Como os interesses econômicos de Bush, Blair & Cia. Ltda. com o petróleo e a venda de armamentos justificam uma segunda Guerra do Golfo

O massacre ao povo iraquiano já começou. Os bombardeios nas tais áreas de exclusão fazem parte de uma guerra já assumida pelos Estados Unidos. E depois, é difícil acreditar que George W. Bush irá recuar diante do volume de “tecnologia da morte” já mobilizado para o Golfo Pérsico. A história nos mostra que as posições da ONU pouca relevância têm para aqueles que se crêem superiores aos simples mortais. O cowboy texano não conseguiu pegar o Osama Bin Laden e vai querer terminar a “tempestade do deserto” iniciada pelo pai em 1991. Aos futuros telespectadores de uma nova guerra de “espetáculo virtual”, resta o protesto na rua, participar de correntes de e-mails enviados a Casa Branca, assinar um abaixo-assinado, boicotar produtos americanos, ficar indignado e sentir-se impotente! As torres caíram e com elas a sanidade mental daqueles que controlam o poder político-militar-econômico da maior economia do Planeta!

Os interesses pela guerra são muitos, porém o ganho é para poucos. Ações nas bolsas são movimentadas (jogadores de mercado que ganham com o terror), novas tecnologias bélicas são testadas (multinacionais que lucram com a morte em massa), algum emprego é gerado (alguém tem de apertar os parafusos das ogivas nucleares) e as contas bancárias de maquiavélicos investidores em paraísos fiscais ficam mais recheadas.

Em 1995, durante minha pesquisa de doutorado, escrevi um capítulo de um livro publicado na Inglaterra cuja parte do título tornou-se mais popular do que pensava (se soubesse teria patenteado!): “The Big Brothers: Transnational Corporations, Trade Organizations and Multilateral Financial Institutions”. Nele eu analisava a dificuldade de implantar-se o almejado desenvolvimento sustentável diante do poder controlador dos “Grandes Irmãos” na era de intensificada globalização. O tripé que manipula a economia mundial formado pelas companhias transnacionais, as agências internacionais de financiamento, como o Banco Mundial, FMI e grandes conglomerados bancários, aliada as organizações que promovem a ilusão do comércio livre, como a Organização Mundial do Comércio, NAFTA, União Européia e outros, atuam como a jibóia ao atacar a sua presa, primeiro a enrola e a comprime até quebrar-lhe todos os ossos e depois a engole, digerindo-a lentamente durante meses!

No pano de fundo de toda crise mundial estão sempre os interesses financeiros de setores controlados por poucas empresas, dirigidas por grandes experts, recebendo astronômicos salários e que são justificados pela maximização dos lucros dos seus acionistas. É de conhecimento geral que são estes setores que bancam as campanhas políticas de deputados, senadores, governadores, presidentes e primeiros-ministros. Para os Estados Unidos, um choque drástico no mercado poderia reverter o atual momento econômico de desvalorização do dólar e valorização do Euro. Porque então não controlar parte do petróleo no Oriente Médio e enfraquecer a OPEP? Isto certamente garantiria a reeleição de muitos políticos republicanos do partido do Bush.

Mas também vemos a indústria do petróleo e do armamento, como maiores beneficiários imediatos da tragédia global que se aproxima, envolvidas na maior canalhice do recente século iniciado. Vazamentos de cargueiros, como do Exxon Valdez na costa do Alasca, em 1989, ou do Prestige na costa da Espanha, em 2002, são pequenas manchas de óleo no oceano, quando comparadas ao grande jogo sujo das empresas americanas e inglesas ligadas ao refinamento do petróleo e a fabricação de armas, que são, normalmente, apoiadas por subsídios e fortes políticas de créditos de exportação. Sendo que neste caso, a ética e o respeito ao meio ambiente e aos direitos humanos passam ao largo quando o óleo é explorado em países pobres e armas são vendidas a países controlados por ditadores!

A segunda guerra do Golfo anunciava-se com a obscura e mal explicada vitória do Bush nas eleições presidenciais (com menor número de votos se elege um presidente por lá!), que recebeu o maior apoio financeiro que um candidato a presidente já recebeu de um setor da economia americana. Em seguida viria a retribuição em forma de boicote dos Estados Unidos ao Protocolo de Kyoto — a serviço do setor petrolífero que o patrocinou, encabeçado pela ESSO, a quem não interessa diminuir emissão de CO2 e que doou cerca de 1.4 milhões de dólares para os republicanos nas eleições de 2000. A omissão no confronto judaico-palestino (paz no oriente não é interessante para o business!) e a invasão ao Afeganistão (território estratégico para quem quer controlar a região!) seriam os próximos passos. Sendo que o estrangulamento final da jibóia será o ataque ao país que detém a segunda maior reserva de petróleo do mundo. Tudo tem uma só razão: garantir que a economia mundial seja dependente do ouro negro por um tempo maior do que desejamos e necessitamos e que exportadores de armas aumentem suas vendas no exterior.

