Nuvem de desesperança

Há uma ponta de razão na ironia do presidente do Sindicombustíveis do Paraná, Roberto Fregonese, quando diz que o aumento do preço da gasolina, a partir de sábado, é um “presente do governo federal em comemoração ao Dia do Trabalho”. Presente de grego. A gasolina não precisava subir se não tivessem subido as alíquotas dos impostos cobrados pelo governo – o Programa de Integração Social (PIS) e a Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social (Cofins). Para o azar de todos, outros itens, produtos e serviços também sobem pelo mesmo motivo.

Qualquer alta dos combustíveis afeta outros setores da economia. Quase todos. E isso vem contra a maré propalada pelo Planalto na direção do aquecimento da economia, da produção, do desenvolvimento e da geração de empregos. Em termos políticos, anula de cara o esforço que o governo diz ter realizado para conceder um reajuste pouca coisa acima da inflação ao salário mínimo, que continua pífio, para desespero de muitos, principalmente da grande maioria de aposentados e pensionistas. O equilíbrio das contas públicas, operado pela via do aumento dos impostos e não pela via da economia nos gastos ou pelo corte nos privilégios de poucos, continua impondo aos brasileiros todos a renegociação da enorme “dívida social” de que tanto fala o governo do PT. O problema, segundo repete a crônica brasiliense, angustia o presidente Lula, que já não sabe exatamente o que dizer a antigos companheiros. Mas não só a ele.

O ex-ministro da Educação, Cristovam Buarque, de volta ao Senado, é um dos também angustiados. Demonstrou-o em seu primeiro pronunciamento oficial, depois de ter sido demitido por telefone do mais alto escalão do governo dias antes da eclosão do mal-resolvido Waldogate Buarque fez um veemente apelo ao “companheiro” Lula para que liberte a esperança que subiu com a estrela mas ficou “aprisionada lá dentro” do Planalto. E falou das “nuvens de desesperança” que já aparecem no horizonte. “O País – disse – não agüenta mais o desemprego, a violência, a vergonha de uma educação de poucos e de pouca qualidade, um sistema de saúde degradado, cidades em fase terminal, a renda concentrada, a terra em poucas mãos.” Podia dizer muito mais no silêncio que provocou naquele salão azul, onde muitos falam sobre tudo e todos e poucos ouvem apenas o que lhes interessa.

As críticas que partem de dentro da própria casa são mais doloridas que as formuladas pelos opositores, já de olho nas próximas eleições. Mas têm sentido especial se se considerar que estão em sintonia com o que dizem importantes setores da sociedade dita organizada. A última Sondagem Industrial da Confederação Nacional da Indústria – CNI, por exemplo, mostra o que já era esperado: o otimismo dos empresários brasileiros também está em baixa, não apenas aquele dos políticos. Na outra ponta, o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE mostra que o desemprego continua em alta, já quase atingindo os 13% nas principais regiões metropolitanas. Uma catástrofe que se alastra na contramaré das esperanças despertadas pelo brilho da estrela petista, já plantada no chão do Palácio Alvorada e nos jardins da Granja do Torto. E pouco adianta o ministro Antônio Palocci, da Fazenda, esgoelar-se lá no exterior na inútil demonstração de que existem regiões do interior do País que estão fora desse fantasma. É o tostão contra o milhão. No campo, onde quem planta para exportar se alegra com bons negócios, esse fantasma se chama invasão. Vermelho e desafiador. Que tem na leniência do Planalto um forte aliado para a tarefa de corrosão da autoridade governamental, também em baixa.

Outra prova da desesperança é essa atitude do presidente da Câmara, João Paulo Cunha, subitamente em guerra contra o excessivo número de medidas provisórias do “companheiro” Lula. Se o mar estivesse para peixe, teria colado sua campanha pela reeleição nos grandes feitos à sombra da estrela. Também na oposição, ele solenemente despreza o argumento de que a chuva de MPs foi necessária para “dar o arcabouço legislativo para desemperrar o crescimento e promover a geração de emprego e renda”. Onde foi que isso aconteceu, afinal?

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