Apesar da normalidade atual, caos ronda aeroportos no País

A situação pós-caos aéreo, sentido na pele pelos brasileiros entre os últimos meses de 2006 e estendendo-se até meados do ano passado, parece controlada no Brasil. A Agência Nacional de Aviação Civil (Anac) atribui a diminuição dos atrasos e cancelamentos ao rigor das fiscalizações. O Centro de Gerenciamento de Navegação Aérea (CGNA), do Departamento de Controle do Espaço Aéreo (Decea) da Aeronáutica, acredita que mudanças na distribuição de vôos, aliadas ao rigor na concessão do espaço aéreo, também contribuíram. Já o sindicato que representa as empresas aéreas e dos aeroviários vê na resolução do problema uma medida temporária, temendo que o caos volte a assombrar os aeroportos brasileiros.

A diminuição nos atrasos e cancelamentos pode ser evidenciada se observada a evolução entre o ano passado e este ano no Aeroporto Internacional Afonso Pena, em São José dos Pinhais, na Região Metropolitana de Curitiba. Segundo levantamentos da Infraero, em julho de 2007, 48,1% dos vôos previstos tiveram atrasos superiores a uma hora ou foram cancelados. Este número caiu em média pela metade nos meses seguintes, passando a 24% (agosto), 25,4% (setembro), 21,2% (outubro), 24,7% (novembro) e 29,1% em dezembro. Na entrada de 2008, a queda foi ainda mais substancial, passando a 14,4% em janeiro, 13% em fevereiro e mantendo essa mesma média no mês passado.

Somado a isso, o aeroporto vem apresentando aumento da demanda de aeronaves e passageiros. De acordo com a Infraero, em 2006, um total de 56.934 aeronaves transitaram pelo aeroporto, somando pousos e decolagens, transportando 3.532.234 passageiros. Em 2007, o número de aviões passou a 62.563, e o de passageiros, a 3.907.275. Nos dois primeiros meses deste ano, a soma de 10.899 aeronaves e 651.275 passageiros circulando pelo Afonso Pena ultrapassa a quantidade de janeiro e fevereiro do ano passado, de 9.363 aviões e 545.650 passageiros.

A Anac atribui a diminuição a iniciativas como a Operação Hora Certa, que fiscalizou aeroportos, aeronaves e empresas em janeiro e resultou em cerca de 380 relatórios e mais de uma centena de irregularidades encontradas nos aviões em vôo e em inspeções de rampa (com a aeronave em solo, pronta para voar). De acordo com a agência, outra medida que deve auxiliar na pontualidade é a mudança de critério para análise de atrasos. Antes, os mesmos eram contabilizados a partir de 60 minutos. Esse tempo foi reduzido a 45 minutos a partir do primeiro dia deste mês e passará a 30 minutos em 1.º de maio. O referencial de atrasos, para a agência, é um indicador que permite avaliar a performance da aviação.

Ainda falta planejamento

Apesar da normalidade, há quem tema que o Brasil volte a viver um colapso nos ares. Para o presidente do Sindicato Nacional das Empresas Aeroviárias (SNEA), José Marcio Mollo, o auge da crise está apenas adiado. ?Hoje a aviação está bem. Teve ajuda do tempo nas festas de fim de ano, houve readequação da malha aérea por parte das empresas e melhorou o diálogo com o governo. Mas, no nosso entender, o problema de investimento em infra-estrutura do setor não foi resolvido.?

Em contrapartida, o setor continua em ascensão. ?Entre 2004 e 2007, o número de passageiros praticamente dobrou. O setor cresce há anos, favorecido pela oferta de vôos e passagens baratas.? Até 2012, devem entrar no Brasil 350 novas aeronaves, entre comerciais e executivas, segundo o sindicato. A presidente do Sindicato Nacional dos Aeroviários (SNA), Graziella Baggio, acredita que a situação, normalizada no momento, teve a ver também com a mobilização nacional alavancada pelos dois grandes acidentes aéreos da aviação comercial entre 2006 e 2007: a queda do Boeing da Gol e do Airbus da TAM. ?Isso levou a sociedade a participar mais dos assuntos do setor e também a exigir das autoridades maior empenho e observância nas regras e legislações da segurança da aviação.?, diz. ?Mas o que podemos concluir inicialmente é falta de um plano aeroviário, com a capacidade de atender a demanda que nos últimos cinco anos cresceu em 75% e que deve crescer ainda outro tanto, caso a economia continue estabilizada e mantida a concorrência?, contrapõe.

Para Baggio, se o planejamento se concretizasse, as demais cidades e capitais poderiam ser mais bem atendidas e teriam maior participação no que tange à aviação (hoje, para se ter uma idéia, 40% das passagens vendidas têm como origem ou destino São Paulo, segundo o Sindicato das Empresas Aeroviárias). ?Todo este diagnóstico foi feito em 2003 e aprovado no CONAC (Conselho de Aviação Civil), mas não foi implementado. Agora, temos que correr contra o tempo. O setor requer planejamento de médio e longo prazo e teremos que ter muita paciência, investir na fiscalização e no fiel cumprimento dos mandamentos de segurança de vôo?, conclui. (LM)

Vôos migram de SP para o Afonso Pena

Foto: Valter Campanato/ABr
Congonhas: vôos com conexões e escalas foram remanejados para outros aeroportos.