Made in USA

Durante a primeira guerra do golfo, em 1991, Amory B. Lovins, Diretor do Instituto Rock Mountain, uma organização não governamental de pesquisa de grande credibilidade nos Estados Unidos, escrevia: “Nós estamos colocando nossos rapazes em tanques, porque não os colocamos em carros mais eficientes? Sim: Nós não precisaríamos qualquer óleo do Golfo Pérsico depois de 1985, se simplesmente nós mantivéssemos a economia de óleo praticada de 1977 até 1985”.

De acordo com dados do livro Capitalismo Natural, publicado pelo mesmo autor, os Estados Unidos gastam anualmente 50 bilhões de dólares para proteger as rotas marítimas que trazem do exterior o petróleo o qual não seria necessário se a administração Reagan não tivesse apagado do mapa os padrões de eficiência dos veículos leves em 1986.

A maior economia do mundo é aquela também que mais desperdiça. Sua riqueza se perde em tecnologia ineficiente do ponto de vista energético e aproveitamento de matéria prima, gerando assim o maior desperdício do mundo, que excedem os 22,7 trilhões de quilos anualmente, excluindo-se a água usada.

O setor do petróleo alimenta uma das maiores indústrias americanas, a do transporte automotivo. No entanto, seus grandes carros são antieconômicos por uma simples razão: a gasolina americana é hoje mais barata que a água mineral. Os Estados Unidos têm mais motoristas habilitados do que eleitores, que queimam 8 milhões de barris de petróleo por dia (1.703,25 litros anuais por pessoa). Este consumo é responsável por um quarto dos gases que formam a estufa norte-americana, sendo que 1,5 trilhão de quilos de CO2 são lançados anualmente na atmosfera.

O gasto com saúde relacionado aos efeitos da poluição atinge hoje cerca de 100 bilhões de dólares anuais. Conforme o Instituto Mundial de Recursos, o congestionamento do tráfego americano custa 100 bilhões de dólares por ano em perda de produtividade, sem incluir gasolina, o aumento de acidentes e o custo de manutenção. Ocorrem cerca de 2 milhões de acidentes com automóveis por ano. Somente os acidentes em estrada custam à sociedade americana anualmente mais de 50 bilhões de dólares, incluindo-se despesas do seguro-saúde, a perda de produtividade, o imposto de renda perdido, o dano à propriedade, além de custos policiais, judiciários e dos serviços sociais.

Como parte deste cenário têm-se empresas de petróleo como a ESSO, a maior companhia do mundo presente em mais de 200 países com um lucro que chegou a 15 bilhões de dólares em 2001, e que campanha abertamente contra as medidas para controlar o efeito estufa. No mesmo ano, a Esso gastou 7,9 bilhões de dólares em exploração e produção de óleo e gás e nenhum dólar sequer em energia renovável ou “combustível verde”, segundo a campanha internacional “Stop E$$O” coordenada por grupos ambientalistas como o Greenpeace e Amigos da Terra. Os esforços desta companhia concentram-se em desacreditar cientistas que publicam suas pesquisas que provam a ligação entre o aumento da temperatura da atmosfera e a emissão de CO2 e fazer lobby político para que acordos no sentido de diminuir esta emissão não sejam assinados.

Exportação bancada

Assim como a França, Alemanha, Itália, Áustria e outros países europeus exportadores de armamento, a Inglaterra, em 1994, declarava através de seu Ministro da Defesa na época, Roger Freeman, que depois dos Estados Unidos, era a maior exportadora de armas do mundo. Neste mesmo período a região do oriente médio já representava 65% da distribuição geográfica de suas vendas. Hoje, sendo a indústria bélica uma das principais atividades das ilhas britânicas, não é de se estranhar que este possa ser um dos motivos do apoio do primeiro ministro inglês, Tony Blair, ao presidente Bush na sua empreitada do terror.

