O Direito do Trabalho no STF

(últimas decisões: estabilidade da gestante e continuidade do contrato de trabalho após a aposentadoria)

1. Estabilidade da gestante

A atual Constituição Federal não modificou a concepção objetivista concernente à estabilidade provisória da gestante, a qual é centrada na teoria do risco da atividade econômica, fruto de longa discussão doutrinária acerca da responsabilidade civil do empregador.

O Excelso Supremo Tribunal Federal, recentemente, confirmou posição já anteriormente adotada sobre o tema. Conheceu do AI 448572-SP e deu provimento ao recurso extraordinário respectivo para reformar acórdão do C. TST, que afastara o direito da empregada gestante à estabilidade provisória prevista no art. 10, II, “b”, do ADCT, em razão da ausência, na espécie, de prévia comunicação da gravidez ao empregador.

Citando precedentes (AI 392.303/SP, Rel. Min. Celso de Mello; RTJ 180/395, Rel. Min. Sepúlveda Pertence; RE 339.713 – AgR/SP, Rel. Min. Maurício Corrêa; RE 259.318/RS, Rel”. Min. Ellen Gracie; RTJ 181/996, Rel. Min. Carlos Velloso; AI 315.965/DF, Rel. Min. Sidney Sanches; RE 220.567/DF, Rel. Min. Carlos Velloso) o Ministro Celso de Mello deixou assente: “A empregada gestante tem direito subjetivo à estabilidade provisória prevista no art. 10, II, “b”, do ADCT/88, bastando, para efeito de acesso a essa inderrogável garantia social de índole constitucional, a confirmação objetiva do estado fisiológico de gravidez, independentemente, quanto a este, de sua prévia comunicação ao empregador, revelando-se írrita, de outro lado e sob tal aspecto, a exigência de notificação à empresa, mesmo quando pactuada em sede de negociação coletiva”.

Essa responsabilidade, aliás, atualmente firmada no artigo 2.º da CLT, já estava prevista nos artigos 1.521, 1.522 e 1.523 do Código Civil de 1916, que culminaram, inclusive, com o advento da súmula 341 do E. STF, que diz: “É presumida a culpa do patrão ou comitente pelo ato culposo do empregado ou preposto”.

Em análise a essa súmula, Roberto Rosas esclarece que: “Filadelfo Azevedo, ao criticar a ancianidade do nascente Código Civil brasileiro, apontava o caminho para se considerar presumida a culpa do patrão, em vista do risco assumido na empresa (RE n.º 5.427 – RF/93/287)”(1).

2. Aposentadoria não extingue, necessariamente, o contrato de trabalho

Os efeitos da aposentadoria no contrato de trabalho tem dividido os julgadores e gerado polêmicas que podem ser atribuídas às diversas alterações na legislação que trata da matéria.

As Leis n.º 8.213/91 e 8.870/94 permitem a concessão de aposentadoria e a continuidade do vínculo de emprego, deixando certo, referidas normas, que proventos de aposentadoria (prestação previdenciária de ordem pública, irrenunciável e constitucionalmente assegurada às pessoas que atendam aos requisitos legais para sua implementação – artigo 7.º, XXIV e artigo 202 da CF/88), não se confundem com salários (contraprestação paga pelo empregador em face da realização de serviços que lhe são prestados – artigo 457 da CLT).

Neste sentido conduziu-se o E. STF, no julgamento da RCL 2368, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, DJ 19.03.04, lembrando que, relativamente ao artigo 453 da CLT, o seu parágrafo 2.º que dispunha importar a aposentadoria extinção do vínculo de emprego, teve eficácia suspensa pela concessão das liminares ADIns n.ºs 1.721-DF 1770, ante a possibilidade de violação ao art. 7.º, I, da CF/88.

Em outras palavras, o pedido de aposentadoria, na vigência da Lei n.º 8.213/91, não promove a rescisão contratual; essa deriva da vontade do empregado de deixar de prestar serviços, com a opção pela letra “a” do artigo 49 da lei em foco, que dispõe: “a) da data do desligamento do emprego, quando requerida até essa data ou até 90 (noventa) dias depois dela”.

Não se trata, vale frisar, de desrespeito à Orientação n.º 177 da SBDI-1 do C. TST, mas de, por questão de política judiciária, sobrepor-se comando emanado do Excelso STF, que encerra decisão mais favorável ao empregado.

Se a mais alta Corte de nosso País suspendeu o art. 453, § 2.º, da CLT, não há possibilidade de não se conferir a multa de 40% do FGTS sobre os depósitos de todo o período (antes e depois da aposentadoria), inclusive sobre valores já sacados, em caso de rescisão injusta.

