O triste legado de Lerner

A uma semana do final dos seus oito anos de mandato, o governador Jaime Lerner (PFL) deixa o Palácio Iguaçu sem oferecer à população do Paraná nenhum motivo para lamentar o fim do ciclo de poder comandado pelo pefelista. O que ocorre, na realidade, é justamente o contrário. Lerner entrega o governo carregando os estigmas que, ironicamente, sempre tentou evitar durante sua longa carreira como homem público: o de um político identificado com as pechas do conservadorismo no plano político e da ineficiência no plano administrativo.

Conservadorismo porque o atual governador do Estado exerceu seu mandato à moda antiga, típica dos quadros arenistas aos quais já pertenceu, adotando uma práxis político-administrativa refratária a um diálogo amplo com a sociedade paranaense. Esta orientação política se tornou evidente, por exemplo, durante o turbulento processo de privatização da Copel, quando o governo encaminhou o projeto propondo a venda da estatal à Assembléia Legislativa sem nenhuma consulta à sociedade. E por isto, após uma longa batalha política, acabou sofrendo um irreversível desgaste político, reforçado pela decisão do presidente Fernando Henrique Cardoso de proibir a privatização das estatais do setor.

Ineficiência devido aos indicadores sócio-econômicos do Paraná, que denunciam uma grave crise na agricultura familiar (o setor mais importante da economia paranaense, em que pese o discurso de Lerner de que o Estado assumiu um novo perfil, industrial), na Educação, na segurança e na saúde públicas. Ineficiência, ainda, na gestão da máquina pública, já que o Paraná acumula uma dívida jamais vista na história do Estado, além de uma capacidade de investimento bastante reduzida.

Não foi mera casualidade o fato de o establishment que compôs o arco partidário lernista nas eleições de 6 de outubro ter sido derrotado nas urnas justamente pelo seu principal e mais ácido adversário – Roberto Requião de Mello e Silva. Sem ignorar o adesismo dos paranaenses à vitoriosa campanha do presidente eleito, Luiz Inácio Lula da Silva (PT), a vitória de Requião foi uma resposta pragmática do eleitorado à liderança que acentuou de forma mais contundente as muitas mazelas atribuídas ao atual governo – e,, sobretudo, ao político Jaime Lerner e tudo o que ele representa.

Mais do que uma derrota, porém, o que Lerner deixa de herança é a lição de que não se deve conduzir um Estado com base apenas num modelo de administração pública rigorosamente planejado nas pranchetas dos tecnoburocratas – um dos diferenciais das duas campanhas de Lerner ao governo que seus marqueteiros se empenharam tanto em divulgar. O exercício da política – seja no âmbito do Executivo ou do Legislativo – é muito mais do que a lógica liberal que este governo tentou impôr à sociedade. A política ainda continua sendo, no sentido mais clássico, a arte do diálogo e da busca de soluções pactuadas para os problemas econômicos-sociais. Ainda bem.

Aurélio Munhoz

é editor-adjunto de Política de O Estado (politica@parana-online.com.br) e mestrando em Sociologia Política pela UFPR.

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