O condomínio no novo Código Civil

O novo Código Civil alterou a lei 4.591/64 que trata das regras sobre condomínios. Confira abaixo as mudanças e como isso pode alterar a sua rotina. Os especialistas em Direito Imobiliário Maria Clara Maudonnet e Luiz Kignel comentam as mudanças.

– Redução para 2% do teto da multa para inadimplentes do pagamento da taxa de condomínio. Antes, quem atrasava o pagamento era multado em até 20% do valor devido e juros moratórios de 1% ao mês. A novidade pode agradar os moradores, mas para a advogada Maria Clara, é preciso olhar com cautela para a mudança, que poderá estimular a inadimplência.

– A multa para quem descumpre os deveres do condomínio não poderá ultrapassar cinco vezes o valor da taxa do próprio condomínio. Além disso, o novo Código Civil estabelece que se não houver prévia determinação, o valor da multa será determinado por 2/3 dos condôminos reunidos em assembléia. Antes, a multa prevista era estabelecida na convenção ou no regulamento condominial sem um valor teto de cobrança.

– Para quem insiste em descumprir os deveres, haverá nova cobrança de multa de até cinco vezes o valor da taxa de condomínio. A decisão do valor, no caso de reiteração, poderá ser tomada por 3/4 dos condôminos reunidos em assembléia. A fixação dessa multa, prevista no artigo 1.337, depende de decisão criteriosa para evitar injustiças e uso indevido desse poder da assembléia. “O perigo, nesse caso, é de os condôminos julgarem de maneira injusta as ações de outro morador por não simpatizar com ele”, lembra Maria Clara.

– Haverá multa de até 10 vezes o valor do condomínio para os condôminos cujo comportamento for considerado anti-social. Pode-se caracterizar como anti-social, a falta de pagamento dos encargos, a constante provocação de barulho excessivo, o desenvolvimento de atividade ilícita ou libidinosa, maus-tratos das pessoas que moram no condomínio, bem como o uso de drogas. Cuidado: há que se ter cautela antes de tomar qualquer atitude contra o suposto condômino anti-social, pois este poderá pleitear reparação por danos morais, caso venha sofrer constrangimentos ou ameaças à sua pessoa.

– O novo código possibilitará, ainda, que condômino alugue a vaga no estacionamento para pessoas estranhas ao condomínio. A lei atual estabelece que as vagas da garagem sejam alugadas somente para moradores do prédio, ainda assim, se a convenção permitir. “Essa mudança é polêmica pois atinge a questão de segurança dos condomínios, afinal pessoas estranhas vão circular no local”, explica Maria Clara.

Direitos dos condôminos

– usar livremente as unidades do condomínio;

– usar as partes comuns, de acordo com sua destinação, desde que não impeça a utilização dos outros moradores;

– quem está com o pagamento em dia pode votar e participar das assembléias.

Deveres dos condôminos

– contribuir para as despesas do condomínio, na proporção adequada;

– não realizar obras que comprometam a segurança da construção;

– não alterar a fachada em sua forma e cor, tanto nas respectivas partes como nas esquadrias externas;

– dar a sua parte a mesma destinação que tem a edificação, e não as utilizar de maneira que prejudique o sossego, a salubridade e a segurança dos demais moradores, nem que contrarie bons costumes.

Análise do especialista Luiz Kignel:

“1. Tem havido uma certa mistura entre Código do Consumidor e novo Código Civil, em particular pela questão da redução da multa para 2%, que veremos a seguir. Mas é importante esclarecer que o Código Civil é muito mais abrangente e completo do que o Código do Consumidor. Neste regulam-se as relações de consumo; naquele regulam-se todas as relações, direitos e obrigações do cidadão e ainda se abordam outras questões da pessoa jurídica. Os códigos não são concorrentes, mas é certo que tem finalidades e funções distintas.

