Apesar de ter aproximado pela primeira vez a esquerda da presidência colombiana, o ex-prefeito de Bogotá e ex-guerrilheiro Gustavo Petro ainda tem amarrada aos pés uma bola de concreto chamada chavismo. Ele já disse não reconhecer Nicolás Maduro como presidente. Chamou-o de ditador. Relativizou os vídeos em que elogia um jovem Hugo Chávez. Mas isso não parece ser suficiente para bater hoje o conservador Iván Duque, com quem possivelmente disputará um segundo turno.

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Há mais de 1 milhão de venezuelanos hoje na Colômbia, milhares deles perambulando pelas ruas como cabos eleitorais involuntários contra Petro, um economista de 58 anos. Em Cúcuta, na fronteira com a Venezuela, nenhuma publicidade de Duque, candidato do ex-presidente Álvaro Uribe e favorito segundo todas as pesquisas, está tão visível quanto os miseráveis venezuelanos que lembram os efeitos do governo de Maduro.

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Segundo María Clara Robayo, analista da Universidade do Rosário, os colombianos a princípio até ficaram envaidecidos com o fluxo dos vizinhos, já que o país nunca havia sido um polo de atração para estrangeiros, principalmente pela violência associada à guerrilha. Isso mudou radicalmente após 2015, quando a fronteira entre os dois países reabriu depois de um ano fechada.

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“Já se percebem atos xenófobos e uma espécie de pânico social em relação aos venezuelanos”, afirma María Clara. Ainda há 4 milhões de colombianos que ao longo de décadas partiram para a Venezuela e mandavam remessas para casa. O retorno massivo deles, nas palavras de Petro, levaria a Colômbia ao colapso.

A manicure venezuelana Ana Karina Moreno, de 25 anos, deixou Maracay, na costa venezuelana, ao descobrir que estava grávida. Com medo de dar à luz na precária infraestrutura de seu país, onde a mortalidade materna aumentou 65% em 2016 em relação ao ano anterior, chegou a Cúcuta. Ela passa seis horas por dia mendigando diante de um shopping com o filho de 2 anos no colo. “Vim só por causa da gravidez. Meu primeiro filho já veio prematuro e não poderia me arriscar”, disse a mulher, que já rejeitou ofertas de colombianos que desejavam criar seu filho. “Ele guerreou comigo até aqui, como vou entregar o menino?”

Em um país tradicionalmente governado pela direita e aliado dos EUA, a maior parte da população acredita que um governo populista de esquerda poderia causar desintegração social semelhante na Colômbia. A analista política Laura Gil discorda. “O chavismo se sustentou em reservas petrolíferas altas e apoio militar que Petro não teria. Ele é um populista, mas não é contra as instituições. Na prefeitura de Bogotá, não interveio na polícia, no Tesouro. Não é preciso temê-lo por isso. É preciso julgá-lo por outros elementos”, avalia.

Embora tenha moderado o discurso, Petro manteve na prefeitura de Bogotá, de 2012 a 2015, uma linha de esquerda convencional. Promoveu estatizações, estimulou o discurso contra o capital, investiu em planos sociais e comprou brigas com prestadoras de serviço. Seu discurso agradou parte dos jovens, que responderam com apoio nas redes sociais, o maior entre os seis candidatos à presidência.

O conservador Duque também aproximou seu discurso dos jovens e marcou diferenças de forma com Uribe, padrinho de sua candidatura. Em 2014, o escolhido pelo uribismo foi derrotado pelo presidente Juan Manuel Santos no segundo turno. Petro hoje seria incapaz de vencer o segundo turno, pela dificuldade de atrair votos do centro.

O candidato com mais chance de bater Duque no segundo turno seria o centrista Sergio Fajardo, ex-prefeito de Medellín, com leve ascensão nas últimas sondagens de opinião. Uma incógnita é se, num segundo turno, Petro contaria com apoio de Fajardo e do próprio presidente Santos contra Duque.

“Petro tentou se desligar de Chávez, mas para a opinião pública isso não ficou claro. Ele moderou seu discurso para aumentar sua viabilidade política. Mas, se ganhar, governará com um modelo populista e terá um problema extra. Seria o primeiro presidente colombiano sem maioria no Congresso, teria 25% das cadeiras”, lembra o analista Juan Fernando Londoño, ex-vice-ministro do Interior.

As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.