O marketing de Confúcio

“É mais importante ensinar a pescar do que dar o peixe.” Embora tenha se tornado ditado popular corriqueiro ao longo de aproximadamente 2.550 anos, esta célebre frase de Confúcio, o filósofo e sábio chinês nascido em 551 a.C., pode ser tomada como paradigma pertinente do conteúdo correto do que hoje se denomina marketing social. Trata-se, em sua essência, de mensagem de fácil assimilação, com apelo publicitário e criatividade, focada num objetivo muito claro, de estimular o combate à fome por meio de uma atividade educativa.

O exemplo é importante no sentido de contribuir para a clara compreensão do real escopo do marketing social, ou seja, uma poderosa ferramenta à disposição das organizações do Terceiro Setor, para multiplicar ações, conquistar adesões, apoios, realizar campanhas e possibilitar a manutenção e crescimento do trabalho realizado. Fica muito claro que o marketing social não pode – e não deve – ser a finalidade precípua de qualquer ação de voluntariado, responsabilidade empresarial ou atuação das organizações não-governamentais em geral. Trata-se, em termos efetivos, de um instrumento destinado a contribuir para o sucesso das ações de caráter público da iniciativa particular, direcionadas ao bem comum.

A AACD (Associação de Assistência à Criança Deficiente), uma das mais antigas instituições do Terceiro Setor no Brasil, também foi uma das pioneiras, na área, a instituir um departamento de marketing, que atua exatamente com foco no atendimento prestado, nos avanços da medicina na melhoria da qualidade de vida dos pacientes, na parte educacional, hospitalar e em campanhas de prevenção, como a de inclusão do ácido fólico na farinha.

Entender o marketing como atividade-meio e não como objetivo das ações de responsabilidade social e voluntariado é um pressuposto básico, não apenas pelo caráter ético que deve prevalecer na chamada governança corporativa, como também em termos de eficácia. Jornalistas, veículos de comunicação, formadores de opinião, parceiros, apoiadores e patrocinadores em potencial, bem como a opinião pública, percebem, na maior parte das vezes, a intenção contida em projetos e ações do Terceiro Setor. Quando a meta é meramente marketing, normalmente ocorre um esvaziamento do projeto, conduzindo-o ao fracasso. Ao contrário, quando se identifica a seriedade de propósitos, as próprias estratégias de marketing fluem de forma mais natural, espontânea e criativa, conquistando o interesse e a confiança de todos os atores envolvidos no processo.

Tudo isso não significa inviabilizar que empresas, fundações, institutos, entidades filantrópicas e ONGs capitalizem para sua imagem institucional suas ações de caráter social. Isso é lícito e correto. Maniqueísmo à parte, a verdade é que os consumidores, os setores produtivos e a sociedade em geral devem, mesmo, ter meios de identificar quais são as organizações preocupadas com a melhoria da qualidade de vida, inclusão social, educação, saúde, meio ambiente e democratização de oportunidades.

Os resultados do exercício ético do voluntariado e da responsabilidade social são muito perceptíveis e se constituem, de fato, em diferencial marcante das organizações compromissadas com o bem comum e o interesse público. E isso lhes acarreta numerosos benefícios em termos de imagem institucional, um prêmio justo à sua postura cidadã. A eficácia da correta utilização do chamado marketing social pode, mais uma vez, ser comprovada pelo exemplo de Confúcio. O sábio jamais propagou a sua própria pessoa como um benemérito preocupado em ajudar o próximo. Ao contrário, disseminou idéias e normas de convivência e justiça social que, dentre outros avanços, permitiram a pessoas de origem humilde o acesso a cargos públicos e governamentais até então restritos à antiga aristocracia chinesa. Resultado: a imagem “institucional” de Confúcio, ancorada por seus conceitos e ideais sinceros, sobrevive aos séculos, atestando a eficiência do marketing como instrumento das ações dirigidas ao bem comum.

Philippe D?Audenhove

é gerente de marketing da AACD. E-mail: mkt-philippe@aacd.org.br

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