Acidentes no trabalho matam 239 em um ano

Dados divulgados pela Delegacia Regional do Trabalho do Paraná (DRT-PR) indicam que no ano 2000 ? último levantamento apresentado ?, 239 trabalhadores paranaenses morreram durante a jornada de trabalho, a caminho da empresa ou de casa. Ao todo, foram 22.922 acidentes de trabalho registrados, para uma população de 1.408.668 trabalhadores.

Esse número, no entanto, pode ser bem maior, se considerado o contigente que atua no mercado informal e que em casos de acidentes não recebe o benefício do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), nem engrossa as estatísticas. O quadro nacional é ainda mais triste: levantamento da Organização Internacional do Trabalho situa o Brasil em quarto lugar entre os países onde mais ocorrem mortes por acidente de trabalho. Também em 2000, o País registrou 3.795 mortes e 348.178 acidentes. Diante do dado alarmante, trabalhadores fazem um apelo especialmente hoje, no Dia Nacional de Prevenção de Acidentes de Trabalho.

“São números relativamente altos”, reconhece o chefe do Setor de Segurança do Trabalhador da DRT-PR, Paulo Roberto Pasdiora, referindo-se especialmente ao Paraná. A boa notícia, lembra ele, é que esse número vem reduzindo – de 98 a 2000, a queda foi de 23%, segundo o Ministério do Trabalho. A meta é reduzir em 40% até o ano de 2003.

No Paraná, a indústria da madeira é a que lidera o número de acidentes do trabalho. Só no setor de fabricação de compensados, houve seis mortes e cerca de 700 afastamentos – inclusive por mutilação – no ano de 2000. Na fabricação de móveis, foram 580 acidentes mas nenhum fatal. A indústria da madeira é seguida pela construção civil e transportes. Para Pasdiora, a grande ocorrência de acidentes nos dois primeiros setores, especificamente, se deve à falta de qualificação de profissionais, abrangência em quase todo o Estado, baixo nível de desenvolvimento tecnológico e o alto risco. “Principalmente na construção civil, o setor acabou se tornando porta de ingresso no mercado de trabalho. Quem não sabe fazer nada, vira servente de obras”, explica.

Sintracon

O presidente do Sindicato dos Trabalhadores da Indústria da Construção Civil de Curitiba e Região (Sintracon), Domingos Oliveira Davide, considera a situação de fato bastante grave. Segundo ele, no período de 15 de junho a 15 de julho último, quatro trabalhadores da construção civil morreram, apenas na Grande Curitiba. “Isso é o que a gente sabe, mas o número deve ser bem maior”, aponta, acrescentando que é difícil ter dados estatísticos sobre mortes e acidentes, porque as próprias empresas escondem isso. “Existe uma lei obrigando as empresas a enviar os CATs (Comunicado de Acidente de Trabalho) ao Sindicato, mas essa lei não é cumprida.”

Davide reconhece, porém, que a construção civil já enfrentou situações piores. Durante anos seguidos, foi a campeã em acidentes de trabalho. “Em 94, com a criação da NR (Norma Regulamentar) 18, que visava à prevenção de acidentes, diminuiu muito o número de ocorrências”, conta. Segundo ele, são as empresas de pequeno porte que oferecem mais riscos ao trabalhador. “Antes, havia muitos acidentes por queda de nível ou durante construção do elevador. Agora, eles acontecem em sobrados, casas.” Outro problema enfrentado pela categoria é a doença profissional, como o problema na coluna, ocasionado principalmente pelo excesso de peso. Na Grande Curitiba, há cerca de 11 mil trabalhadores na área da construção civil, segundo o Dieese.

Marceneiros

Entre os trabalhadores que atuam na indústria da madeira, os acidentes mais comuns são a amputação de dedos, da mão e partículas que atingem os olhos. “As empresas, especialmente as maiores, oferecem equipamentos de proteção como protetor auricular, máscara, óculos, capacete e bota. O problema é que muitos funcionários insistem em não usá-los, porque não acham necessário”, conta o secretário-geral do Sindicato dos Oficiais de Marceneiros do Estado do Paraná, Edson Kleber Ferreira. Segundo ele, a preocupação de muitos trabalhadores é a questão salarial e não exatamente a segurança que a empresa oferece. “Recebemos muitas denúncias anônimas, mas as reclamações são principalmente quanto à jornada de trabalho, os pagamentos. A impressão é de que eles não sabem os riscos que a profissão oferece.”

Um ano afastado do trabalho

O mecânico de manutenção Jean Totti, de 23 anos, viveu um de seus piores momentos em julho do ano passado. Quando estava no horário do trabalho, ele e dois colegas tentaram conter a fumaça que saía de dentro de um silo da Indústria de Compensados Triângulo, na Vila Hauer, zona sul de Curitiba, onde era empregado há quatro anos. Em questão de segundos, uma grande labareda atingiu os três companheiros. Jean Totti teve queimaduras graves nos braços, pernas, costas e barriga. Ficou internado durante 18 dias no Hospital Evangélico e está até hoje afastado da função, devido ao acidente de trabalho.

“Um acidente como esse mexe muito com a pessoa. Eu gostava muito de sair à noite com os amigos, ir a festas, à praia. Depois do acidente, tudo mudou. Tive que aprender a conviver com o que aconteceu e a ter muita paciência, porque o tratamento é demorado”, diz Totti. Ele foi submetido a duas cirurgias ? enxerto na perna e cotovelo esquerdos ? e ainda vai ter que enfrentar outras operações. Para ele, o difícil de superar é a questão estética. “Só uso camiseta à noite, em casa, e não uso mais shorts”, diz. Também tem que tomar cuidados, como não ficar exposto ao sol e não esbarrar em nada.

Tottti diz que nunca imaginou que um dia poderia ser vítima de um acidente de trabalho dessa proporção. “Meu irmão trabalhava como bombeiro na época. Ele corria muito mais riscos de ser queimado, mas eu que acabei sendo a vítima.” Pelo INSS, o mecânico recebe benefício de R$ 550,00 por mês. Depois que receber alta, ele ainda não sabe se vai voltar à antiga função. “Eu gostava do que fazia, estava no auge da profissão. Pretendo voltar, mas ainda é cedo para dizer qualquer coisa. Quando vou à empresa, ainda não consigo olhar para o silo onde tudo aconteceu.” (LS)

Acidente, só em 3 situações

Apenas três situações, se verificadas, são definidas como acidente de trabalho. A primeira é quando o trabalhador é vítima das próprias características da atividade que desempenha. A segunda quando sofre acidente no trajeto entre a residência e o local de trabalho. E a terceira quando o funcionário é vítima de um acidente ocasionado por qualquer tipo de doença profissional desencadeada pelo exercício da função.

Em qualquer uma dessas situações, o empregado deve informar o empregador sobre o problema que está enfrentando. A empresa, por sua vez, deve preencher o Comunicado de Acidente do Trabalho (CAT) e enviar o formulário, em até 48 horas, ao Instituto Nacional de Seguro Social (INSS), que será responsável pelo pagamento de remuneração ao trabalhador, no valor de até R$ 1.561,56, caso ele fique afastado por mais de 15 dias. (LS)

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