2. O que efetivamente parece que vem sendo destacado pela mídia é a questão da multa condominial reduzida para 2%. Vamos tentar esclarecer:

O Código do Consumidor havia fixado para o inadimplente a multa de 2% (dois por cento). Com base nessa premissa o novo Código Civil copiou o outro código e também instituiu para os débitos condominiais o mesmo patamar de multa em 2% (conforme artigo 1.336, parágrafo 1.º). Neste ponto, entendo que a redação não foi feliz.

2.1. Primeiramente, o fato de o Código do Consumidor ter fixado a penalidade em 2% não obrigava o Código Civil a seguir o mesmo caminho, Isto porque no Código de Consumidor existe uma relação de consumo e há lei acaba diferenciando as partes envolvidas. Como muitas vezes o contrato entre fornecedor e consumidor é de adesão, ou seja, ele é montado pelo primeiro e apresentado ao segundo apenas para assinatura (sem possibilidade de discussão de suas cláusulas), a lei fixou uma multa de 2% para resguardar a chamada “parte hipossuficiente” (mais fraca) da relação comercial. Todavia, na vida condominial a situação é completamente diferente porque não há relação de consumo. O condômino não está “adquirindo” absolutamente nada, mas apenas suprindo juntamente com os demais os custos e despesas do edifício onde reside. Não há relação comercial.

2.2. De outro lado, a multa muito reduzida poderá eventualmente induzir o condômino a optar, no orçamento familiar apertado, em pagar o condomínio posteriormente, honrando primeiro despesas cujas penalidades pela inadimplência são maiores (cheque especial, cartão de crédito, etc.). E se assim o fizer, o condômino sabe que as contas do prédio serão pagas porque existem outros condôminos em dia com seus compromissos e, via de regra, o prédio poderá ter um fundo de reserva. Assim, os demais condôminos estão financiando o giro do dinheiro do inadimplente.

Ora, a multa no condomínio não visa o lucro, mas sim procura inibir o condômino que pretende que os demais financiem o que é de uso comum. Assim, a multa de 10% (ou até 20%, embora esse patamar nos dias de hoje me pareça extremamente exagerado) tem caráter preventivo e, constatado o atraso, punitivo. Ademais, a multa não enriquece individualmente os condôminos, mas fica para um fundo de reserva administrado pelo próprio Condomínio.

3. Já procurando obter uma saída para este problema, nos parece que alguns edifícios poderão adotar o critério de penalidade disposto no artigo 1.337 do novo Código Civil que prevê, após aprovação de três quartos dos condôminos restantes, impor multa de até cinco vezes o valor do condomínio para o condômino que “não cumpre reiteradamente com os seus deveretes perante o condomínio”.

4. O que me parece um avanço na preservação do sossego da vida condominial é a disposição do parágrafo único do artigo 1.337 do novo Código Civil que fixa multa de até 10 vezes o valor do condomínio para aquele que “por seu reiterado comportamento anti-social, gerar incompatibilidade de convivência com os demais condôminos ou possuidores”. Efetivamente, quem já se deparou com vizinhos problemáticos, barulhentos, constantes causadores de problemas no prédio, sabe a importância deste dispositivo.

Ainda não chegamos ao nível norte-americano que permite ao prédio proibir o ingresso de determinadas pessoas como moradoras de um condomínio, considerando que esta possa lhes causar tumulto ou transtornos na vida diária. Mas de qualquer forma, me parece um grande avanço na conquista dos direitos do cidadão.

5. Outra importante inovação é a faculdade conferida ao condômino de alienar sua vaga de garagem para terceiros não moradores do edifício. Nesse caso, os condôminos têm condições iguais, ou seja, o novo Código Civil lhes permitiu um direito de preferência. Se não exercerem, a vaga poderá ser vendida para terceiros.

Maria Clara Maudonnet é advogada do escritório Pestana e Maudonnet no Rio de Janeiro.
Luiz Kignel é advogado do escritório Pompeu e Longo Advogados em São Paulo.

Voltar ao topo