O princípio constitucional da dignidade humana e a atuação do MP

Todos sabemos que o direito é um sistema que pode ser concebido como sendo um conjunto de princípios e normas que tem por finalidade básica reger a sociedade e organizar o Estado. Neste mesmo sentido, é forçoso reconhecermos que o objetivo principal do direito é o atingimento do bem comum, idealizado como meta para a construção de uma sociedade justa, livre e solidária, em que a tônica principal deve ser a redução das desigualdades sociais, com a possibilidade de vida digna a todos os cidadãos.

A sociedade contemporânea, extremamente massificada, consumista e materialista, se constitui em terreno fértil para a implementação de políticas voltadas para a inclusão social. Neste particular, a contribuição do direito pode e deve se dar por uma aplicação coerente e sistemática do Princípio Constitucional da Dignidade da Pessoa Humana, insculpido no artigo 1º, inciso III da referida Carta. Assim, a aplicação deste princípio de forma criteriosa, associado a outros princípios com assento na Constituição da República, permitirá aos operadores do direito uma atuação social mais intensa e sempre com suporte constitucional.

O princípio é a estrela máxima do universo ético-jurídico, na coerente metáfora utilizada pelo professor Rizzatto Nunes, em sua obra a respeito do tema, e, portanto, tem o condão de influenciar na interpretação e na aplicação de todas as normas jurídicas positivadas. Ocupa a hierarquia máxima em termos da hermenêutica jurídica e situa-se no ápice do sistema jurídico, irradiando sua luz por todo o ordenamento. Contudo, a despeito de pairar por cima do sistema jurídico, como se estivesse “gravitando” em um universo de generalidade e abstração, por condicionar a aplicação de normas jurídicas, acaba incidindo no plano real e atingindo a concretude.

Desta forma e partindo-se destas premissas, temos que o principal valor tutelado pela Constituição da República é, sem qualquer dúvida, o Princípio da Dignidade da Pessoa Humana; que serve, inclusive de valor condicionante para a validade e a eficácia de princípios inferiores e de toda a legislação infraconstitucional. Possui, verdadeiramente a natureza de super princípio e, portando, deve se constituir no principal ponto de análise do hermeneuta ou do operador do direito, logo ao iniciar a busca pelo sentido e alcance de determinada norma jurídica.

Diante do contexto que se apresenta e da consciência contemporânea de que o direito deve cada vez mais servir de instrumento para minimizar a exclusão social, surgem questionamentos acerca da forma de implementação destas políticas. Surgem questionamentos também com relação ao papel do Ministério Público e de como a Instituição poderia ser utilizada como agente interveniente desta proposta.

Considerando-se a dimensão constitucional do Ministério Público e sua missão de defensor da sociedade, na tutela de interesses difusos, coletivos, individuais homogêneos, ousamos sugerir, a título de lege ferenda, uma maior flexibilidade na legitimidade de atuação da Instituição, especialmente na seara cível. Aferir se em determinada relação jurídica há violação à dignidade da pessoa humana é função institucional do Ministério Público e, seguramente, esta nova postura por parte de Promotores e Procuradores de Justiça representará inequívoca atividade de fomento e de difusão deste princípio, na qualidade de valor condicionante da própria aplicação da legislação infraconstitucional.

Por fim, é importante que se diga que se trata de mera proposta, sugestão a ser debatida dentro e fora da Instituição do Ministério Público, mas principalmente nas Escolas Superiores de Direito, no coração do meio acadêmico, local onde o direito é discutido e pensado em sua essência. Direito é dialética, é debate e somente com a colocação de idéias nos meios acadêmicos poderemos, ao menos pretender, melhorar a formação de futuros operadores do sistema, direcionando-os para um enfoque mais social e humano das ciências jurídicas e desenvolvendo nos acadêmicos a preocupação constante com a diminuição das desigualdades e da exclusão social.

Márcio Pinheiro Dantas Motta

é promotor de Justiça Cível, titular da 4.ª Promotoria de Justiça da Comarca de Apucarana/PR.

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