No limite da desconstituição do sistema legal de contratação do trabalho

No mês de setembro o número de trabalhadores informais atingiu a 42,7% do total da mão-de-obra ocupada, diante dos 43,6% dos trabalhadores com carteira de trabalho assinada pelo empregador, segundo o IBGE. Em Recife, PE, a proporção é de 49,4% para 34,3% entre os informais e os com registro. Para o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada-IPEA, através de seu economista Lauro Ramos, de julho a setembro foram geradas 366 mil novas vagas, sendo 219 contratações sem carteira, 105 mil por conta própria e o restante, apenas 22 mil, com registro normal. A retomada da economia, com o crescimento industrial de 4,3% em setembro face ao mesmo mês do ano de 2002, se verificou com base no crescimento da informalidade (Folha de S. Paulo, 5.11.03).

O núcleo central do contrato de emprego foi atingido duramente pelo desemprego, disseminadas as formas atípicas de trabalho informal. Formou-se na década dos noventa um forte núcleo de proteção ao sistema público de contratação – o sistema jurídico único dos funcionários públicos; a sofisticação do sistema de contratação nas grandes e médias empresas, pela necessidade da qualificação profissional capacitada; a grande massa dos trabalhadores com pouca qualificação e destinada em especial ao setor serviços em geral, braçais ou assemelhados. E, ao mesmo tempo, formou-se um vasto campo do trabalho informal, por conta própria, com autonomia, de mini e pequenas empresas, do trabalho a domicílio e familiar, entre tantas e variadas modalidades existentes.

A existência de dois campos – o formal e o informal – foi sendo gradativamente aceita como fenômeno do capitalismo de exploração, não subordinado a regras mais elementares de proteção do trabalho. O desemprego crescente condicionou a grande massa dos trabalhadores à banalização diante do drama diário pela sobrevivência, onde o que conta é a possibilidade do trabalho, independemente de sua capa protetiva.

O oficialismo dos anos noventa incentivou e sustentou essa dicotomia, visando a desagregação do sistema, quer pelo enfraquecimento da organização sindical, quer pelo desmonte do Ministério e da Justiça do Trabalho e da Previdência Social, hoje quebrada. Sob a alegação da modernização das relações do trabalho e a ácida crítica ao protecionismo celetista, procedeu-se a um dos mais profundos e duros ataques à classe trabalhadora, submetida à mais trágica das situações, o desemprego estrutural e a perda constante de massa salarial.

Incapazes de reagir, muitas organizações de trabalhadores buscaram salvar os dedos e entregaram os anéis. Não fosse o sistema sindical de unicidade, as proteções constitucionais e a crescente politização das massas urbanas refletida nas eleições municipais, estaduais e nacionais, as conseqüências do ataque neoliberal teriam sido de proporções inimagináveis.

Do ponto de vista da análise teórica, não há como enquadrar a informalidade na superestrutura jurídica, dada a impossibilidade de dimensioná-la como categoria submetida a normas rígidas ou, até mesmo, estabelecer algumas regras de conduta dada a absoluta desconformidade laborativa. O atual aparato institucional do Direito do Trabalho responde parcial e insuficientemente às necessidades da regulação dessas relações atípicas, dada a incorporação das mesmas no cerne do atual estágio do capitalismo de monopólios que cria, a seu interesse e serviço, tais trabalhos destituídos de “forma específica”.

Em conseqüência, essas formas atípicas de trabalho passam a ser aceitas e incorporadas pelo trabalhador, com a multiplicação dessas formas de trabalho, sempre fugindo do controle do formal, superando todas as previsões e controles institucionais. Sem propostas consistentes de resolução do problema, quer pelo Estado, quer pelas instituições da sociedade, a exceção vai se transformando em regra.

Estamos, assim, no limite da desconstituição do sistema legal de contratação do trabalho. Todos os esforços de superação serão pequenos diante da magnitude da questão. Mas não há que capitular, pelo contrário, o desafio que nos é imposto nos estimula à perserverança.

APÓS A SÚMULA 310:

O site do TST noticia o julgamento do RR 433/99 (13.11.03) em que entidade sindical requer o pagamento de horas extras relacionadas com turnos ininterruptos de revezamento como substituto processual, com base no artigo 8.º,III,CF/88. A Revista foi procedente, em favor do Sindicato, face a revogação da Súmula 310. O juiz convocado Saulo Emídio dos Santos, relator, assinalou: “Com o cancelamento do Enunciado 310, resta-nos cogitar de apenas duas alternativas de posicionamento sobre a amplitude da substituição processual. A primeira seria entender que nada mudou, continuando ela restrita às hipóteses casuísticas autorizadas em lei. A segunda posição seria a de entender que a legitimação extraordinária do Sindicato teria passado a ser ampla, com base no inciso III, do art. 8.º da Constituição, alcançando todos os direitos materiais trabalhistas. Pessoalmente, inclino-me pela segunda opção porque o citado inciso III, do art. 8.º, não remete à lei o tratamento da matéria, como faz o texto constitucional em outros dispositivos, dando a entender que ele seria auto-aplicável . Esta tem sido a posição do STF”.