Um relatório publicado em 1995, pelo Movimento para o Desenvolvimento Mundial, uma organização não-governamental internacional que campanha contra a pobreza global e as ineficientes ações de governos que beneficiam o setor privado em detrimento de políticas sociais, revela alguns fatos que ajudam a comprovar de como se ganha com a guerra – A maior vitrine onde se pode mostrar a eficiência de um produto bélico!

Quando o governo da Era Thatcher, nos anos 80, resolveu aumentar a exportação de armamento britânico para os chamados países do Terceiro Mundo, os ministros-vendedores da Dama de Ferro em “missões diplomáticas” encontraram governantes com dificuldades financeiras devido à queda do preço do petróleo, juros altos, pagamentos de dívidas externas e orçamentos apertados. A saída foi seguir a mesma receita dos Estados Unidos e França, e estabelecer garantias de créditos para os futuros compradores: Compre agora, pague depois! Pacotes atrativos com juros fixos baixos e pagamentos a longo prazo eram oferecidos através de grandes bancos privados britânicos aos países interessados, sendo que a garantia do governo em caso de calote dos compradores era feita através do departamento conhecido como ECGD – Export Credits Guarante Department – Departamento de Garantia de Créditos de Exportação. Isto é, com dinheiro dos súditos da rainha que recebiam poucas explicações sobre estas transações! Dados de 1995 demonstram que os gastos públicos ingleses com as garantias de exportação, somado a um programa de marketing agressivo, demonstração de produtos, assistência técnica e treinamento de pessoal para manusear equipamento bélico, alcançaram 384 milhões de libras anuais, isto sem incluir gastos em pesquisas e desenvolvimento de novas armas!

A mesma Inglaterra que se aliou aos Estados Unidos na Guerra do Golfo, tentava receber 940 milhões de libras do Iraque, em 1991, de vendas iniciadas em 1980 e que somavam cerca de 3 bilhões de libras. Quantia esta liberada através das garantias de exportação do governo britânico, cujo pagamento anual cessou com a invasão do Iraque ao Kuwait. O ECGD teve de assumir a dívida junto aos fornecedores ingleses, relatando que 20% destas garantias de créditos foram para soft equipamento militar comprados durante o conflito daquele país com o Irã.

Dados do Banco Mundial e da Agência Britânica de Desenvolvimento do Exterior (ODA), responsável por acordos bilaterais de ajuda financeira do governo inglês a países pobres em áreas como saneamento, meio-ambiente, moradia, infraestrutura de transporte e outras, revelam que os países que receberam aumento desta ajuda entre meados dos anos 80 e 90, coincidentemente foram os mesmos que aumentaram as compras de armas da Inglaterra através das garantias de créditos. Como exemplo, a Indonésia teve um aumento de 111% de ajuda bilateral, entre 1982 e 1993, enquanto gastava 201 milhões de dólares em compra de armas inglesas, entre 1988 e 1992, sendo o quarto maior comprador de equipamento bélico da Inglaterra. É bom lembrar que a ocupação da Indonésia sobre o Timor Leste, de 1975 a 2002, custou a vida de mais de 200 mil pessoas, um terço da população daquele país.

Grandes compradores de armas da Inglaterra através de garantia de créditos que cobrem de 80 a 100%, se concentram no Oriente Médio. Entre 1992 e 1994, a Arábia Saudita, segundo maior comprador dos ingleses, recebeu 975 milhões de libras em créditos. Na mesma época, créditos ao Kuwait, Quatar, Jordânia e Oman (um país com menos de 2 milhões de habitantes era classificado como o terceiro maior comprador da Inglaterra), somados, ultrapassaram os 1,5 bilhões de libras.

Alguns especialistas afirmam que a invasão do Iraque ao Kuwait foi devida principalmente ao fato do país estar quebrado economicamente por tantas dívidas feitas com armamentos junto aos Estados Unidos e países europeus durante seu conflito com o Irã.

Quando países do Terceiro Mundo não conseguem pagar suas dívidas de compra de armamento, créditos internacionais são cortados, forçando-os a adotar rigorosos programas do FMI (geralmente cortando verbas da educação e saúde) que empresta o dinheiro que vai direto ao bolso dos negociadores de armas.

O governo inglês mudou, a Dama de Ferro enferrujou e o partido trabalhista assumiu, mas fica a pergunta: Será que mudou esta forma tão lucrativa de se fazer negócios?

Eloy Fassi Casagrande Júnior

é professor doutor do Programa de Pós-Graduação em Tecnologia e pesquisador do Programa de Pesquisas em Tecnologias Sustentáveis – TECSus, Centro Federal de Educação Tecnológica do Paraná (Cefet-PR).

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