Após o vendaval, dia de muito trabalho

O dia de ontem ainda foi de muita confusão na capital paranaense. Depois da chuva forte, acompanhada de ventos e granizos, que caiu na tarde de domingo, boa parte a cidade amanheceu parecendo estar virada do avesso. Milhares de pessoas passaram o dia tirando pedras de gelo de seus quintais, recolhendo galhos de árvores, verificando destelhamentos, desentupindo bueiros e secando móveis, roupas e eletrodomésticos. Vários bairros permaneceram sem energia elétrica e sem telefone.

No Colégio Estadual Bom Pastor, na Vista Alegre, assim como em outras escolas de Curitiba, as aulas tiveram que ser suspensas devido aos estragos causados pelo vendaval. No domingo, quando a chuva forte começou, estava acontecendo uma festa julina no estabelecimento. “Foi horrível! O barulho do granizo batendo no telhado do colégio era intenso e muitas crianças ficaram assustadas. Parecia que o céu estava caindo em cima da gente”, comentou a auxiliar de serviços gerais, Sônia Inês Quitério.

Os funcionários do colégio acreditam que vão levar uma semana para arrumar toda a bagunça e calcular os prejuízos causados pela chuva. “Telhas voaram do telhado, enfeites da festa foram destruídos, o chão ficou alagado e muitas coisas ficaram molhadas. Tivemos que interromper a festa e hoje (ontem) cancelar as aulas”, disse a auxiliar.

Em Santa Felicidade, houve muitas quedas de árvores. A Avenida Manoel Ribas e a Via Vêneto, que levam aos restaurantes italianos, em diversos pontos estavam tomadas de galhos. Na Rua Ângelo Domingos Durigan, no bairro Cascatinha, galhos de uma araucária caíram sobre a fiação elétrica em frente a uma panificadora e um salão de beleza. Um poste foi derrubado e muita gente ficou assustada. “O vento jogou o galho em cima dos fios elétricos e do poste, que logo começou a despencar. O salão ficou todo alagado, sem luz e sem telefone”, contou a proprietária, Linda Alves de Lima.

Mercês

Nas Mercês, um dos bairros mais atingidas, quatro ruas tiveram que ser parcialmente interditadas por agentes da Diretran (Diretoria de Trânsito) ontem de manhã: Rosa Saporski, Desembargador Vieira Cavalcanti, Mamoré e Tenente João Gomes da Silva. Em todas, o granizo ainda não havia derretido e formava uma camada de mais de trinta centímetros sobre o solo, impedindo a passagem dos carros. A dona-de-casa Abigail Santos Zanocini, moradora da Rua João Gomes da Silva, não pôde sair de casa devido ao gelo que se acumulava em frente ao portão de sua casa.

“Hoje (ontem), todo mundo teve que ir trabalhar de ônibus, pois foi impossível tirar o carro de casa. Algumas pessoas retiraram o gelo da rua para desimpedir o fluxo de veículos e o jogaram sobre a calçada. Na frente de minha casa formou-se uma montanha e está difícil até de abrir o portão. Não consigo nem imaginar quantos dias serão necessários para que tudo volte ao normal”, declarou. A casa de Abigail ficou alagada. Ela e a família tiveram que passar a madrugada de domingo para segunda-feira na casa de parentes.

A propriedade do motorista Cléverson Ferreti, na Desembargador Vieira Cavalcanti, foi totalmente tomada pelo granizo. Dois muros foram destruídos e uma porta foi derrubada pelo vento e pelas pedras de gelo. Ontem, Cleverson faltou ao serviço e, utilizando baldes, vassouras e enxadas, tentava tirar o gelo que se acumulou em camadas de cerca de 50 cm dentro de seu terreno e de sua casa, que também estava sem energia elétrica e telefone. “Nunca vi nada igual. Minha casa ficou coberta de gelo em menos de dez minutos. Vou levar dias para conseguir arrumar tudo e não sei quanto tempo o gelo vai levar para derreter totalmente” comentou.

