Luiz Inácio Lula da Silva (PT) cometeu seu primeiro equívoco político no exercício da presidência da República durante a “Caravana da Fome”, na semana passada: perdeu uma extraordinária oportunidade de anunciar medidas administrativas emergenciais e contundentes de combate à miséria e, com isso, justificar o voto dos 52,7 milhões de brasileiros que o alçaram ao poder apostando na sua capacidade de atender as demandas populares.

Não que a iniciativa tenha sido destituída de valor. Não há nenhuma dúvida a respeito da relevância da decisão do presidente de levar o seu corpo de ministros para conhecer as agruras do sertão nordestino. A visita tem, no mínimo, caráter pedagógico, algo bastante positivo, em se tratando de políticos e burocratas, que em sua grande maioria estão acostumados apenas ao conforto e aos tapetes vermelhos estendidos aos poderosos.

O problema, porém, é que Lula resolveu visitar a região em um momento totalmente equivocado, e de uma forma totalmente equivocada. O momento foi equivocado porque o presidente da República mal assumiu o cargo. Está se inteirando apenas agora da real situação econômico-financeira do País. Ainda não sabe sequer se as previsões de arrecadação da União no primeiro mês do ano serão realmente confirmadas, o que poderia lhe dar alguma margem de segurança para anunciar investimentos em projetos de combate à fome e à miséria.

Seus ministros nem tiveram tempo de seguir a recomendação do presidente de adotar a maior austeridade possível em suas pastas, para gerar receitas destinadas ao financiamento do programa “Fome Zero”. Visitar o sertão apenas para reafirmar sua disposição de resolver o problema da fome, começando pelas cidades piauenses de Acauã e Guaribas, é muito pouco para um político com o perfil popular e basista de Luiz Inácio Lula da Silva.

Do mesmo modo, a forma como a visita ocorreu também se revelou equivocada porque foi concebida como uma extensão da campanha eleitoral, com direito a palanques e discursos empolados. Mero factóide de marketing político engendrado por Duda Mendonça. Atitude totalmente dispensável, quando se sabe que as vítimas da fome, como disse o próprio presidente durante a campanha eleitoral, estão mais preocupadas em almoçar e jantar do que em ouvir palavras ao vento.

O professor e cientista político Gaudêncio Torquato do Rego, um dos ícones do marketing governamental brasileiro, costuma dizer que a classe política só obtém êxito nesta área se tiver, antes de qualquer coisa, credibilidade e legitimidade. Uma recomendação plenamente conhecida pelo também cientista político André Singer, porta-voz do presidente da República, mas que parece ter sido esquecida durante a visita da equipe ministerial.

Na sua obra máxima, O Príncipe, Nicolau Maquiavel defende o uso da comunicação com as massas como instrumento legítimo de dominação política, de conquista do poder e da obtenção do respeito da sociedade civil. Do governo Lula, que foi alçado ao poder por uma conjugação de forças populares poucas vezes registrada na história política nacional, espera-se algo diferente que a lição maquiavélica. Espera-se, acima de qualquer coisa, absoluta seriedade e sensatez no trato das questões sociais. Infelizmente, não foi o que parece ter ocorrido na semana passada. Que pena.

Aurélio Munhoz (politica@parana-online.com.br) é editor-adjunto de Política em O Estado e mestrando em Sociologia Política pela UFPR.

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