurada por procedimentos intrauterinos. Isto acontece graças à Medicina Fetal, que nos últimos anos tem se desenvolvido de forma bastante rápida tanto no Brasil quanto no resto do mundo.

A Medicina Fetal é um ramo da Obstetrícia e está ligada ao exame pré-natal realizado pelas gestantes. Ela atua em três frentes: prevenção, diagnóstico e tratamento. “Em Curitiba, a Medicina Fetal começou a se desenvolver de maneira mais rápida a partir do final da década de noventa, tendo como ápice os dias de hoje”, informa o obstetra do Instituto de Medicina Fetal (IMMEF), com sede na capital paranaense, Claudio Correa Gomes.

Antes do ano 2000, as mulheres grávidas eram submetidas apenas ao ultrassom obstétrico normal. Hoje, em função dos avanços científicos, já existem equipamentos de ultrassom com tecnologia tridimensional, não estático. “Com este aparelho, é possível visualizar, em tempo real, tudo o que o bebê faz dentro da barriga da mãe. Com isso, podemos detectar, de forma bastante precoce, eventuais alterações no feto”, afirma.

Entre a décima segunda e a décima quarta semana de gestação, pode-se fazer uma avaliação morfológica do feto. Esta permite, por ultrassom transvaginal ou abdominal, identificar sinais de alterações genéticas cromossômicas através do tamanho da nuca da criança, da presença do osso do nariz e do fluxo da valva do coração. O procedimento é conhecido como avaliação da translucência nucal.

“O diagnóstico precoce permite à equipe médica dar um melhor encaminhamento ao problema, seja ele simples ou grave. Isto faz toda a diferença no manejo inicial do bebê, evitando procedimentos como transferência hospitalar, por exemplo, que podem colocar a vida da criança em risco. Além disso, o fato de um problema ser diagnosticado ainda durante a gestação faz com que a mãe esteja mais preparada psicologicamente para enfrentá-lo, evitando surpresas desagradáveis no momento do parto”, comenta o cirurgião-pediatra do setor de Medicina Fetal do Hospital de Clínicas (HC) da Universidade Federal do Paraná (UFPR), Marcelo Stegani.

Intervenção intrauterina

Em alguns casos, além de preparar a equipe médica e os pais para a chegada do bebê, a Medicina Fetal também já possibilita a realização de intervenções intrauterinas na criança. Desta forma, os problemas podem ser corrigidos com a criança ainda dentro da barriga da mãe, sem grandes riscos para ambos. “Existem poucos casos em que os procedimentos intrauterinos são indicados. Geralmente, eles são eventos considerados raros. Mesmo assim, no HC, já realizamos diversos tratamentos com sucesso”, declara o médico responsável pelo setor de Medicina Fetal, Rafael Frederico Bruns.

Um dos tratamentos intrauterinos mais comuns é a transfusão de sangue para o feto. De acordo com Bruns, ela é realizada quando há incompatibilidade entre o sangue da mãe (RH negativo) e do bebê (RH positivo). Nestes casos, a criança desenvolve anemia e, na vigésima quarta semana de gestação, precisa de transfusão para não ir a óbito. “Introduzimos uma agulha até o cordão umbilical, com auxílio de ultrassom, e levamos sangue para dentro”, diz.

Segundo Claudio Correa Gomes, a transfusão também pode se fazer necessária em gestações gemelares univitelínicas (de gêmeos idênticos). “Pode acontecer de um dos bebês pegar mais nutrientes da placenta, que é única, do que o outro. Isto não é bom nem para a crianç,a que pega mais nutrientes, que pode ter o coração sobrecarregado, nem para a outra, que pode ficar desnutrida. Quando isto acontece, deve-se separar a circulação entre os dois fetos através de cirurgia a laser intrauterina”.

No HC e no Hospital Evangélico, também foram realizados, intraútero, procedimentos de derivação vísico-amniótica, em bebês com obstrução urinária baixa. “Foi realizado um procedimento do tipo no HC e outro no Evangélico. Quando há obstrução, a bexiga e o rim da criança ficam muito distendidos. Então, perto da vigésima semana de gestação, deve-se colocar um dreno entre a bexiga e o líquido amniótico. Se isto não for feito, a criança vai nascer com insuficiência renal grave”, esclarece Rafael. (CV)

Exemplo mostra sucesso

A auxiliar administrativa Ana Paola Momberger, de 30 anos, é mãe de dois meninos. O primeiro está com um ano e quatro meses de idade e o segundo tem apenas dois meses de vida. Ambos são crianças normais e saudáveis. Porém, na gravidez do filho mais novo, Ana passou por diversas angústias.

Na trigésima terceira semana de gestação, os médicos descobriram que a criança estava com anemia profunda. Ana conta que o problema foi identificado em uma terça-feira e, dois dias depois, foi preciso fazer uma transfusão de sangue intrauterina. Apesar das preocupações que causou à mãe, o procedimento foi considerado um sucesso.

“Meu filho nasceu de sete meses e meio e pesando 2,5 quilos. Após o parto, ele teve que ficar dezessete dias na UTI (Unidade de Terapia Intensiva) e precisou de mais duas transfusões de sangue. Entretanto, se a transfusão intrauterina não tivesse sido realizada, ele não teria sobrevivido. Hoje, é uma criança saudável, feliz e que vem ganhando peso normalmente”, conta Ana. (CV)