Também nas Mercês, na Rua Raquel Prado, uma araucária caiu sobre a residência da dona-de-casa Regina Goralervski, destruindo quase todo o telhado. Ontem, por volta das 9h30, ela, o filho e o marido esperavam a chegada do Corpo de Bombeiros, que foi chamado às 18h. “Vamos lutar para receber uma indenização por parte da Prefeitura. Há anos estávamos tentando, sem sucesso, para conseguir uma autorização para cortar o pinheiro que estava em frente à nossa casa, pois já estávamos prevendo que ele poderia cair sobre o telhado. Demorou, mas nossa previsão estava correta”, declarou.

Bairros mais atingidos

Também foram bastante atingidos pelo temporal os bairros do Pilarzinho, Bigorrilho, São Brás, Ahú, Abranches, Jardim Social, Hugo Lange, Tarumã, Tanguá, Bom Retiro e Centro.

Das 18h de domingo às 11h30 de ontem, o Corpo de Bombeiros já havia atendido a 250 ocorrências. Muitas equipes passaram toda a madrugada trabalhando.

Escolas e hospitais danificados

Atingido pelo temporal de domingo, o Hospital Cajuru, em Curitiba, voltou a atender ontem, mas com algumas restrições. Duas salas do centro cirúrgico – das seis disponíveis no hospital -, além de vinte leitos do posto 8 – localizados no terceiro andar do prédio – continuam interditados, sem previsão de data para reabrir. A direção do hospital estima que nas 24 horas em que se manteve fechado, cerca de 400 pacientes deixaram de ser atendidos. Essa foi a primeira vez que o estabelecimento fechou as portas desde 1977, quando foi comprado pela Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUCPR).

O Pronto-Socorro voltou a funcionar ontem por volta das 16h30, depois da liberação por parte da Comissão de Infecção Hospitalar. De acordo com a diretora-geral do hospital, Maria Júlia Trevisan, o Cajuru reabriu com 80% da capacidade. “A gente tem que verificar se o tomógrafo está funcionando. Além disso, os vinte leitos interditados não vão ser liberados tão cedo, porque dependem de obras”, comentou a diretora. O temporal atingiu 68 dos 360 leitos do hospital.

O alagamento foi causado pelo granizo que entrou nas calhas e dutos, entupindo tudo. “Entrou água por cima do forro e pelo telhado”, informou Maria Júlia. Os pacientes que chegavam ao Hospital Cajuru eram encaminhados ao Hospital do Trabalhador e Evangélico. O Hospital Nossa Senhora das Graças, nas Mercês, e o Evangélico, no Bigorrilho, também foram atingidos, mas com prejuízos menores.

Escolas

Onze escolas da rede estadual localizadas em Curitiba sofreram danos com o temporal de domingo. São elas: escola Amâncio Moro, em Santa Felicidade; Guido Straube, no Pilarzinho; São Francisco de Assis, Mercês; Bom Pastor, Vista Alegre; Cecília Meireles, Tarumã; Maria Aguiar Teixeira, Cajuru; Ângelo Trevisan, Cascatinha; Ninfa, Vista Alegre; Paulo Leminski, Tarumã; Aline Pichet, Ahú; Senador Manoel Alencar Guimarães, Mercês e República do Uruguai, no Cajuru. De acordo com a presidente da Instituto de Desenvolvimento Educacional do Paraná (Fundepar), Sandra Turras, engenheiros do Fundepar e do Decom estariam reunidos ontem para discutir as providências que seriam tomadas. Ela não descartou a possibilidade de alguns colégios serem interditados para reparar os danos. (Lyrian Saiki)

Tempestade típica de época quente

Segundo o meteorologista Marco Antonio Rodrigues Jucevicius, do Instituto Tecnológico Simepar, o motivo da forte tempestade ocorrida na tarde de domingo foi a entrada de uma frente fria no Paraná. As nuvens de tempestade, que causaram muitos estragos na capital, se formaram na região de Ponta Grossa, duas ou três horas antes de atingir a Região Metropolitana de Curitiba. “A chuva não teve características de um tornado e sim de uma tempestade muito forte”, avaliou.