O ilustre jurista paranaense José Affonso Dallegrave Neto, na obra indispensável a todos os militantes na Justiça do Trabalho, já havia assentado, com inegável acerto: “(…) uma coisa é certa, a partir da decisão do Supremo Tribunal Federal, ocorrida na sessão de 14.05.98, até os dias de hoje, pode-se inferir que a matéria encontra-se pacífica junto ao Excelso Tribunal: a aposentadoria espontânea não representa causa para dissolução do contrato de trabalho, vez que a relação que o empregado mantém com a Previdência é diversa da relação mantida com o empregador. Destarte, a aposentadoria requerida pelo empregado não tem o condão de elidir a unicidade contratual”(2).

Conclui o professor Dallegrave Neto poder asseverar-se, com segurança, “que os dois períodos de trabalho (antes e após a aposentadoria) se somam para efeitos de contagem de serviço e de pagamento da multa de 40% do FGTS, devendo, pois, ser cancelada a OJSDI- I n. 177 do TST”(3).

Em saudável rebeldia à OJ 177 da SBDI I do C. TST, que diz extinguir o contrato de trabalho a aposentadoria espontânea, mesmo quando o empregado continua a trabalhar na empresa após a concessão do benefício previdenciário, podemos citar o seguinte aresto:

“APOSENTADORIA – NÃO CONFIGURAÇÃO DE EXTINÇÃO DO CONTRATO DE TRABALHO – Lei 8213/91, art. 49 – DESPEDIDA – DIREITO À MULTA DE 40% SOBRE TODO O PERÍODO LABORADO – APOSENTADORIA E CESSAÇÃO DO CONTRATO DE TRABALHO. DISTINÇÃO ENTRE O VÍNCULO PREVIDENCIÁRIO E O VÍNCULO DE EMPREGO. DIREITO À PERCEPÇÃO DA MULTA DO FGTS SOBRE A TOTALIDADE DOS DEPÓSITOS EM CASO DE DISPENSA IMOTIVADA. A obtenção da aposentadoria não é causa objetiva de extinção do vínculo empregatício, nos termos do art. 49 da Lei 8213/91. A relação de trabalho é rigorosamente distinta da relação mantida com o órgão da Previdência Social, ligando sujeitos diversos em torno de objetos peculiares, o que exclui a possibilidade de que um evento previdenciário (a aquisição da aposentadoria) gere, por si só, o drástico efeito da extinção do vínculo de emprego. Se o empregador não desejar a manutenção do vínculo, deve promover a ruptura do contrato, com o pagamento de todos os direitos rescisórios do empregado e se a prestação de serviços prosseguir após a aposentadoria, o contrato se mantém uno, sem qualquer solução de continuidade. Em qualquer caso, faz jus o obreiro, por ocasião da dispensa imotivada, ao recebimento dos consectários da rescisão, entre os quais a multa de 40% sobre os depósitos do FGTS de todo o período contratual”. (TRT – 2.ª Reg. – RO-2990282194 – Ac. 20000334590 – 8.ª T. – Rel: Juíza Wilma Nogueira de Araújo Vaz da Silva – Fonte:DOESP, 08.08.2000)(4).

3. Conclusões

É seguro afirmar, de acordo com as mais recentes decisões do E. STF, a quem incumbe a última palavra em matéria constitucional:

3.1. No que se refere à estabilidade à gestante, ela existe independentemente de prévia comunicação ao empregador, mesmo quando tal requisito venha a ser pactuado em instrumento normativo. Portanto, com a confirmação da gravidez nasce o direito imediato à estabilidade;

3.2. Quanto à aposentadoria espontânea, seguindo-se a continuidade da prestação de serviços, ela não extingue o contrato de trabalho, de modo que os dois períodos (o que a antecede e o que a sucede) são contados para efeitos de tempo de serviço e de satisfação da multa de 40% do FGTS.

NOTAS:

(1) Direito sumular: comentários às súmulas do STF e do STJ. 5. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1990. p. 142.

(2) DALLEGRAVE NETO, José Affonso. Inovações na legislação trabalhista. 2. ed. (em aguardo da 3. ed.). São Paulo: LTr, 2002. p. 238.

(3) Ob. cit. p. 239.

(4) Bonijuris Jurisprudência Trabalhista n.º 259, Ano XI, n.º 19. Ementa 31.347. p. 3.535.

Luiz Eduardo Gunther

é juiz no Tribunal Regional do Trabalho da 9.ª Região.

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