Os poderes investigatórios do Ministério Público

É com preocupação que assistimos às investidas de institutos de ciências criminais e de algumas autoridades contra o poder investigatório do Ministério Público. Na condição de procuradores da República, integrantes da Força Tarefa que investiga o escândalo BANESTADO, no Paraná, reconhecemos a importância do trabalho da Polícia Federal e das Polícias Civis em todo o País. No entanto, não podemos deixar de ressaltar que, em muitos casos, é a investigação direta do Ministério Público que consegue elucidar complicadas tramas criminosas, principalmente quando estas se verificam no seio da própria Administração Pública e quando são praticadas por autoridades públicas.

Parece-nos que a questão, posta de forma distorcida à consideração da opinião pública nacional, não é jurídica, e sim política. Do ponto de vista constitucional e legislativo, é evidente que o Ministério Público Å tanto o Federal quanto o dos Estados e o do Distrito Federal Å pode realizar investigações criminais para a formação de sua convicção na propositura de ações penais, evitando lides temerárias. Como titular da ação penal pública e sendo dispensável o inquérito policial, de acordo com o próprio Código de Processo Penal, não há óbice algum a tais apurações diretas pelo Ministério Público, máxime quando se tem em mira atender o interesse público de persecução penal.

Em vários países do mundo, como os Estados Unidos, a Itália, Portugal e França, são os promotores e os procuradores da República que dirigem as investigações policiais, encarregando-se depois de sustentar as demandas criminais em juízo. Por que no Brasil, que se espelhou no modelo europeu de Ministério Público, seria diferente?!

A quem favorece o movimento que se levanta contra a possibilidade de investigações diretas pelo Ministério Público? A resposta é uma só: os favorecidos serão pessoas poderosas e os criminosos de “colarinho branco” que nunca viram suas atividades ilícitas investigadas pelos poderes públicos e que nunca se viram punidos pelos seus delitos, lesivos aos interesses mais relevantes da nação.

A vingar a proposta que pretende mutilar o Ministério Público brasileiro, retirando-lhe um fundamental instrumento de combate à impunidade, importantes investigações criminais serão encerradas ou enormemente prejudicadas, em todo o Brasil, a exemplo das apurações do caso Banestado, que tem sido desenvolvidas em vários pontos do Estado do Paraná e também por meio de diligências diretas do Ministério Público Federal, nos Estados Unidos. As investigações realizadas pelo Ministério Público Federal para identificar os participantes do esquema de lavagem de dinheiro e evasão de divisas no Banestado serão fulminadas com a proibição da apuração direta. As provas já colhidas nos inúmeros processos e inquéritos poderão ser invalidadas e pessoas detidas ou condenadas liberadas, pelo reconhecimento da nulidade dos indícios colhidos diretamente pelo Ministério Público. E não apenas este caso será atingido. Haverá, sim, um caos no sistema processual penal, para a alegria e o regozijo daqueles que ocupam seus dias maquinando planos para locupletar-se do dinheiro público e para violar a lei. Haverá, em suma, mais impunidade no País.

Não é o homem comum, o pobre cidadão brasileiro, que, em regra, é objeto das investigações criminais diretas do Ministério Público por todo o País. Nesses apuratórios, quase sempre são homens poderosos que ocupam o posto de suspeitos e depois o banco dos réus, como antes não se via. Estes, sim, é que se ressentem da intransigência do Ministério Público na defesa da ordem jurídica e da punição severa para os que violam a lei penal, sem distinção de classes. Para o cidadão comum, o que importa é que a lei valha para todos, e não quem investiga, se a Polícia ou o Ministério Público.

Qual será então o resultado desse movimento supostamente democrático de tais entidades, que agora vêem no Ministério Público o “inimigo público número 1ª? Qual será o objetivo oculto, por trás da inacreditável alegação de que o Ministério Público é o responsável por violações aos direitos fundamentais dos investigados e acusados? Querem mesmo esses autoproclamados arautos da democracia proteger o interesse público, a segurança e o bem-estar dos cidadãos? Querem mesmo a punição de corruptos? Ou querem apenas, como defensores de criminosos de “colarinho branco”, advogar o interesse de seus próprios clientes?!

Carlos Fernando dos Santos Lima e Vladimir Aras

são ex-promotores de Justiça, procuradores da República no Estado do Paraná e membros da Força-Tarefa CC-5, que investiga o escândalo Banestado, no Paraná.

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