Migração do dinheiro

O dinheiro migra. Anda de um lugar para outro, de um tipo de aplicação para outra, sempre em busca de uma desejada relação lucro-segurança. Só não costuma migrar do bolso dos ricos para o dos pobres. Quem busca aplicações mais seguras tem de se contentar com menores rendimentos. Quem gosta de arriscar, exigirá em compensação altos ganhos. Muita gente ainda não entendeu porque, de repente, começou a aumentar o risco-Brasil, ou seja, os que aqui investiam começaram a achar que era hora de parar e até dar o fora, levando o seu dinheiro. E mesmo no Brasil houve migração de dinheiro, de um ativo para outro. E principalmente para o dólar.

Ninguém no mundo acredita mais que comunista come criancinhas. Mas as esquerdas em geral, e as mais ortodoxas em particular, recebem elogios e aplausos por suas sólidas convicções e inabaláveis propósitos de construir um mundo mais justo. Mas, em matéria de dinheiro, quem o tem prefere aplicá-lo onde mandam selvagens capitalistas, insensíveis com os problemas do povo e sempre em busca de mais lucros.

Queiram ou não, o clima pré-eleitoral com chances de vitória da esquerda socialista é que começou as tempestades no mercado. Elas foram agravadas por ventanias outras, desde a mudança do sistema de contabilização dos fundos, que em uma primeira hora geraram aparentes prejuízos aos mutuários e efetivos, aos que sacaram, até uma discussão mais esmiuçada sobre o endividamento do Brasil e sua capacidade de pagá-lo. No dia 13 de maio os jornais noticiaram que a crise esvaziou a poupança e os fundos de investimentos. As pessoas passaram a fazer mais saques que aplicações e muita gente entendeu que as mudanças na contabilização dos fundos significava confisco. Segundo dados da Anbid (Associação Nacional dos Bancos de Investimento), em abril, os fundos perderam R$ 6,5 bilhões. Desde 1997 não se viam saques tão altos num único mês. A sangria foi superior a tudo o que foi resgatado no ano passado.

Essa massa toda de dinheiro migrou dos fundos para outros ativos e a maior parte para o dólar. Muita gente comprando dólares leva a uma conseqüência óbvia: a moeda norte-americana sobe de cotação. E quem comprou dólares lá nas alturas, vai amargar prejuízos quando as cotações se acomodarem. As cadernetas de poupança também passaram por um mau momento. Informou o Banco Central que em todos os meses deste ano, de janeiro a maio, saiu mais dinheiro do que entrou. No primeiro quadrimestre, os resgates somaram R$ 2,7 bilhões; em abril foi de R$ l, l bilhão. No final de abril o patrimônio das cadernetas era de R$ 119,1 bilhões.

A coisa já se inverteu. Começou a migração para as cadernetas. Parte do dinheiro que nelas está entrando vem dos fundos que perderam recursos quando adotou-se a nova contabilização, ou marcação de mercado. Segundo dados divulgados pelo Banco Central, a poupança registrou em junho uma captação líquida de R$ 6,092 bilhões, contra R$ 499 milhões captados em maio. O saldo total das cadernetas, que era de R$ 110,1 bilhões, saltou para 125,683 bilhões. O poupador preferiu mais segurança e menor rentabilidade.

Se entendermos este mecanismo das migrações dos investimentos, entenderemos porque alguns analistas ignorantes e investidores, não raro, idiotas, podem, de repente, colocar o Brasil em maus lençóis. Podemos não gostar do jogo deles. Mas eles podem, também, não querer jogar o nosso jogo.

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