O § 1.º do art. 555 do CPC e o TRT (uniformização da jurisprudência intramuros )

1. Aplicabilidade nos Tribunais Regionais do Trabalho

Verificando os juízes integrantes do TRT da 9.ª Região a absoluta compatibilidade do § 1.º do art. 555 do CPC com o processo do trabalho (art. 769 da CLT), adaptou-se o Regimento Interno, com a edição da Emenda Regimental 01/02 (art. 5.º), alterando-se o inciso X, do art. 55, da disposição interna, possibilitando ao juiz relator que: “Ocorrendo relevante questão de direito, que faça conveniente prevenir ou compor divergência entre turmas do tribunal, propor seja o recurso julgado pelo Egrégio Tribunal Pleno, que, reconhecendo o interesse público na assunção de competência, poderá fazê-lo, nos termos do art. 555, § 1.º, do CPC”.

Portanto, agora, o Tribunal Pleno do TRT da 9.ª Região passa a: “Reconhecendo interesse público na assunção de competência, julgar os recursos submetidos à sua apreciação, conforme o art. 55, X, deste Regimento Interno” (art. 2.º da Emenda Regimental).

2. Os requisitos do novo procedimento

Em face da redação do § 1.º do art. 555 do CPC, e o disposto agora no Regimento Interno, para que o recurso possa ser remetido ao Tribunal Pleno, que está em grau hierárquico superior ao da Turma Julgadora originária, devem, necessariamente, concorrer quatro pressupostos, segundo José Rogério Cruz e Tucci: “a) existência de questão de direito em concreto; b) verificação potencial de divergência atual de posicionamento sobre tal quaestio entre órgãos fracionários do mesmo tribunal; c) reconhecimento da relevância pública da questão; d) proposta do relator e aprovação da maioria dos integrantes da turma julgadora” (Lineamentos da nova reforma do CPC: São Paulo: RT, 2002. p. 89).

3. Relevante questão de direito

Relata-nos Cândido Rangel Dinamarco que: “O vocábulo questão é empregado no texto da lei (…) em seu puro significado carneluttiano, a designar toda dúvida surgida no espírito do juiz ou levada a ele pelas partes. Têm-se dúvidas quanto aos fatos, ou questões de fato; e dúvidas quanto à interpretação da lei ou à dimensão desta e sua pertinência ao caso, ou questões de direito”. Como é arquinotório, Carnelutti conceituou questões como “pontos duvidosos de fato ou de direito” (DINAMARCO, Cândido Rangel. A reforma da reforma. 3 ed. São Paulo: Malheiros, 2002. p. 136).

Segundo o mesmo doutrinador, ainda, considera-se questão jurídica relevante “quando sua solução pode transcender os interesses dos sujeitos em litígio, projetando influência sobre a sociedade como um todo ou sobre os valores inerentes à vida social, notadamente aqueles que a Constituição Federal abriga e resguarda” (ob. cit., p. 137).

4. Interesse público

É possível reconhecer o interesse público legitimador da providência ditada na regra estudada, segundo Dinamarco, mutatis mutandis (adaptação à Justiça do Trabalho), quando: a) pender no tribunal ou nas varas uma quantidade significativa de causas envolvendo a mesma tese jurídica; b) a causa envolver direitos ou interesses transindividuais de particular relevância ou de pertinência a grupos bastante numerosos, ainda mais quando se tratar de ação coletiva ou civil pública com esse conteúdo; c) estiver em causa um direito ou um preceito fundamental, especialmente se para o julgamento da causa for necessário o pronunciamento do tribunal sobre um texto constitucional, seu significado, sua dimensão; d) for previsível a repercussão macroeconômica do acatamento de uma tese jurídica em discussão na causa; e) se tratar de tema processual bastante repetitivo, como a admissibilidade de agravos internos ou regimentais em certos casos polêmicos, etc (ob. cit., p. 137).

5. Legitimidade

Explicite-se, desde logo, que “apenas o relator do recurso é que ostenta legitimidade para propor aos demais integrantes da turma julgadora, sem qualquer manifestação das partes e do Ministério Público, a remessa do recurso ao órgão colegiado superior” (TUCCI, José Rogério Cruz e. ob. cit. p. 90).

6. Papel dos advogados – aplicação analógica do incidente de uniformização de jurisprudência

Embora a legitimidade, como se disse, seja exclusiva do juiz relator, nada impede que os advogados nas razões de recurso ou em contra-razões, ou, ainda, em petição avulsa até o momento da publicação da pauta, apresentem prova suficiente para demonstrar a existência de relevante questão de direito. Essa possibilidade, mutatis mutandis, é reconhecida no regimento interno do E. TRT da 9.ª Região na hipótese de uniformização de jurisprudência (art. 96 e parágrafo único).

7. Procedimento a ser adotado no TRT

Ao contrário do procedimento adotado no sistema tradicional (arts. 97 a 100 do RI do TRT da 9.ª Reg.), na inovadora alteração do incidente de “uniformização da jurisprudência intramuros” (conforme denominação dada pelo prof. José Rogério Cruz e Tucci. ob. cit., p. 87, e mencionada pelo prof. Cândido Rangel Dinamarco, ob. cit. p. 137), o “Código de Processo Civil abre caminho para a solução mais ágil e coerente com o sistema, ao falar da aceitação da competência pelo colegiado de maior envergadura, sem qualquer alusão a uma possível participação da câmara ou turma para fins de concretização de sua competência” (DINAMARCO, Cândido Rangel. ob. cit. p. 142).

Essa orientação, que pensamos ser a melhor, encontra divergência doutrinária (TUCCI, item 3 retro e, NELSON e ROSA NERY, CPC Comentado. 6 ed. p. 88).

Posicionou-se o E. TRT Pleno, por maioria, no sentido de “ser desnecessária a remessa dos autos ao órgão colegiado (Turma, Seção Especializada ou Órgão Especial), para admissão do incidente, bastando o encaminhamento da proposição do juiz relator ao Tribunal Pleno” (RA 22/03, de 20.02.03).

Também entendeu o mesmo Órgão Plenário, por maioria, na mesma sessão, “que tal incidente é aplicável somente a recursos e não a ações de competência originária do Tribunal” (RA 22/03).

8. Procedimento no Pleno

Chegando os autos no Tribunal Pleno, e havendo silêncio da norma, “deve ser mantido o mesmo relator, desde que integrante do colegiado maior que vai julgar a questão. Se o relator não integrar o órgão, tem-se, por força de compreensão, que promover nova distribuição entre os membros respectivos” (FADEL, Sergio Sahione. Breves anotações à Lei n.º 10.352, de 26 de dezembro de 2001 e à Lei n.º 10.358, de 27 de dezembro de 2001. Caderno de Estudos. Encarte da Revista In Verbis – n.º 24. ano 7. p. 344).

A única possibilidade de mudança do relator é quando este for convocado, hipótese na qual deve ser feita distribuição a juiz efetivo, integrante do Pleno (§ 1.º do art. 3.º, art. 15 e § 2.º do art. 38 do RI do TRT da 9.ª Reg.).

Luiz Eduardo Gunther

é juiz no Tribunal Regional do Trabalho da 9.ª Região.

Cristina Maria Navarro Zornig

é assessora no Tribunal Regional do Trabalho da 9.ª Região.

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