Os recursos do INSS sobre as contribuições Previdenciárias (sociais) na Justiça do Trabalho

1. Competência constitucional e previsão legislativa

Após controvertidos debates sobre o tema, a Emenda Constitucional n.º 20/98 (cuja inconstitucionalidade, embora doutrinariamente sugerida, ainda não foi reconhecida) introduziu o parágrafo 3.º no art. 114 da Constituição da República Federativa do Brasil, dizendo competir à Justiça do Trabalho, “executar, de ofício, as contribuições sociais previstas no art. 195, I, a, e II, e seus acréscimos legais, decorrentes das sentenças que proferir”.

Verificou-se, com o passar do tempo, que remanesciam muitas incertezas sobre a aplicação da norma constitucional. Veio, então, à lume, a Lei n.º 10.035, que passou a viger em 25.10.00, cujo objetivo foi regulamentar o novel texto constitucional. Diversos artigos da CLT foram objeto de mudanças importantes (831, 832, 876, 878, 879, 880, 884, 889 e 897), cujos aspectos mais significativos serão objeto de apreciação a seguir.

2. O recurso ordinário do INSS

O termo lavrado para retratar a conciliação continua valendo como decisão irrecorrível, exceto para a Previdência Social quanto às contribuições que lhe forem devidas (nova redação do parágrafo único do art. 831 da CLT).

A decisão do juiz que homologa a transação, na fase de conhecimento, torna viável o recurso ordinário para o INSS, terceiro interessado, com o prazo em dobro, de 16 dias, conforme os artigos 895, a, da CLT, e 1.º, III, do Decreto-lei n.º 229/67.

O recurso questionará, em princípio, a ausência de previsão do pagamento das parcelas devidas à previdência social, e, também, “a natureza indenizatória que o ajuste tenha dado à parcela da conciliação, caso a entenda de cunho salarial” (Revista LTr. Vol. 64, n.º 12. São Paulo, dezembro de 2000. P. 1.500).

3. A coisa julgada em relação ao INSS

O juiz do trabalho, ao sentenciar, seja homologando ajuste entre as partes ou decidindo cognitivamente, deve indicar a natureza jurídica das parcelas decorrentes para efeito de se estabelecer a incidência que virtualmente ocorrerá a título de contribuição previdenciária (artigo 832, parágrafo 3º, da CLT).

Em caso de acordos homologados judicialmente, o artigo 832, § 4.º, da CLT, com a redação dada pela Lei n.º 10.035/00, obriga os juízes do trabalho a intimarem o INSS, sendo facultado a este interpor recurso relativo às contribuições que lhe forem devidas.

Já em relação às sentenças cognitivas, as que decidem o processo na fase de conhecimento, julgando o mérito da postulação, inexplicavelmente o legislador não impôs igual obrigação (de se intimar o INSS). Ao juiz, entretanto, não é vedado tomar tal providência, de modo a atrair embargos declaratórios ou, diretamente, o recurso ordinário do órgão previdenciário, nesta fase, quanto à natureza das parcelas, na condição de terceiro interessado (art. 499 do CPC).

Portanto, relativamente ao INSS, os julgados trabalhistas só transitam em julgado após a última manifestação judicial, concreta e específica, suscitada pelo órgão previdenciário quanto às contribuições que lhe são devidas, da qual não caiba qualquer recurso.

4. Agravo de petição do INSS

Ultrapassada a discussão quanto à natureza das parcelas, no caso de acordo homologado judicialmente, ou de decisão cognitiva a respeito, dos quais o INSS foi devidamente intimado, este, no momento da liquidação, poderá se manifestar sobre, propriamente, os valores do crédito previdenciário (artigo 879, parágrafo 3.º, da CLT). Se, entretanto, da decisão cognitiva o juiz optou por não intimar previamente o INSS, este poderá discutir tanto a natureza das parcelas, quanto os valores do crédito.

Em seguida, garantida a execução (pelo devedor), poderá, ainda, revolver a matéria, por ocasião dos embargos à execução, através de impugnação à sentença de liquidação (artigo 884, parágrafos 3.º e 4.º, da CLT), e, se for o caso, posteriormente, em agravo de petição, sempre, vale lembrar, seguindo o rito e os prazos normais, sem qualquer privilégio ou atropelamento.

Assim é que, agravo de petição, nos termos do artigo 897, letra “a”, da CLT, só caberá em face de efetiva “sentença de liquidação”, e não de despacho destinado a simples propulsão processual, sem caráter definitivo.

Embora certos despachos não se limitem a uma finalidade meramente impulsionadora do processo, envolvendo verdadeira decisão, no processo do trabalho, como no processo civil, a regra é a de que destes despachos, chamados ordinários, ou de mero expediente, não cabe recurso (CPC, art. 504). Não se deve olvidar, ainda, que mesmo a decisão interlocutória não é recorrível no processo do trabalho (art. 893, parágrafo 1.º, da CLT).

O INSS, assim, sem antes apresentar impugnação e sem ter, por conseqüência lógica, decisão resolutiva desta, induvidosamente não pode apresentar agravo de petição.

Esta seqüência processual, antes descrita, não pode ser desvirtuada, nem mesmo se, porventura, nesta fase, as partes chegarem a se conciliar. A conciliação aí não vai atrair, ao contrário do que se possa imaginar, a faculdade concedida pelo § 4.º do artigo 832 da CLT, pois ela é própria da fase cognitiva. E ainda que não fosse, o vocábulo “recurso” a que alude, só poderia ser entendido na execução, dadas as peculiaridades desta, como relativo ao meio inerente próprio, sem dispensa do cumprimento das formalidades legais, enquanto exigências naturais prévias, condicionantes da sua admissibilidade.

Em sentido diametralmente oposto a essas ponderações, no entanto, a Egrégia Seção Especializada do TRT da 9.ª Região, a quem incumbe unificar os posicionamentos a respeito da execução trabalhista em todo o Estado do Paraná, decidiu, recentemente, que se o acordo homologado em fase executiva discriminar as verbas de natureza salarial e indenizatória, desde logo é cabível o recurso de agravo de petição pelo INSS, sem necessidade de impugnação prévia à sentença de liquidação (à qual a decisão homologatória equivaleria), conforme AP 3.397/01, julgado em 13/5/02, acórdão ainda não publicado.

Luiz Eduardo Gunther é juiz do TRT da 9.ª Região. Cristina Maria Navarro Zornig é assessora no TRT da 9.ª Região.

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