Os medidores do Simepar, localizados no Jardim das Américas, marcaram ventos de até 58 km por hora quando o normal é 36 a 40 km/hora e, um total de 29 milímetros de água, ou seja, 1/3 que deveria chover neste mês. “Desde o dia 10 de junho não passava uma frente fria com condições para formar nuvens de chuva no Estado”, explicou o meteorologista. De acordo com o Simepar, a última tempestade com características semelhantes, foi registado no dia 5 de maio deste ano, porém com menor intensidade de ventos. “A forte tempestade deste domingo é predominante na primavera e verão, não no inverno como aconteceu”, estranhou Jucevicius. Segundo a Simepar, a previsão para os próximos dias é chuva leve na capital e Região Metropolitana.

50 semáforos ficaram sem funcionar

A chuva deixou 108 cruzamentos semaforizados desligados na principalmente área central (Bigorrilho, Mercês e Alto da XV). Numa primeira avaliação feita pela Diretran, cerca de 50 equipamentos danificados já estão sendo reparados.

O principal problema foi a falta de energia elétrica. Houve bloqueios com árvores de quinze ruas nos bairros de Santa Felicidade, Mercês, Alto da XV e Santo Inácio.

Para garantir o atendimentos dos motoristas no trânsito, a Diretran quintuplicou o número de agentes que normalmente atuam nos domingos. Trinta e quatro agentes municipais estiveram nas ruas até 1h da manhã para orientar os motoristas e garantir segurança no trânsito.

Os agentes precisaram tirar árvores das vias e desobstruir bueiros onde havia granizo.

A Diretran alerta os motoristas que, em situações como a que ocorreu anteontem, façam apenas os deslocamentos absolutamente necessários e que controlem a velocidade, já que crescem as situações de risco em momentos de chuva forte.

205 mil casas ficaram sem luz

Um efetivo de cinqüenta equipes de atendimento a emergências da Copel trabalhou ontem para recompor as redes elétricas, seriamente avariadas por queda de árvores e descargas atmosféricas em diferentes pontos de Curitiba. Nos municípios vizinhos, outras quarenta equipes faziam trabalho idêntico. Cerca de 13 mil endereços na capital e mais 3 mil em municípios da Região Metropolitana e litoral ainda aguardavam pela volta da eletricidade, 24 horas depois do pior temporal registrado pela Copel na região de Curitiba nos últimos dois anos.

A previsão da companhia era normalizar todo o sistema de distribuição ainda durante a noite de segunda-feira. “Comparativamente a uma situação de emergência como as que enfrentamos depois de um temporal mais severo, este vendaval provocou danos duas vezes maiores”, avaliou o superintendente regional de distribuição da Copel em Curitiba, Murilo Batista Junior.

A tempestade que varreu a região provocou desligamentos em 205 mil domicílios, sendo 110 mil apenas em Curitiba. Para a maior parte deles, os serviços foram restabelecidos no prazo de algumas horas. Os demais casos dependiam de reparos mais demorados: até as 16h de ontem, a Copel havia substituído onze postes quebrados, reconstituído mais de cem vãos de rede elétrica e substituído três transformadores queimados por raios.

Dos 150 circuitos alimentadores em alta tensão que abastecem a capital, trinta foram atingidos com diferentes graus de severidade. As ocorrências mais sérias concentraram-se nos bairros das regiões Oeste e Norte, onde muitas árvores caíram sobre a rede elétrica. Devido à complexidade do serviço, esse tipo de reparo demanda mais tempo para ser solucionado.

Anteontem, o serviço de atendimento telefônico da Copel recebeu perto de 90 mil ligações, um volume bem superior à média de 5 mil chamadas dominicais recebidas em situação normal.

Os ventos também derrubaram três estruturas metálicas da linha de transmissão que liga as subestações Bateias e Ponta Grossa/Sul: o incidente não deve prejudicar a operação do sistema elétrico da Copel e o trabalho de reconstrução terminará no sábado (12).

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