O crescimento do tráfego aéreo no País ano passado, de 10,7%, foi seguido em aeroportos como o Afonso Pena, onde o trânsito de aeronaves aumentou em 9,8% entre 2006 e 2007. Se de alguma forma as restrições e o conseqüente remanejamento de conexões e escalas em Congonhas, em julho do ano passado, poderiam atingir o Afonso Pena, nem representantes das empresas, nem as autoridades do setor confirmam a informação. Mas o fato é que o fluxo de aviões e passageiros no aeroporto paranaense cresceu desde então, acompanhado de um substancial aumento nas conexões.
De acordo com os dados de 2007 da Infraero, o ápice dos últimos dois anos em número de aeronaves (5.854) e passageiros (393.087) foi atingido em outubro no Afonso Pena. Coincidentemente, o mesmo mês em que o número de conexões no aeroporto registrou um aumento de cerca de 150% em relação ao mês anterior: se em setembro eram 11.791 conexões, e os meses anteriores atingiram o máximo de 17,4 mil, em outubro as conexões passaram a 28.601, variando posteriormente entre 22,8 mil e 25 mil até fevereiro deste ano.

Embora na época das mudanças em Congonhas tenha-se previsto de que outros aeroportos, inclusive o de Curitiba, poderiam se transformar em ?centros de distribuição?, de fato foi Guarulhos que ficou mais sobrecarregado. Assim, ninguém explica esse aumento no Afonso Pena. A Infraero não forneceu entrevista sobre o assunto. A Anac afirma que esse planejamento diz respeito às empresas. O Sindicato das Empresas Aeroviárias, por sua vez, explica que os remanejamentos de Congonhas afetaram principalmente Guarulhos (SP) e que houve algum momento no Galeão (RJ), mas não em Curitiba, o que é confirmado pela TAM, informando que ?com as reformulações da malha aérea em Congonhas, alguns vôos com conexões e escalas foram remanejados para outros aeroportos, porém não houve mudanças nas operações em Curitiba?. A companhia aérea GOL também foi consultada, mas preferiu se manifestar apenas por meio do sindicato.

Se essa área do planejamento operacional movimentou ainda mais o aeroporto, é provável. Mas não interferiu significativamente no número de aeronaves circulando, o que variou entre 5,1 mil e 5,7 mil nos meses posteriores, até fevereiro deste ano.
Esse fluxo, de acordo com o Centro de Gerenciamento de Navegação Aérea (CGNA), está de acordo com a capacidade do aeroporto. Segundo o chefe do centro, tenente-coronel Gustavo Adolfo Camargo de Oliveira, o Afonso Pena tem capacidade para operar até 38 aeronaves por hora. Nos horários de pico, principalmente entre 12h e 13h, chega a 28 (ou 73,6% da capacidade).
O intervalo entre uma operação (pouso ou decolagem) e outra pode chegar a até dois minutos, um tempo que parece curto para quem observa os aviões chegando e saindo do terminal, mas que, segundo Oliveira, está dentro dos padrões, levando-se em conta critérios como a alternância entre pousos e decolagens, tamanho da pista e o porte das aeronaves.

Aeroportos ?monitorados?

O chefe do CGNA afirma que os únicos aeroportos que operam acima de 80% da capacidade são os de Congonhas e Guarulhos (SP), Juscelino Kubitschek, em Brasília (DF), e o Galeão, no Rio de Janeiro. Quando essa percentagem é atingida, as ações da Aeronáutica definem o aeroporto como ?monitorado?. ?Todas as operações passam a constar em planilhas com os respectivos horários, podendo operar com um intervalo entre 5 e 15 minutos de diferença em relação ao previsto.? No entanto, apesar da descentralização promovida em Congonhas ano passado, com o retorno de boa parte das operações este ano, o aeroporto já está na escala acima de ?monitorado?, passando a ser classificado como ?coordenado? pela Aeronáutica. ?Nos monitorados a rigidez é aplicada apenas para os vôos regulares. Os demais têm flexibilidade. No coordenado, todo mundo tem de ter slot de decolagem?, explica. Ou seja, é preciso entrar previamente em contato com o comando local para solicitar horário para pousar ou decolar, uma vez que Congonhas tem demanda acima de 100% da capacidade. Torna-se, assim, um aeroporto que só funciona com hora marcada. Ainda sem a prometida terceira pista e com duas outras que não podem ser bem utilizadas simultaneamente, devido à proximidade, Congonhas é a expressão da centralização da demanda na região central de São Paulo e de um tipo de estrutura que já não cabe nas proporções de um mercado como a aviação, que pede aeroportos com maiores pistas, longe dos centros urbanos. ?Culpam as empresas por essa situação, mas a verdade é que quem elege Congonhas para funcionar dessa forma é a própria demanda de mercado?, afirma o presidente do SNEA, José Marcio Mollo. Mesmo assim, o chefe do CGNA garante que o movimento no aeroporto caiu com a diminuição das operações. Perguntado se o caos aéreo pode voltar, ele não responde diretamente: ?A situação melhorou porque conseguimos remanejar os vôos de acordo com os horários disponíveis. As novas malhas analisadas têm sido avaliadas dentro do espaço que temos e estamos sendo exigentes com relação a isso?. (LM)

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