ENQUADRAMENTO SINDICAL:

“Enquadramento Sindical. No sistema brasileiro o empregado não dispõe de liberdade para filiar-se ao sindicato que melhor lhe aprouver. O enquadramento sindical decorre da atividade econômica preponderante do empregador, desde que não se trate de categoria profissional diferenciada, consoante artigo 511, parágrafo 3.º e artigo 577 da Carta Consolidada” ( TRT PR 01713-2002-095-09-00-9, Acórdão 22511/2003, Relatora Juíza Rosemarie Diedrichs Pimpão, DJPR, 10.10.2003,pág.493).

SAÚDE E SEGURANÇA DOS FRENTISTAS:

Assinado termo de compromisso entre o Sindicato dos Trabalhadores, presidido por Renato Bartnack, e o Sindicato das Empresas, presidido por Roberto Fregonese, e a Delegacia Regional do Trabalho, pelo seu titular Geraldo Serathiuk, pelo qual os trabalhadores em postos de gasolina que ficam expostos a contato com produtos com o benzeno, substância cancerígena que existe residualmente na gasolina, receberão instruções especiais de proteção à saúde e segurança. São cerca de 10 mil trabalhadores no Estado em aproximadamente 1,7 mil empresas. Importante termo de cooperação que possibilita melhores condições de vida e de trabalho no setor profissional.

DO DIREITO À DESCONEXÃO DO TRABALHO:

o professor e juiz do trabalho Jorge Luiz Souto Maior publica estudo na Revista RDT, outubro/2003, sob o título mencionado. Leitura obrigatória *** ABRAT divulgou nota pela passagem dos 60 anos da CLT lançando a idéia da construção de um “Código de Defesa do Trabalhador” *** Presidente do TST Ministro Francisco Fausto, após conhecer o funcionamento da Comissão de Conciliação Prévia do Sindicato dos Metalúrgicos de São Bernardo do Campo, propôs que aquele organismo seja adotado como referência para regulamentação pelo Ministério do Trabalho *** Dia 12/12 a posse dos novos dirigentes do TRT/PR, juízes Fernando Eizo Ono (presidente), Wanda Santi Cardoso da Silva (vice-presidente) e Nacif Alcure Neto (corregedor) *** CNTI ingressou no STF requerendo revisão da Súmula 666 que trata da contribuição confederativa face a inconstitucionalidade do Enunciado *** Confederações e Centrais Sindicais aprovaram a Carta de Brasília, encaminhada ao Fórum Nacional do Trabalho, reivindicando a manutenção do artigo 8.º da CF/88 *** A primeira reunião da Comissão Nacional do Direito e Relações do Trabalho foi adiada pelo Ministro do Trabalho, sem data ainda definida.

VOLKMER DE CASTILHO e LÍCIO BLEY VIEIRA:

Tomo a liberdade de transcrever parte da bela e expressiva saudação de despedida do desembargador federal Volkmer de Castilho perante o plenário do TRF/4.ª Região, na oportunidade da aposentadoria do magistrado, face ao seu conteúdo de grandeza humanitária. Relembrando sua caminhada na Justiça Federal desde 1976, em Curitiba, e de seu orgulho, “honra e satisfação que foi ter trabalhado e sobretudo aprendido com seus integrantes e servidores no quotidiano da tarefa judiciária”, o desembargador Volkmer de Castilho salientou que dentre os juízes e servidores “não posso e não devo nomear pelo risco de omitir involuntariamente algum que o tempo decorrido já me negasse à memória, e são tantos e em tantos lugares, e em tantos momentos distintos, que me animo só de homenagear o primeiro que tive o prazer de encontrar, lá na longínqua quarta-feira de cinzas de 1976, no quarto andar do antigo prédio da Rua Quinze, em Curitiba. Foi ele, o doutor Lício Bley Vieira, então Juiz Federal da 3.ª Vara Federal da Seção Judiciária do Paraná, que, no meu primeiro dia de trabalho como Juiz Federal Substituto, me recebeu com a sua simpatia e daí por diante orientou meus primeiros passos inseguros no território para mim até então inteiramente desconhecido. A esse personagem invulgar e, na sua pessoa, mas lembrando de todos os demais Juízes e servidores tributo o meu agradecimento pelas minhas eventuais conquistas e sucessos na carreira seguinte, assim como, através dele, e do mesmo modo referindo a todos, pelo que me concedam a benevolência pelos meus muitos erros e equívocos”. Com certeza, lições de vida e dignidade.

Edésio Passos

é advogado, membro da Comissão Nacional do Direito e Relações do Trabalho. E.mail:
edesiopassos@terra.com.br

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